Em artigo publicado no portal Brasil 247 e com o sugestivo título de 70 anos da morte de Getúlio Vargas, o maior de todos os presidentes, o economista e colunista do órgão Paulo Nogueira Batista Jr., aproveita a ocasião dos 70 anos do suicídio de Getúlio Vargas para defender o varguismo, mas vai além e acrescenta ao conjunto de seus presidentes “favoritos” ninguém menos que o general Ernesto Geisel, mandatário do País durante o período da Ditadura Militar (1964-1985):
”Os lulistas que me perdoem, mas o atual presidente seria um segundo lugar, no meu modesto entender, à frente de dois outros grandes presidentes que governaram o Brasil por menos tempo: Juscelino Kubitschek (1956-1961) e Ernesto Geisel (1974-1979), ambos por mandato de cinco anos.”
A inclusão de Geisel na lista dos “quatro mais” de Batista Jr. em um artigo destinado a enaltecer Getúlio Vargas e o nacionalismo brasileiro é, na condição de expoente do nacionalismo, é explicada pelo autor no trecho a seguir:
“Os quatro presidentes mencionados têm pelo menos um ponto em comum: lideraram governos marcados pela combinação de desenvolvimento com nacionalismo e suscitaram a hostilidade dos setores mais conservadores da sociedade brasileira. Isso vale principalmente para os presidentes civis, mas até Geisel teve que enfrentar a insubordinação do general Ednardo D’Avila, comandante do Segundo Exército em São Paulo, antro de tortura e assassinatos políticos. Teve, também que abortar uma tentativa de golpe comandada por seu ministro do Exército, Sílvio Frota, líder da linha dura. Foi o que permitiu a continuação da ‘distensão política lenta, segura e gradual’ iniciada por Geisel e que daria fim à ditadura militar no início da década de 1980. Um parêntese: a inclusão de Geisel entre os mais importantes presidentes pode causar estranheza; prometo explicar melhor em outra ocasião.”
Muita coisa pode ser dita de Geisel, mas “nacionalista”, nem por um acaso figura entre elas. O regime militar, do qual Geisel foi uma figura proeminente, foi um golpe arquitetado pelo imperialismo (e em especial o governo do EUA) tendo como objetivo fundamental destruir as conquistas das revoluções da década de 1930, das quais Vargas foi uma expressão.
Vargas, de fato, construiu “boa parte das empresas estatais estratégicas para o desenvolvimento do Brasil”, como observa o desorientado autor. Ocorre, porém, que o impulso ao progresso verificado durante o período não se deve às convicções ideológicas do gaúcho de São Borja, mas ao impulso dado pela Revolução de 1930, que se bem fora interrompida por medo da classe trabalhadora brasileira, serviu para dar à burguesia industrial brasileira um poder que os latifundiários atendidos pela política do “café com leite” se negavam a ceder.
A uma força parasitária como o imperialismo, naturalmente, a ascensão de uma burguesia industrial brasileira era um problema, na medida em que a tendência natural era que isso implicava na perda de um mercado colossal, dado as proporções gigantescas do Brasil. Ao longo das décadas seguintes, um dos grandes problemas que os monopólios imperialistas tiveram para equacionar foi justamente a presença de uma burguesia industrial forte em uma das mais ricas nações atrasadas do mundo.
Em 1945, seria dado um passo para isso com o golpe que depôs o mandatário gaúcho. Há exatamente 70 anos, outra tentativa de destruir a herança da Revolução de 1930 culminaria no suicídio do então presidente Vargas, sem que isso, contudo, permitisse ao imperialismo prosseguir em seus planos de dobrar o gigante latino-americano, tornando o Brasil, novamente, um país agrário, sem nenhuma sofisticação econômica.
Somente em 1964, com a ajuda inestimável do general Ernesto Geisel, é que o imperialismo conseguirá, enfim, derrotar o nacionalismo brasileiro e entregar o País em uma bandeja para os EUA, a Europa e o Japão. Eis o “nacionalista” de Batista Jr. Consequência do “nacionalismo” de Geisel e demais cúmplices na longa lista de crimes cometidos, contra a nação e contra o povo, ao final da Ditadura Militar, a economia brasileira encontrava-se asfixiada por um endividamento externo acordado a portas fechadas e que mergulharia o País em 30 anos de crise inflacionária.
Ao final da Ditadura, a Revolução de 1930 estava definitivamente liquidada e a partir de então, o desejo do imperialismo de fazer o Brasil voltar a ser uma grande fazenda pode ser executado, dado as condições mais favoráveis. O País enfrentará, nos anos seguintes, o mais vertiginoso processo de desindustrialização já verificado na história do capitalismo. Se isso é nacionalismo, tudo é nacionalismo.
Criticado por Batista Jr., FHC e Bolsonaro também seriam nacionalistas, uma vez que continuaram a obra iniciada por Geisel e seus cúmplices. Claro que não são, como tampouco o general golpista o era. Ambos são, isto sim, instrumentos do imperialismo e por isso mesmo, inimigos do nacionalismo, tendo sido importantes para acabar com a obra iniciada por Vargas e que hoje, tem sua principal expressão política em Lula.
Ao levar-se pela aparência, o que Batista Jr., termina fazendo é impulsionar suas próprias confusões sobre o governo Geisel e a Ditadura Militar para a esquerda, induzindo ao erro e fortalecendo a propaganda imperialista, que busca tratar o nacionalismo como algo negativo, sobretudo nos países atrasados. Embora muito limitado, o nacionalismo cumpre uma função de enfrentamento ao imperialismo que pode e deve ser impulsionado, como arma para a luta contra a ditadura dos monopólios. É preciso, no entanto, ciência do processo histórico e dos fenômenos sociais envolvidos, para não levar mais confusão às fileiras dos trabalhadores e estudantes.