A grave ameaça ao futuro ambiental do Brasil com a aprovação, pelo Senado, do PL 2159/2021, conhecido como PL da Devastação, foi o tema da entrevista do secretário nacional de Meio Ambiente e Desenvolvimento do PT, Saulo Dias. Nesta quarta-feira (28), no programa Café PT, da TvPT, Saulo destacou que o PT defende a educação ambiental como primeiro passo para a conscientização da sociedade e abordou os grandes e nefastos impactos da flexibilização das regras de licenciamento ambiental.
“Esse relaxamento do licenciamento é praticamente o que o ex-ministro do Bolsonaro disse ‘para deixar a boiada passar’. Então esse é o PL da boiada e nós vamos estar firmes na luta para poder tentar evitar o mal maior. Estamos mobilizando porque isso interfere diretamente na vida da sociedade, não há dúvidas que vai prejudicar muitas áreas de proteção ambiental”, afirmou Saulo.
A verdadeira intenção do projeto é tirar o poder de ação de órgãos ambientais que sofreram intensas tentativas de desmonte no governo passado, como o ICMBio, o Ibama e outros que fiscalizam o meio ambiente.
“Como não conseguiram fazer esse desmonte, o PL vem exatamente para tirar o poder de ação desses órgãos que fiscalizam”, alertou Saulo, ao observar que reservas e áreas de preservação existem porque há leis que as protegem. “Imagina se tirar essa obrigatoriedade”, avalia Saulo ao apontar os verdadeiros beneficiados com o PL.
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“É para atender um grupo econômico, um grupo específico, mas que pode causar um desastre para todo mundo. O desastre é para todos, o lucro é para poucos”, alertou. “Ao invés de avançar nas leis, estamos regredindo com a questão civilizatória do Brasil. Esse PL é um verdadeiro desastre para o Brasil de todas as formas”, sintetizou.
Ao criticar os que acham que os problemas se resolvem tendo mais terras para produzir, Saulo foi direto.
“Não resolve porque você pode resolver o problema da quantidade, mas não vai resolver o problema da continuação. Sem um ambiente equilibrado, sem chuvas, não tem como produzir. Para o clima estar regular, é preciso que o meio ambiente esteja equilibrado”, asseverou, ao ver a possibilidade de grandes secas e grandes enchentes pelo desequilíbrio climático. “Tudo isso com o PL vai se agravar com muito mais rapidez. Esse PL vem na linha da ganância”, disparou.
Impactos maiores sobre os mais pobres
Uma das grandes preocupações de Saulo é fazer com que a sociedade tenha conhecimento de todos os riscos que o PL da devastação traz para o aumento da desregulação do clima. “E quem sofre mais com esse agravamento das mudanças climáticas são os mais pobres”, revelou.
Saulo alertou que o PL distorce toda a lógica de proteção ambiental e elencou questões graves como a autodeclaração de licenciamento. Para fazer um licenciamento, ele explicou que é necessária a avaliação dos órgãos públicos.
“É muito preocupante”, afirmou, ao explicar que, com o PL, fica permitida a autodeclaração de responsabilidade ambiental sobre os empreendimentos. “Quando se tira essa obrigatoriedade, fica tudo livre para cada um fazer do jeito que quiser e ninguém fiscalizar. Fica extinta a obrigatoriedade de obter uma licença ambiental”, assinalou, ao comentar que não precisarão ser ouvidos os moradores das áreas de proteção ambiental, reservas ambientais, áreas de territórios indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais sobre qualquer mudança.
“Alguns empreendimentos poderiam simplesmente ir lá e se instalar, sem nenhum tipo de estudo de impacto ambiental, sem nenhum tipo de estudo de impacto social da área, não precisaria, não seria obrigatório”, sublinhou.
PT defende educação ambiental
Saulo considera urgente pautar a sociedade sobre educação ambiental e investir nela. “Muitas pessoas acham que não têm a ver com o debate climático, que é coisa de ambientalista. Mas ele faz parte do dia a dia das pessoas. Temos que investir em educação ambiental”, defendeu.
“As pessoas querem defender o meio ambiente, mas não sabem como fazer. O PT sabe que a educação ambiental é o primeiro passo para uma mudança de comportamento da sociedade. Não existe outra forma. Ou nós educamos, dialogamos, colocamos na pauta do dia da sociedade ou nós vamos ter que discutir como organizar depois do desastre. Ou você faz isso antes de um modo equilibrado, de todo mundo sentado na mesa, ou depois nós vamos ter que fazer isso com alguns corpos estirados”, assinalou.
Congresso em rota de colisão com a COP 30
Saulo lamenta que exatamente no ano da COP 30, que será realizada em Belém em novembro, o Brasil caminhe em sentido oposto.
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“É muito ruim o próprio Senado ter aprovado um PL desses”, avaliou, ao afirmar que tem certeza que o governo tem consciência de que não pode deixar o projeto avançar e que o presidente Lula vai vetar. Há ainda a inconstitucionalidade do PL pois a lei determina que qualquer ação em áreas de reservas indígenas e quilombolas as comunidades precisam ser ouvidas.
“É um absurdo, um verdadeiro absurdo. Não se pode cercear o direito de opinião de uma comunidade quando você vai tomar uma decisão sobre o território dela. Isso é uma das inconstitucionalidades que acredito que vai acabar barrando esse projeto”, disparou.
COP social
Saulo diz que há um diálogo bem avançado para que o movimento social organizado possa fazer uma COP social, envolvendo os movimentos para elaborar um documento que possa influenciar e ajudar nos debates que vão acontecer durante o período da conferência.
“Fico muito preocupado com o resultado da COP. É o principal evento da questão climática no mundo e temos um PL, aprovado pelo Senado. Estamos dizendo para o mundo que não estamos nem aí, que o nosso Congresso não está nem aí para a questão climática. O mundo inteiro de olho no Brasil, que pode começar a transição energética, a economia sustentável. Imagina o Brasil aprovando, no mesmo ano que vai acontecer uma conferência do clima, um PL desse jeito. O nosso Congresso pode ajudar muito, como pode atrapalhar muito”, disse.
“Como sociedade civil, como militante das questões ambientais, estou muito preocupado. Mas vamos trabalhar, vamos enfrentar, porque é isso, a vida é de luta, é de batalha, para que não deixe apenas a COP passar. O mais importante é que o debate climático continue. A COP não pode ser um evento, um momento. Ela tem que ser um projeto de fazer com que a sociedade brasileira se mobilize, se conscientize sobre as causas climáticas e, principalmente, participe das decisões. Isso é importantíssimo”, destacou.
Produção em larga escala com equilíbrio
“Quem está por trás do PL e fazendo lobby entre os senadores são os grandes empresários, os grandes latifundiários, os produtores de soja, de carne. Nós somos contra os grandes? Não, mas somos a favor do meio ambiente. Somos a favor que tenha produção em larga escala no Brasil, mas tem que fazer isso com equilíbrio”, assinalou, ao explicar que é pela sobrevivência humana que ficará impactada pelas consequências graves para o regime de chuvas e, consequentemente, para a agricultura brasileira. “Muitos acham que não precisa do meio ambiente para continuar produzindo”, alertou.
Há estudos que apontam que o Brasil vai perder potencial de produção agrícola a partir de 2030 por conta do regime de chuvas que está a cada dia mais difícil de mapear, o que atrapalha o planejamento de plantio.
Os ambientalistas são os que mais defendem a agricultura porque defendem um clima equilibrado para que as pessoas possam plantar e para que o regime de chuva continue atendendo a demanda da plantação. “Quando você destrói tudo, quando você relaxa as leis ambientais, você está desregulando tudo. Corremos o risco de chegar num processo onde não vai valer mais a pena investir em agricultura”, disse.
Da Redação