
Por Leonardo Sakamoto, no UOL.
“Se não começar votando a anistia, não tem negociação sobre tarifa.” Em áudio enviado no dia 13 de julho, o ex-presidente Jair Bolsonaro afirmou ao pastor Silas Malafaia que, se a anistia aos golpistas de 2022 e 2023 não for votada pelo Congresso Nacional, o Brasil pode dar adeus a qualquer negociação sobre a tarifa de 50% aplicada por Donald Trump aos produtos brasileiros.
Ou seja, se os parlamentares não o blindarem de uma condenação e prisão por tentativa de golpe de Estado, o Brasil vai perder milhares de empregos e negócios. “Resolveu a anistia, resolveu tudo”, indicando que se a sua vontade for atendida, as punições dos Estados Unidos serão removidas.
O áudio faz parte do relatório da Polícia Federal que indiciou Jair e seu filho, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, por coação no curso do processo que julga a tentativa de golpe de Estado. Deveria corar os governadores bolsonaristas que vêm bradando que o tarifaço não é resolvido por incompetência do governo Lula. Mas não foi isso que aconteceu.
O governador Tarcísio de Freitas, principal nome da direita hoje para disputar o Palácio do Planalto em 2026, criticou a divulgação das mensagens, mas não falou nada sobre a confissão de Jair.
“Me preocupa um pouco o rumo que as coisas estão tomando. Me preocupa um pouco o fato de você ver pessoas sendo investigadas, sendo objeto de ações judiciais simplesmente por fazerem críticas. Às vezes, eu vejo que isso não faz sentido. Então, onde é que a gente quer chegar com isso? Onde é que o Brasil vai parar? Não vejo aí um bom caminho”, afirmou. Lembrando que Bolsonaro não está sendo alvo de ação judicial por fazer críticas, mas por tentar um golpe.
Faz parte do jogo que pretendentes ao Palácio do Planalto culpem o presidente de turno pela situação. Mas ao ignorar que a família Bolsonaro está usando e sendo usada por uma nação estrangeira tenta subjugar o Supremo Tribunal Federal a inocentar o seu patriarca por crimes que cometeu e pressionar o Congresso Nacional a aprovar uma anistia, eles mostram que soberania e autodeterminação não é um princípio que lhes é caro.

É um cálculo político, claro. De olho nos institutos de pesquisas que apontaram uma recuperação da aprovação de Lula diante de sua reação ao tarifaço, evitam explorar o que gera voto para o adversário. O problema é que, com isso, acabam demonstrando que não se importam com a dimensão de interferência em nossos assuntos domésticos. Como confiar que, uma vez vez lá, não se curvarão a uma potência estrangeira quando ela obrigar o país a seguir sua vontade?
As decisões sobre o tarifaço estão centralizadas na Casa Branca e no Departamento de Estado, o que reforça que a questão não é simplesmente comercial, mas principalmente (geo)política. O governo brasileiro vem tentando negociar as tarifas antes mesmo dos 50% impostos pelos EUA, quando Trump anunciou que taxaria o mundo, porém, sem efeitos.
Não à toa a pesquisa Genial/Quaest, divulgada hoje, aponta uma melhora de Lula nos cenários de segundo turno do ano que vem. O petista precisa mandar jabuticabas de presente para Trump, pois o tarifaço reduziu a sua rejeição e deu uma reduzida nas intenções de voto dos candidatos do campo bolsonarista. Mesmo o nome mais competitivo, Tarcísio, que defende o padrinho Jair no episódio, viu a vantagem de Lula sobre ele passar de 4 para 8 pontos. Para uma parte do eleitorado, Bolsonaro está tóxico.