
Por Leonardo Sakamoto, no UOL
Confirmando as expectativas, o ex-presidente Jair Bolsonaro foi condenado hoje por tentativa de golpe de Estado. A pena deve sair até amanha, mas pode ultrapassar os 40 anos. Agora, resta pouco tempo para ele tentar fugir, uma vez que pode ser preso na carceragem da Polícia Federal em Brasília, em uma cela na Papuda ou, em um ato humanitário, ser concedido a ele o cumprimento da pena em casa.
Com o voto da ministra Cármen Lúcia e com o que foi adiantado pelo presidente da Primeira Turma, ministro Cristiano Zanin, o resultado final deve ser uma maioria de quatro votos a Fux, o que não dá direito à defesa a pedir embargos infringentes.
A condenação é um marco. Um sinal de amadurecimento das instituições brasileiras e um alívio para quem acredita que a democracia sabe se proteger. Mas é também o início de um novo capítulo de tensão, incerteza e potencial violência, alimentado por uma base radical que ainda vê no ex-capitão um mártir político, radicais e oportunistas políticos que buscam aprovar uma anistia no Congresso e um presidente dos Estados Unidos Trump que acha que a capital do Brasil é Washington DC.

A maior dúvida é se Bolsonaro aceitará cumprir a pena ou se, diante da condenação, tentará uma fuga. Seu espelho, Donald Trump, nunca foi preso, apesar de tentar coisa semelhante. Seu modelo, os autocratas que ele tanto admira, também nunca pagaram por seus crimes. Por que logo ele, deve estar pensando agora. Também deve estar refletindo que a ideia de passar anos atrás das grades é intolerável.
Jair já disse que nunca fugiria, mas também afirmou que nunca daria um golpe.
Ele já fez um test drive de fuga de dois dias na Embaixada da Hungria, em fevereiro do ano passado, após ter seu passaporte apreendido; fugiu para a Flórida dois dias antes do final do seu mandato com receio de que viesse a ser penalizado pela articulação golpista e para criar um álibi para o 8 de janeiro; e foi descoberto, em seu celular, uma minuta de um pedido de asilo ao governo Javier Milei, na Argentina. Não, mas ele não fugiria.
Uma tornozeleira não impede alguém de fugir, mas dificulta bastante. Jair não é um dos golpistas que participaram presencialmente do 8 de janeiro, cujo monitoramento das tornozeleiras se mostrou mais precário. Por ordem do STF, a polícia monitora as saídas de sua casa, onde está em prisão domiciliar. Mas, para um homem com suas conexões, um helicóptero ou uma pirulitada para uma embaixada, de onde conseguiria um salvo-conduto para sair do país, não são obstáculos intransponíveis.
A condenação de hoje não é o fim. É, na verdade, o início de um segundo teste para o sistema de Justiça, que precisará executar a prisão sem criar um mártir ou um novo epicentro de insurreição. E um teste para a sociedade, que precisará digerir o espetáculo grotesco de um ex-presidente se vitimizando atrás das grades sem que o país pegue fogo.
A lei prevê que a prisão seja iniciada após o trânsito em julgado, o que pode levar algum tempo. Mas os olhos agora se voltam para o dia em que isso ocorrer. O governo, é claro, quer evitar que Bolsonaro vire um símbolo de resistência a partir da cela. Mas os aliados que desejam herdar os seus votos, por outro lado, sonham exatamente com isso. Melhor do que um Bolsonaro cabo eleitoral solto, que fala besteira a rodo, é um Bolsonaro cabo eleitoral preso, que vira uma ideia e não abre a boca.
A aprovação de um projeto de anistia no Congresso é complicado e vai se enroscar em uma batalha legal com o STF. Contudo, a eleição presidencial de 2026 pode ajudar Bolsonaro, a depender do resultado e das mudanças nos ventos políticos. O que leva a ele uma outra ponderação: vale mais a pena empurrar um de seus filhos para concorrer ao Palácio do Planalto, e tentar manter o controle do poder, ou abençoar um aliado mais competitivo, e transferir de vez a liderança da direita no país?
Mesmo topando abrir a mão da liderança, ele ficará, pelo menos, um ano preso até que o Brasil decida se quer mesmo a direita de volta. Lula ficou 580 dias, conseguiu uma namorada e ficou marombado. Jair terá a mesma disposição?
Se preso, ele será um ativo para a extrema direita, um mártir. Contudo, se fugir, pode ser tachado de covarde, de medroso, de cagalhão. Ele tem um tempo muito curto para decidir se prefere sua liberdade ou seu legado.