
Por Leonardo Sakamoto, no UOL
Bolsonaro inaugurou a defesa pública da anistia em nome dos “pobres coitados do 8 de janeiro” no ato de 25 de fevereiro de 2024, na avenida Paulista. Usando a solidariedade aos seus seguidores como justificativa, defendeu, na prática, um projeto de lei que pode beneficiá-lo. Desde então, ele tem levado multidões às ruas em nome do pessoal que atacou as sedes dos Três Poderes através de atos golpistas em Brasília.
Mais de uma vez, Jair disse que não quer anistia para si mesmo. Se falou de forma sincera, o bolsonarismo no Congresso Nacional precisa urgentemente apoiar o projeto que está sendo gestado através diálogos entre as presidências do Senado e da Câmara e o Supremo Tribunal Federal.
Davi Alcolumbre e Hugo Motta estão finalizando negociação com o STF para aprovar uma lei que diminua as penas de quem participou dos atos golpistas, mas aumente a punição para as lideranças no futuro. A informação foi trazida por Mônica Bergamo, da Folha de S.Paulo.
Com isso, quem participou do 8 de janeiro pode ir para o semiaberto ou à prisão domiciliar — sem que sejam, de fato, anistiados. Já generais e o próprio Bolsonaro, ou seja, o pessoal graúdo que planejou e liderou a coisa toda, não seriam nem prejudicados (pois uma lei não pode retroagir desfavoravelmente a um réu), mas nem beneficiados também.

E é isso o que a maioria de seus seguidores quer. Entre os manifestantes no ato a favor da anistia que foram à avenida Paulista, no dia 6 de abril, 51% desejam tratamento diferenciado entre os que estavam no 8 de janeiro e as suas lideranças políticas. Outros 44% defendem que ambos os grupos deveriam ser tratados de maneira igual. O levantamento, feito pelo Monitor do Debate Político do Cebrap e da USP e pela ONG More in Common.
Como já disse aqui antes, falta um ato de sacrifício pessoal para que Jair Bolsonaro prove que é sincera a sua defesa de anistia para a turba de extrema direita que participou dos atos golpistas. Por enquanto, o que vemos é apenas oportunismo. Pois naquele 8 de janeiro, enquanto milhares de bolsonaristas atacavam as sedes dos Três Poderes, para tentar forçar uma intervenção das Forças Armadas, Bolsonaro cavalgava um calculado álibi nas cercanias da Disney. Agora, usa novamente o rebanho para seus interesses pessoais.
“Uma anistia para aqueles pobres coitados que estão presos em Brasília. Não queremos mais que seus filhos sejam órfãos de pais vivos. A conciliação!”, pediu o ex-presidente, em fevereiro de 2024. Desde então, parlamentares bolsonaristas tornaram a proposta em prioridade, deixando em segundo plano temas como a isenção de Imposto de Renda para quem ganha menos de 5.000 cascalhos por mês.
Querem fazer crer que isso é a principal pauta do país, por mais que, segundo pesquisa Genial/Quaest, 56% dos brasileiros sejam contra a anistia dos envolvidos nos atos golpistas, preferindo que continuem presos e cumpram suas penas. Apenas 18% acham que os envolvidos deveriam ser soltos porque nem deveriam ter sido presos.
Crimes contra a democracia foram cometidos e não podem ser perdoados sob o risco de reencarnarem daqui a alguns anos. Mas as instituições atenderam ao pedido de Bolsonaro, dando uma opção para que seus seguidores fiquem fora da cadeia. O preço para isso é ele e outros líderes do golpismo assumirem suas responsabilidades e pagarem pelos crimes aos quais forem condenados.
Sem que, claro, na última hora, o projeto seja mudado para favorecer Jair.
Terá Jair coragem para tanto? Ou vai articular no subterrâneo para se beneficiar? Ou fugirá para a Disney de novo?
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