O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL): Ele queria o passaporte de volta para ir à posse de Trump. Foto: Gabriela Biló

Por Leonardo Sakamoto, no UOL

Jair Bolsonaro é um líder político importante, mas não representa o Estado brasileiro. Para tanto, precisaria ter ganho a eleição presidencial ou obtido sucesso na tentativa de golpe de Estado, mas fracassou em ambas.

Outra alternativa seria se Lula pedisse a ele que, como ex-presidente, fosse à posse de Donald Trump, na próxima segunda (20), em nome do Brasil. Mas, se isso ocorresse, aí sim as teorias conspiratórias que apontam que o petista foi substituído por um clone reptiliano produzido em laboratório na China e alimentado por Coronavac e controlado por chips 5G soariam como verdadeiras.

Ele também poderia ir como cidadão comum, mas, para tanto, precisaria não ter sido indiciado por querer transformar o Estado democrático de direito em geleia. Qualquer pessoa podia conseguir um convite oficial genérico no site da posse – curiosamente o mesmo site que enviou a ele o convite que apresentou ao STF como justificativa para sair do país.

Após o ministro Alexandre de Moraes, do STF, atender ao posicionamento da Procuradoria-Geral da República, contrário à devolução de seu passaporte para que vá à posse de Trump, nesta quinta (16), Jair postou em suas redes uma declaração atribuída ao “Gabinete do Presidente Jair Bolsonaro” – seja lá o que for isso.

“Impedir Bolsonaro de comparecer enfraquece os laços diplomáticos e econômicos entre nossos países e afasta ainda mais o Brasil de um alinhamento com o mundo livre”, afirmou o texto.

“A decisão de hoje de Alexandre de Moraes de negar o pedido do presidente Jair Bolsonaro para comparecer à histórica posse do Presidente Donald Trump é uma grave decepção – não apenas para o presidente Bolsonaro, mas para os milhões de brasileiros que ele representa e para a duradoura amizade entre o Brasil e os Estados Unidos”, diz também

Apesar do excesso de autoestima do ex-presidente, a decisão não enfraquece laços diplomáticos e econômicos, nem é uma decepção para a duradoura amizade entre o Brasil e os Estados Unidos. Pode chatear o bolsonarista-raiz, que é muita gente, de fato. Contudo, o resto da população não vai gastar uma gota de suor de preocupação.

Ao pedir ao Supremo Tribunal Federal para ir à posse de Trump, Bolsonaro apostava em um jogo de ganha-ganha.

Moraes nega pedido de Bolsonaro para participar da posse de Trump | Radioagência Nacional
Jair Bolsonaro e Donald Trump: a posse do republicano acontece no próximo dia 20 de janeiro. Foto: reprodução

Se a resposta fosse um improvável sim, ele teria a chance de ir ao regabofe com a extrema direita global e, quem sabe, fugir de uma provável condenação no Brasil. Se fosse um não, como de fato ocorreu, poderia apelar ao vitimismo para tachar de perseguição o seu indiciamento por tentativa de golpe de Estado, como está fazendo.

Afirmou, na tal declaração, que ele “cumpriu todas as ordens judiciais desde que seu passaporte foi confiscado há quase um ano” e que “compareceu à posse do Presidente Javier Milei na Argentina em dezembro de 2023 com permissão de Alexandre de Moraes e retornou ao Brasil como prometido, provando mais uma vez que não representa risco de fuga”.

A questão é o que ele fez após seu passaporte ser apreendido, em 8 de fevereiro de 2024: refugiou-se na Embaixada da Hungria, governada pela extrema direita de Viktor Orbán, entre 12 e 14 de fevereiro. Muitos viram o episódio como uma espécie de test drive ou Airbnb de fuga.

Com o retorno de Trump ao poder, ele poderia pedir asilo político aos Estados Unidos, sob a justificativa de “comandar a resistência” direto da Disney.

Ainda pode, na verdade, porque a falta de passaporte é o de menos. Há outras formas de fugir do país caso necessário seja, ainda mais com alguém com recursos financeiros e políticos para tanto.

Mas uma frase da declaração que ele postou e aqui pincei está coberta de razão: “Isso não é sobre um homem ou uma decisão; não é sobre direita ou esquerda, é sobre o futuro da democracia no Brasil.”

Já deixamos os responsáveis pelo golpe de 1964 saírem impunes e o espírito golpista verde-oliva voltou para nos assombrar. Pelo futuro da democracia no Brasil, não podemos cometer o mesmo erro duas vezes e deixar a possibilidade de Justiça fugir.

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Last Update: 17/01/2025