O ex-presidente Jair Bolsonaro com camisa da seleção brasileira em protesto contra o Supremo Tribunal Federal (STF) na Avenida Paulista, em 7 de setembro de 2024. Foto: Carla Carniel/Reuters

Por Leonardo Sakamoto, no UOL

Políticos de massas gostam de usar metáforas para explicar o mundo. Lula normalmente apela às de futebol, Bolsonaro adota as de casamento. Nesta terça (25), o ex-presidente adentrou o campo do adversário e chutou nas redes, pouco antes de começar o julgamento de sua denúncia no STF, uma metáfora futebolística usando a seleção para sugerir que o ministro Alexandre de Moraes era um juiz-ladrão. Ironicamente, Jair levou um vexame no STF do mesmo tamanho do 4 a 1 que levamos da Argentina. E, em ambos os casos, a culpa é de quem perdeu.

“Brasil e Argentina em campo hoje às 21h no Monumental de Núñez. Vamos torcer pelos nossos garotos voltarem com a vitória. Já no meu caso, o juiz apita contra antes mesmo de o jogo começar… e ainda é o VAR, o bandeirinha, o técnico e o artilheiro do time adversário; tudo numa pessoa só”, postou.

A chance de um Brasil desorganizado levar um vareio da atual campeã da Copa do Mundo e da Copa América e líder das eliminatórias era grande, tal como a possibilidade de Jair levar um chocolate na análise da denúncia por tentativa de golpe de Estado, dissolução violenta do Estado democrático de direito, organização criminosa, entre outros crimes.

E isso não ocorre porque o colombiano Andre Rojas, árbitro da partida em Buenos Aires, ou Alexandre de Moraes, relator do caso em Brasília, pesaram a mão contra o Brasil e contra os denunciados, respectivamente. Mas porque não dá para bater de frente com os fatos: no futebol, a superioridade do adversário frente à nossa desorganização; na Justiça, a quantidade de evidências e provas que apontam Bolsonaro e outros sete, entre eles três generais e um almirante, por articular um plano para assassinar a democracia e permanecer no poder após a derrota nas urnas.

Bolsonaro resolveu assistir o julgamento no STF na primeira fila, para produzir vídeos e imagens para seus fãs mostrando que foi encarar de frente seus “adversários” e, ao mesmo, tempo tentar constranger os ministros da Primeira Turma e o procurador-geral da República, Paulo Gonet. Mas o constrangimento foi todo dele, de ter que ouvir uma longa capivara de crimes que teria cometido. E ver negados de forma fundamentada os seus pedidos em uma sessão na qual, como me comentou um renomado constitucionalista, faltou técnica à defesa. Veja só, como à nossa seleção.

Bolsonaristas no quartel-general do Exército, em Brasília, em novembro de 2022. Foto: Sergio Lima/AFP

A camisa amarela da CBF, sequestrada como uniforme pela extrema direita nos atos golpistas, também esteve presente indiretamente ontem no julgamento no STF. Moraes aproveitou a sessão para contestar a mentira de que o 8 de janeiro de 2023 foi cometido por “velhinhas com a Bíblia na mão”. Ele trouxe dados de idade e gênero, mostrando que mulheres idosas seriam uma pequeníssima minoria dos condenados, a maioria era de homens adultos.

Poderia ter ido além, contudo, apontando o caso de Fátima Mendonça Jacinto Souza, a Dona Fátima de Tubarão. Exaltada em um vídeo gravado pelos próprios golpistas por estar “quebrando tudo” vestida com a bandeira nacional, a idosa é uma das acusadas. Antes do envolvimento nos atos golpistas, já havia sido condenada por tráfico de crack, usando jovens menores de idade, em 2014. Também tentou fraudar o INSS e usou documentos falsos. Nas redes, difundia mentiras sobre o sistema eleitoral brasileiro.

A próxima possibilidade de a seleção passar vergonha é em junho, contra o Equador na casa do adversário. Mas para Bolsonaro, esta terça foi apenas o primeiro dia de julgamento da denúncia que deve torná-lo réu. Hoje pode ter mais chocolate.

Juízes podem errar e ser parciais no futebol e na Justiça. Mas os vexames de ontem, no Monumental de Nuñez e na Praça dos Três Poderes, não são culpa de quem julga, mas dos próprios derrotados. Isso pode servir de lição para o esporte e para a democracia para construir um país melhor ou para afundarmos ainda mais na lama da negação. Lembrando que, ano que vem, tem Copa do Mundo e eleição presidencial.

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Last Update: 26/03/2025