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Reportagem | Ana Oliveira e Felipe Borges

As terras raras, um grupo de 17 elementos químicos fundamentais para tecnologias avançadas e equipamentos de defesa, se tornaram o novo centro de disputa geopolítica envolvendo o Brasil. Com a segunda maior reserva mundial, o país voltou ao radar dos Estados Unidos após declarações de Donald Trump e recentes negociações diplomáticas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no entanto, reagiu à cobiça estrangeira: “Aqui ninguém põe a mão”.

A ofensiva mais recente partiu de Washington. Representantes do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) foram recebidos nesta semana por Gabriel Escobar, encarregado de negócios da Embaixada dos Estados Unidos no Brasil. A visita teve como objetivo discutir o interesse norte-americano em firmar acordos com o Brasil para aquisição de minerais estratégicos, em meio a uma disputa comercial intensificada pelas tarifas impostas durante a gestão Trump.

Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), o Brasil detém cerca de 20% a 25% das reservas conhecidas desses minerais no mundo. Entre os principais elementos estão o neodímio, praseodímio, térbio e disprósio — todos indispensáveis na fabricação de ímãs permanentes, utilizados em turbinas eólicas, carros elétricos, computadores, satélites e sistemas de armamento militar.

O valor comercial é proporcional à sua importância estratégica. O quilo de neodímio e praseodímio gira em torno de 55 euros (R$ 353), enquanto o de térbio ultrapassa os 850 euros (R$ 5.460). Para efeito de comparação, o minério de ferro custa cerca de R$ 0,60 o quilo. O alto preço e a demanda crescente colocam os elementos no centro da chamada corrida por minerais críticos.

Dependência da China

Hoje, a China domina completamente a cadeia global das terras raras. Produz 70% do total extraído no mundo e concentra também a capacidade de refino e processamento — etapas tecnicamente complexas e indispensáveis para tornar os minerais utilizáveis. A mina de Bayan Obo, no norte chinês, é a maior do mundo e supera largamente os depósitos da Austrália e da Groenlândia.

O monopólio chinês preocupa os Estados Unidos e a União Europeia. Para os elementos mais pesados, a dependência do Ocidente é total: 100% da importação europeia vem da China. A resposta tem sido a formação de estoques estratégicos e o mapeamento de alternativas em territórios aliados ou autossuficientes — como é o caso do Brasil.

Onde estão as terras raras no Brasil?

O mapa das terras raras no Brasil é amplo e se estende por diversas regiões. Uma das principais apostas está na Bacia do Parnaíba, que abrange áreas do Maranhão, Piauí e Ceará. Estudos revelam indícios promissores de depósitos com potencial de extração viável.

Outro ponto de destaque é Minaçu, em Goiás. A cidade abriga a única produção em escala comercial de terras raras fora da Ásia, com depósitos em argilas iônicas, semelhantes às encontradas no sul da China.

Além disso, há registros relevantes de ocorrência de elementos estratégicos nos estados do Amazonas, Minas Gerais e Bahia. A vantagem brasileira vai além do volume: o país conta com matriz energética limpa, estabilidade territorial, tradição mineradora e centros de pesquisa experientes, como os da USP e da UFMG.

Mas talvez a área mais simbólica seja a Elevação do Rio Grande (ERG), uma montanha submersa a 1.200 km da costa do Rio Grande do Sul, no Atlântico Sul. Com tamanho semelhante ao da Espanha, a formação geológica é reivindicada pelo Brasil como parte de sua plataforma continental. Estudos da USP indicam que o solo da ERG possui semelhanças geológicas com o interior paulista e é rico em cobalto, nióbio, lítio e elementos terras raras.

O reconhecimento da soberania sobre a ERG está em avaliação pela Comissão de Limites da Plataforma Continental da ONU. Se aprovada, a decisão ampliaria significativamente o território sob controle mineral brasileiro.

A reação de Lula

Diante do aumento do interesse internacional, o presidente Lula adotou tom firme. Em evento recente, criticou a pressão externa sobre os recursos estratégicos nacionais. “Tem gente achando que o Brasil é terra de ninguém. Mas aqui ninguém põe a mão. Nem no nosso lítio, nem no nosso nióbio, nem nas nossas terras raras”, afirmou.

A fala é parte de uma estratégia mais ampla de reforço da soberania mineral brasileira, diante de um cenário global de escassez e disputa por insumos críticos. A avaliação do governo é que os recursos devem ser usados para agregar valor dentro do país, priorizando parcerias tecnológicas e industriais, e não apenas exportações brutas.

Disputa global

A corrida por minerais estratégicos se insere em uma disputa mais ampla pela liderança nas tecnologias do futuro: baterias, energia limpa, inteligência artificial, infraestrutura militar. Sem os elementos do grupo das terras raras, nenhum desses setores avança.

Por isso, o que está em jogo vai além da exploração mineral: é uma disputa por autonomia, poder e relevância geopolítica. O Brasil, com sua enorme reserva e potencial de refino, está em uma posição decisiva — e agora sob os olhos atentos das potências globais.

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Last Update: 25/07/2025