A Rússia admitiu, neste domingo (11), que tropas ucranianas teriam penetrado na região de Kursk, em uma incursão que, segundo um alto funcionário de segurança ucraniano, tem como objetivo “desestabilizar” Moscou e dispersar as forças envolvidas na invasão da Ucrânia.
Na terça-feira, Kiev lançou uma operação surpreendente em larga escala na região fronteiriça russa de Kursk, dois anos e meio após o início da invasão da Ucrânia e depois de meses de recuo perante as forças russas no front leste.
De fato, o exército russo reconheceu, neste domingo, que a Ucrânia entrou profundamente em seu território, ao afirmar, em um comunicado, que tinha impedido “tentativas de avanço” em Tolpino, Juravli e Obshchi Kolodez, três cidades localizadas a cerca de 30 km da fronteira com a antiga república soviética.
Os avanços foram contidos por bombardeios aéreos, drones e artilharia, assim como pelo envio de contingentes do agrupamento “norte”, deslocado na região ucraniana de Kharkiv, segundo a mesma fonte.
“Estamos na ofensiva”, disse, por sua vez, o alto funcionário de segurança ucraniano na noite de sábado, sob a condição do anonimato.
“O objetivo é deslocar as posições do inimigo, infligir o máximo de perdas, desestabilizar a situação na Rússia – porque eles são incapazes de proteger suas próprias fronteiras – e transferir a guerra para o território russo”, disse.
O funcionário assegurou que “milhares” de soldados ucranianos participavam da operação.
Jornalistas da AFP viram, neste domingo, dezenas de veículos blindados ucranianos em rodovias da região de Sumy, fronteiriça com a de Kursk, com triângulos brancos pintados, supostamente para identificar as tropas ucranianas que participam da incursão.
O presidente ucraniano, Volodimir Zelensky, admitiu pela primeira vez no sábado o envolvimento do seu país na incursão na Rússia, afirmando que a operação visa “deslocar a guerra para o território do agressor”.
Segundo Moscou, que prometeu uma “resposta severa”, os ucranianos atiraram, na noite de sábado, um míssil contra um prédio na cidade de Kursk, ferindo 15 pessoas.
A Rússia já anunciou a retirada de mais de 76.000 pessoas da região.
O operador ferroviário russo fretou trens de emergência de Kursk para Moscou, a 450 km de distância, para quem quiser deixar o local.
“Dá medo ter helicópteros sobrevoando a sua cabeça todo o tempo. Quando foi possível ir embora, parti”, declarou Marina, que chegou à capital russa de trem neste domingo. Ela se negou a revelar seu sobrenome.
A Ucrânia, por sua vez, pediu a evacuação de pelo menos 20.000 civis da região de Sumy.
Em um centro de evacuação na capital regional homônima, Mykola, um aposentado de 70 anos que deixou sua aldeia – Khotyn, a cerca de 26 km da fronteira com a Rússia – afirmou, neste domingo, que a ofensiva em território russo lhe deu uma dose de ânimo.
“Deixemos que descubram o que é. Não entendem o que é a guerra. Deixemos que provem dela”, declarou.
Segundo analistas, Kiev provavelmente lançou o ataque para aliviar a pressão sobre suas tropas em outras partes do front, superadas em número e escassez de armas.
Mas por enquanto, a incursão não fragilizou de forma significativa a ofensiva russa no leste da Ucrânia, onde Moscou ganha terreno há meses, informou o alto funcionário de segurança ucraniano.
“A pressão no leste continua, não retiraram suas tropas desta área”, afirmou, embora “a intensidade dos ataques russos no leste tenha baixado um pouco”.
Kiev diz ter avisado aliados
A Rússia impôs estado de emergência na região de Kursk e anunciou o início de uma “operação antiterrorista” na localidade e em outras regiões fronteiriças.
O funcionário de segurança ucraniano admite que a Rússia “deterá” cedo ou tarde as tropas ucranianas na região de Kursk, mas se “depois de certo tempo não conseguir retomar estes territórios, estes poderiam ser usados com fins políticos”, por exemplo em negociações de paz.
Também afirmou que a Rússia, em resposta à incursão, prepara um ataque maciço com mísseis contra “centros de comando” na Ucrânia e assegurou que Kiev tinha avisado seus aliados ocidentais sobre a operação.
“Dado que foram usadas ativamente armas ocidentais” nesta ofensiva, “nossos parceiros ocidentais participaram indiretamente em seu planejamento”, ressaltou.
O funcionário ucraniano também assegurou que Kiev respeita “estritamente o direito humanitário” em sua ofensiva e que não tem a intenção de anexar as áreas que ocupa atualmente.
“É muito importante que a Ucrânia não viole nenhuma convenção, respeitamos estritamente o direito humanitário: não executamos prisioneiros, não estupramos mulheres, não saqueamos”, detalhou.