A Terceira Guerra Mundial está começando
Por Leonardo Silva Fernandes**
No domingo, 24, foi publicado o meu artigo “Cenários para a Terceira Guerra Mundial”, em que descrevi várias possibilidades para o conflito em curso entre Estados Unidos e Rússia.
No dia de ontem, segunda-feira 25, a Ucrânia atacou a retaguarda russa com mísseis ATACMS de fabricação americana, atingindo o aeroporto militar de Khalino na cidade de Kursk.
Fontes ucranianas dizem que o ataque foi bem-sucedido, enquanto fontes russas negam danos significativos. Ambas reconhecem que o ataque ocorreu.
Não apenas sistemas sofisticados como o ATACMS são operados por militares americanos atuando clandestinamente na Ucrânia, como a identificação, a seleção e o mapeamento das coordenadas espaciais dos possíveis alvos são levados a cabo a partir de ISR, que somente têm como ser providas pelos Estados Unidos.
Também no dia de ontem, a Casa Branca admitiu oficialmente que a Ucrânia está autorizada a utilizar mísseis ATACMS para ataques a território da Rússia, com a ressalva de que essa autorização vale apenas para a província de Kursk.
Vladimir Putin havia deixado claro que, se esse tipo de ataque voltasse a ocorrer, instalações militares dos países ocidentais envolvidos seriam alvo de retaliação russa.
Ainda que Putin pudesse estar determinado a levar para casa todo e qualquer desaforo, os americanos não estão dispostos a lhe deixar nenhuma margem de manobra.
Naquele texto meu publicado anteontem, eu estimei em cinco por cento as possibilidades de algo assim ocorrer. Hoje, porém, já estou achando cinco por cento muito.
Em suma, a Terceira Guerra Mundial começou.
A retaliação russa virá – e os americanos não têm dúvidas quanto a isso. Assim, eles já estão preparados para o “pós-retaliação”, ou seja, para a escalada militar contra os russos. A Rússia, igualmente, também está preparada para esta escalada.
O problema com a escalada é que ela rapidamente conflui para uma guerra nuclear – a menos que, no decorrer do processo, um dos lados consiga “se impor” sobre o outro, manifestando tamanha superioridade militar que leve o outro lado a recuar.
Essa capacidade de imposição é denominada no jargão militar de “escalation dominance”. Naturalmente, nem americanos nem russos percebem um no outro tal capacidade, do contrário não cometeriam o desatino de desafiar o oponente.
Contudo, analistas militares como Andrei Martyanov advogam que a Rússia possuiria sim essa capacidade de dominar a escalada – tomara que ele tenha razão, do contrário o conflito culminará em guerra nuclear.
No meu texto de anteontem, tomei por base as palavras de Putin para prever que a Rússia em algum ponto da escalada jogará uma bomba nuclear em alguma cidade ucraniana, dando no entanto aviso prévio para propiciar a fuga do máximo possível de civis.
O propósito seria intimidar os americanos e levá-los a interromper a escalada, na premissa de que eles iriam recear que outras bombas nucleares viessem a exterminar cidadãos americanos.
Ainda que algo perturbador assim possa fazer sentido, isso não seria domínio da escalada, seria no máximo uma tentativa de estancar a escalada antes que as coisas fiquem realmente MUITO feias.
Enfim, a todo mundo no mundo (inclusive aos americanos e russos), restará prender a respiração enquanto acompanhamos o desenrolar dos acontecimentos.
A respeito do timing para a retaliação russa ao ataque ucraniano/americano de ontem: considero improvável que essa retaliação venha de imediato. Ao contrário dos americanos, os russos são mais cerebrais e menos impulsivos.
O que está em jogo é o destino do país (Rússia), e a “dosagem” da resposta necessita ser muitíssimo bem ponderada, calibrada e planejada.
E se, no final das contas, vier mesmo a guerra nuclear? O mundo vai acabar? Não, o mundo não vai acabar.
O que vai acabar com toda certeza é ESTE mundo ao qual estivemos acostumados desde o dia que nascemos. E então precisaremos inventar um novo mundo, e um novo modo de vivermos nele as nossas vidas.
Partilhei as minhas reflexões a esse respeito no texto “O Pós-Guerra Nuclear no Brasil”, que lhe convido a acessar.
**Leonardo Silva Fernandes (contato e pix [email protected]) é ativista, pacifista e autor do livro Uma Nova Utopia para o Brasil: Três guias para sairmos do caos.