Relatório divulgado pela ONG Oxfam durante o Fórum Econômico de Davos traça um panorama brutal da concentração de renda no planeta e a origem das fortunas acumuladas pelos bilionários.
Segundo o estudo nomeado Takers, Not Makers (algo como “tomadores, não criadores” em tradução livre), a maior parte das fortunas dos atuais bilionários, 60%, vem de herança, monopólio, vínculos com poderosos e corrupção. Demolindo o mito da meritocracia, o levantamento revela que todos os bilionários com menos de 30 anos são herdeiros.
Essa riqueza, porém, passada de geração a geração, não surgiu do nada. É resultado direto da pilhagem colonial das grandes potências sobre os países periféricos. Os países ricos, apesar de contarem com apenas 21% da população mundial, concentram 69% de todas as riquezas do planeta. Exemplo de como isso ocorre, entre 1795 e 1900, os 10% mais ricos do Reino Unido extraíram algo como US$ 33,8 trilhões da Índia.
Se no passado a espoliação se dava pela força das armas, hoje isso ocorre principalmente pelo mercado financeiro. Segundo o relatório, “os países de baixa e média renda gastam em média quase metade de seus orçamentos nacionais com pagamentos de dívidas, muitas vezes para credores ricos em Nova York e Londres. Isso supera em muito o investimento combinado em educação e saúde”. Isso fez você se lembrar de algum país? Isso mesmo, é a descrição perfeita do que ocorre no Brasil, no mecanismo da dívida pública, reforçada e garantida por meio do arcabouço fiscal do governo Lula.
Só em 2023, calcula-se que o 1% mais rico dentre os bilionários dos países ricos extraiu US$ 30 milhões por hora dos países pobres. Prevê-se que investidores e instituições financeiras dos países ricos extraiam US$ 1 trilhão a cada ano dos países periféricos. Já as ajudas humanitárias aos países mais miseráveis somaram apenas US$ 223 bilhões, o que expõe o cinismo dos países ricos que, enquanto pilham até o último centavo numa espécie de colonialismo moderno, reservam uma ínfima fração para questões humanitárias.
Outros mecanismos de transferência de renda compreendem o comércio desigual. Cálculos realizados entre 1995 e 2015 mostram que foram extraídos US$ 242 trilhões dos países periféricos só por meio do comércio. Em geral, os países periféricos exportam produtos de baixo valor agregado, enquanto são obrigados a importar mercadorias com maior tecnologia, ou seja, mais caras.
Finalmente, a exploração direta dos trabalhadores dos países periféricos também contribui para esse enorme fosso social. Estima-se que os salários dos países dominados sejam de 87% a 95% mais baixos que nos países centrais. Por outro lado, os mesmos trabalhadores que recebem menos contribuem com 90% para a mão de obra de todo o planeta, mas ficam com apenas 21% da renda.
Sanguessugas
Uma concentração cada vez maior
Essa transferência de renda para os bilionários se acelerou numa velocidade três vezes mais rápida em 2024 que em 2023. Nesse período, cada bilionário aumentou sua fortuna, em média, em US$ 2 milhões por dia. Já os dez mais ricos dentre esses bilionários ganharam mais de US$ 100 milhões por dia.
Só no ano passado, o número de bilionários aumentou de 2.565 para 2.769, acumulando uma fortuna de inimagináveis US$ 15 trilhões. “A riqueza dos dez homens mais ricos do mundo cresceu em média quase US$ 100 milhões por dia – mesmo que perdessem 99% de sua riqueza da noite para o dia, ainda permaneceriam bilionários”, aponta o relatório.
Essa arrancada forçou a Oxfam a rever seus cálculos. Segundo a organização, o primeiro trilionário (em dólares) surgiria no mundo em cinco anos. Com a aceleração da concentração de renda, agora prevê-se que teremos cinco trilionários até o final da década.
Do outro lado, temos o mesmo número de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza desde 1990: 3,6 bilhões de pessoas, quase metade da humanidade, sobrevivendo com uma renda equivalente a US$ 6,85.
Não adianta só taxar
É preciso expropriar os bilionários e romper com a dívida
O relatório divulgado pela Oxfam é bastante útil para denunciar uma desigualdade social talvez sem precedentes na história da humanidade, tal como desvelar os mecanismos espúrios pelos quais se acumula tanta fortuna.
A saída apontada pela ONG, porém, não resolve os problemas. Taxar os bilionários é necessário, mas isso por si só não acaba com os problemas que o próprio relatório aponta. Muito menos regulamentar o mercado financeiro ou limitar os salários dos CEOs das multinacionais. Ou seja, um remendo dentro do sistema que garante que a roda do capitalismo continue girando e produzindo mais desigualdades.
É necessário expropriar os bilionários, os monopólios e as grandes empresas, suspender o pagamento da dívida pública e estatizar, sob controle dos trabalhadores, o sistema financeiro.