Horas depois do anúncio da vitória de Donald Trump na disputa pela presidência dos Estados Unidos, em novembro, milhares de afro-americanos receberam uma mensagem no celular pedindo que eles comparecessem em um determinado endereço, pois voltariam a plantar algodão – em referência a um capítulo escravagista da história norte-americana.
A informação é do jornalista Jamil Chade, correspondente internacional e referência em geopolítica, que descobriu o fato porque, sediado em Nova York, recebeu um e-mail da escola em que os filhos estudam, informando que a instituição de ensino estava tomando as devidas providências.
Chade, entrevistado do programa TVGGN 20H da última sexta-feira (17), contou que terá início nesta segunda-feira (20), dia da posse de Trump, um mundo absolutamente assustador – especialmente após o conluio do bilionário presidente com os magnatas das redes sociais, que dão continuidade à relação história do setor privado americano com o poder.
“A grande novidade é que, obviamente, esse salto é digital. Esse salto digital representa, obviamente, uma ameaça, não só no que se refere à soberania. Antes você precisava, para defender a Chiquita, você precisava de tropas americanas invadindo a América Central, um país na América Central ou qualquer outro lugar. Hoje você pode fazer isso de uma forma, eu diria, muito mais limpa, com justamente uma operação de inteligência, mas não uma operação de inteligência no sentido de espiões ou nada disso, mas justamente de fraturar sociedades no exterior, de conseguir influenciar o pensamento, o coração, as percepções em todo mundo, em direção a um lado ou em direção ao outro”, observou o jornalista.
Assim, Chade acredita que o mandato do republicano será uma grande ameaça para o mundo, em especial porque até o presidente Joe Biden, que deixa a Casa Branca neste domingo (19), reconheceu o perigo do avanço das oligarquias no próprio país para criticar a concentração exagerada de poder e dinheiro nas mãos de poucas pessoas.
“Essas poucas pessoas que têm a capacidade, diante desse poder, de traçar o destino daquela nação. Então, é uma democracia? Será? E essa é a pergunta, esse é o ponto que o Biden coloca ali. Será mesmo que essa democracia resiste diante de uma oligarquia que chega ao poder? Vamos lembrar dos ministros e secretários e chefes de departamento que o Trump escolheu, nove deles são bilionários”, ressalta o correspondente, que critica o atraso de Biden em reconhecer a desconexão do Partido Democrata com os trabalhadores.
Resistência
O projeto político de Trump é claro: desmontar, cada vez mais, o Estado norte-americano, sob a justificativa de que a liberdade americana e as liberdades fundamentais estão ameaçadas.
“O problema é que quem lidera essa ofensiva pelas liberdades são grupos que desmontam as liberdades. São grupos que querem a liberdade só para eles. Então, por exemplo, o Trump vem falando de paz, mas é a sua paz. Não é a paz que interessa para outros, é a paz que interessa aos americanos”, continua o entrevistado.
Outro ponto relevante para Chade é a chegada da extrema-direita ao poder, tendo em vista que todos os convidados para a posse de Trump são extremistas – o que resulta, basicamente, na criação de uma internacional fascista.
Para enfrentar tal fato, criou-se nos EUA o que o jornalista chama de trincheira legalista, em que grupos que devem ser perseguidos nos próximos quatro anos recebem instruções claras de como reagir a assédios, a quem procurar, quais são os seus direitos, entre outras indicações.
“Uma das recomendações, por exemplo, aqui da sociedade civil é se você vê um vizinho sendo alvo de um ataque, da polícia, etc., apareça, vá à porta, vá à rua, fique na frente da casa. Ou seja, para mostrar, inclusive, para as autoridades, que nós estamos aqui. Então, constranger aquela violação de direitos humanos”, aponta Chade.
Impacto político
Em relação à influência política, a vitória de Trump na disputa pela Casa Branca deve fortalecer o bolsonarismo, que vai tentar usar a proximidade ideológica com o presidente norte-americano para angariar votos.
Mas a eleição da extrema-direita no Brasil em 2026 também deve atender aos interesses de Trump. “É um cenário perfeito para o Trump. Milei [presidente da Argentina], Noboa, no Equador e um bolsonarista ou uma extrema direita no Brasil. (19:21) Então, é um cenário a ser pensado, sim.”
Confira a entrevista completa em:
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