Frederico Trajano, presidente do Magazine Luiza, apresentou os resultados para os acionistas e o mercado com uma definição importante para entender o varejo brasileiro. Para ele, o que atrapalha os resultados do comércio não é a capacidade de compra. O problema está na estratégia de controle da inflação: a Selic. Ele foi incisivo em afirmar que não há uma queda de renda e consumo, mas um problema de juros altos e carga tributária.
No primeiro trimestre, as vendas do Magalu ficaram praticamente estagnadas – crescimento de 0,2%. Já o lucro líquido apontou uma queda de 54,3%, ficando em 12,8 milhões de reais. A receita líquida foi de 9,389 bilhões, crescimento de 1,6% em relação ao mesmo período de 2024.
A reclamação do presidente do Magazine Luiza ocorreu na mesma semana em que o Banco Central, mais uma vez, elevou a taxa básica de juros, chegando agora a 14,75%. A Selic interfere diretamente no poder de investimento das empresas e no poder de compra dos consumidores. A desaceleração da economia é o objetivo central para, assim, conter a inflação futura. Novamente, o setor do varejo tem a sensação de que o remédio está provocando uma doença mais grave, que pode tornar-se cíclica.
Pnad confirma Trajano
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios traz um dado que confirma a fala do presidente do Magazine Luiza: o rendimento médio real dos brasileiros chegou a 3.057 reais em 2024, o maior valor desde 2012, já descontada a inflação. O crescimento foi de 2,9% em relação a 2023. De acordo com o IBGE, responsável pelo estudo, 66,1% da população, ou 143,4 milhões de brasileiros, teve alguma renda no período.
O valor médio pelo trabalho registrou outro recorde: chegou a 3.325 reais em 2024, superando os 3.160 reais aferidos em 2020. A soma dos rendimentos de todos os brasileiros representa um valor mensal de 438,3 bilhões de reais. Uma bolada que pode estar voltada para o consumo e até para a poupança. As regiões que mais cresceram foram Nordeste e Sul.
A renda dos aposentados é outro destaque. Eles formam 13,5% da população e têm uma média mensal de rendimentos de 2.520 reais. São um segmento importante do mercado de consumo e, mais importante ainda, asseguram o sustento de milhões de famílias. Os dados confirmam a visão de que o problema do varejo e das empresas, de fato, não está na renda. Está nos juros usados para reduzir o consumo, mas que acabam afetando os investimentos do setor produtivo e reduzindo a competitividade do Brasil.
O varejo alimentar está no jogo
O Assaí é a segunda maior rede de varejo alimentar do País, com um faturamento na casa dos 80 bilhões de reais. Na apresentação de resultados para investidores, seu presidente, Belmiro Gomes, apontou uma mudança de preferência dos consumidores para marcas mais baratas.
Além da inflação dos alimentos, o fenômeno é provocado por uma mudança na estrutura de gastos dos consumidores, avalia o empresário. As bets entraram definitivamente no jogo do varejo alimentar. E no bolso das classes C e D, a maior fatia de consumidores dos chamados atacarejos – grandes atacadistas que também vendem produtos no varejo. Recentemente, o Banco Central falou em gastos anuais ao redor de 300 bilhões de reais com apostas, cerca de 30% do faturamento de todo o varejo alimentar.
O movimento de troca de marcas indica ao menos dois desafios. As marcas mais caras terão de justificar seus preços, de forma que o binômio qualidade e valor percebido construa a percepção de um preço justo. O outro desafio é do próprio varejo. Vender o mesmo volume de produtos, mas a preço menor por unidade, dificulta a manutenção dos resultados dos negócios. É preciso garantir a frequência de compra dos consumidores, criando mecanismos para garantir o valor médio do ticket. O foco é criar ações para que o cliente permaneça visitando o canal de vendas.
Não está dando match
O Match Group, empresa líder global no mercado de aplicativos de relacionamento, vai cortar 13% de seus funcionários. A decisão vem de uma queda de usuários provocada, especialmente, pela redução de adesão dos mais jovens. O objetivo é alcançar 100 milhões de dólares de economia anual, destacando que, ainda em 2025, a meta é chegar a 45% desse valor. A empresa é dona das marcas Tinder, OkCupid e Hinge.
No primeiro trimestre, o lucro do Match foi de 117,6 milhões de dólares. Na receita, a queda foi de 3%, fechando o período com um total de 831,2 milhões de dólares. Houve queda de 5% de usuários pagos. O Tinder, maior marca do grupo, perdeu 7% em receita e 6% de seus usuários. •
Publicado na edição n° 1362 de CartaCapital, em 21 de maio de 2025.
Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘Remédio ou veneno?’