A cena pública tem sido bastante movimentada neste início de 2025 em caráter bastante preocupante para quem se mobiliza na defesa da democracia e dos direitos que garantam paz e justiça para todos.
Novos métodos de propagação da desinformação, inflados pelas plataformas digitais (big techs), amplificam o uso do medo e do terrorismo verbal, por parlamentares extremistas de direita, como estratégia de oposição política (caso, por exemplo, da mentira sobre a taxação do Pix).
Parlamentares brasileiros viajam aos Estados Unidos para a posse de Donald Trump, celebram o triunfo da ultradireita e articulam reuniões políticas para solicitar medidas dos EUA contra o seu próprio país. Nos primeiros dias no poder, Trump deu início a um governo de caráter imperialista tirânico.
Enquanto isso, no último dia 1 de fevereiro, a posse dos novos presidentes da Câmara Federal e do Senado do Brasil, ligados à direita fisiológica denominada eufemisticamente de “Centrão”, adiciona novos ingredientes a este cenário tão nebuloso. Neste contexto, circulam discursos, ações e personagens com identidade religiosa, majoritariamente evangélica e católica.
Em meio a este turbilhão político-religioso que 2025 vai moldando, importa registrar o lugar da resistência e da esperança como motores que sempre marcaram a cena pública brasileira e que têm na religião um foco de propulsão importante. Sim, é preciso sempre reafirmar que religião é uma força política que não é necessariamente sinônimo de conservadorismo. Para justificar esta afirmação, trago dois elementos concretos deste mesmo começo de 2025. E os dois ocorridos no mesmo dia.
Neste 4 de fevereiro iniciou o 1º Seminário Nacional LBGTQIA+ de Fé: Diálogo Inter-Religioso e luta contra os fundamentalismos, que reuniu, no Rio de Janeiro, pessoas das mais diferentes confissões e movimentos religiosos, sob a promoção do Fundo Positivo. Plenárias com pessoas convidadas, religiosas, ativistas e pesquisadoras, que abordaram a política de aproximação e o enfrentamento dos fundamentalismos a partir da ética da diversidade alimentaram reflexões densas. Na programação houve também grupos de estudo, com os temas “Bíblia e diversidade sexual e de gênero”, “Terapias de Reversão”, “Fundamentalismos Religiosos”, “Intolerância Religiosa”. A organização em breve divulgará uma carta aberta resultante de todas as discussões.
Significa muito a abertura de um espaço em que pessoas de fé evangélica, católica, afrorreligiosa, islâmica, judaica, espírita se unem em torno da defesa da vida, do direito de professar a fé e viver livremente a sexualidade. Isto torna nítido que os grupos conservadores, fechados à justiça de gênero, não têm o monopólio da religião e da orientação da fé. Pelo contrário, ratifica-se que o mundo vive transformações permanentes, com destaque para as religiões na defesa da igualdade de direitos e, acima de tudo, o direito à vida, contra toda intolerância.
No mesmo 4 de fevereiro foi lançada a nova formatação da Plataforma Religião e Poder do Instituto de Estudos da Religião (ISER) com novo design e aperfeiçoamento da sua política editorial. Este espaço digital, criado em 2020, para promover o acesso a informações e a análises confiáveis sobre a relação entre religião e política, a partir das pesquisas e estudos promovidos pelo ISER e por seus colaboradores/as. O veículo se consolidou como uma referência neste tema para pesquisadores/as, jornalistas/as e o público mais amplo com interesse neste conteúdo. A Plataforma tem, então, contribuído substancialmente para qualificar o debate público, com o alcance de um número significativo de acessos orgânicos.
No lançamento, a atenção ao fato de que parlamentares que apoiam a formação de uma frente com identidade religiosa no Congresso Nacional não é necessariamente vinculado àquela religião enfatizada, já se configurava uma reflexão importante a ser socializada na Plataforma Religião e Poder. O monitoramento dos Projetos de Lei da Câmara Federal, com acompanhamento contínuo, mensal, de propostas legislativas em tramitação que abordam temas religiosos ou questões éticas relacionadas à fé amplificou esta compreensão.
Outro caminho importante ao longo dos anos foi o estudo das candidaturas de cunho progressista, em processos eleitorais a partir de 2020, no enfrentamento ao avanço dos extremismos de direita, que inclui significativas entrevistas com lideranças.
Além dos dados abertos que embasaram as pesquisas, os levantamentos e análises desenvolvidos pelo ISER, Religião e Poder tem contribuído com o aprofundamento, por meio de informações, definições e explicações, de temas presentes na arena pública por meio da seção “Glossário”. A recepção positiva da coleção motivou uma publicação impressa: o “Dicionário para entender o campo religioso”, que pode ser baixado gratuitamente. Há também textos com pesquisas diversas que relacionam religião e política nos três poderes da República e nas pautas que permeiam a cena pública.
O conteúdo que a Plataforma Religião e Poder socializa contribui com a compreensão do que foi desenvolvido no 1º Seminário Nacional LBGTQIA+ de Fé e por muitas outras iniciativas de pessoas, grupos e movimentos religiosos no Brasil. É a afirmação do que precisa ser reconhecido, assimilado e valorizado por quem defende a democracia, a justiça e os direitos: religião é uma força política e não é sinônimo direto de conservadorismo. Afinal, as expressões de fé são instrumentalizadas, sim, por grupos e lideranças articuladoras de projetos de poder fundamentalistas que negam a diversidade, o diálogo e vivem de combater inimigos forjados em suas próprias convicções. Porém, em meio a elas, acima disto, está muita gente que sobrevive, resiste e acredita em uma presença divina cuja essência é o Amor.