Deputado petista acredita que futuro pontífice seguirá na linha progressista
No próximo dia 26 de abril, o mundo assistirá ao funeral do papa Francisco, que morreu nesta semana aos 88 anos. Será uma cerimônia inédita, muito mais simples do que a dos seus antecessores, como deixou expresso o próprio pontífice.
Assim era Francisco, o simples, o humanista, o generoso, o acolhedor, o misericordioso, o bem humorado, que sempre defendeu que a Igreja deixasse de lado todo o luxo e toda a ostentação para se aproximar cada vez mais dos pobres. Assim era Francisco, o papa dos Direitos Humanos.
Francisco trocou o Palácio Apostólico pela casa de hóspedes do Vaticano, abriu as portas para os sem teto, escutou a sociedade em diversos encontros, sempre atento às periferias e buscando caminhos coletivos.
Em Fratelli Tutti (2020), sua encíclica sobre fraternidade universal, defendeu um novo modelo econômico — baseado na solidariedade e no bem de todos. No texto, cobrou que governos e empresas colocassem as pessoas à frente do lucro, para construir um mundo mais justo.
Organizou encontros sistemáticos com movimentos sociais de todo o mundo, como comunidades marginalizadas, trabalhadores informais, juventudes, trabalhadores sem terra, catadores de lixo e povos indígenas, entre outros. Em um desses encontros, lembrou: “Não há mudança sem luta, não há luta sem esperança, não há esperança sem fé.”
Ao longo de 12 anos de papado, o argentino Jorge Mario Bergoglio defendeu a população LGBTQIA+ e das mulheres, acolheu os divorciados, posicionou-se frontalmente contra o racismo e a xenofobia e fez apelos pelo fim das guerras.
Na prática, ampliou a inclusão das mulheres em funções de destaque dentro da Igreja Católica. Em 2013, quando foi eleito, elas eram 19,2% dos funcionários do Vaticano. Uma década depois, subiram para 23,4%, conquistando nomeações inéditas e o direito a voto em reuniões globais de bispos.
Em fevereiro de 2021, nomeou a religiosa francesa Nathalie Becquart como subsecretária do Sínodo dos Bispos, se tornando a primeira mulher com direito a voto na assembleia sinodal. Ainda em janeiro deste ano, nomeou a freira Simona Brambilla para a chefia de um dos departamentos mais importantes do Vaticano, o Dicastério para os Institutos de Vida Consagrada e Sociedades de Vida Apostólica, o departamento de todas as ordens religiosas.
Mudou a igreja, talvez menos do que desejava, foi um líder religioso de enorme expressão, mas também um líder político, em defesa dos mais empobrecidos e de todos os excluídos e vulneráveis, do meio ambiente, da paz, da solidariedade entre os povos e as pessoas e, portanto, contra as guerras, as injustiças socioambientais e a prática do lawfare (uso da justiça para perseguição política).
A morte de Francisco traz, para nós, católicos, um misto de tristeza e também de mais responsabilidades. Tristeza, por nos despedirmos da presença física dele. Mas uma tristeza misturada com uma alegria responsável, porque o legado do papa Francisco precisa permanecer entre nós, para o bem da humanidade. Ele entra, agora, na plenitude da vida. Entendo que pessoas como ele, não morrem, entram nessa plenitude, como alguém que cumpriu a sua missão e deixa um legado que a humanidade jamais irá esquecer que precisa ser levado adiante.
Lembro que, no dia da eleição do papa Francisco, eu era vereador na capital do Rio de Janeiro. Quando fizeram o anúncio e disseram que ele assumiria o nome de Francisco, eu dei um pulo da minha bancada, fui ao microfone e falei: “Que alegria termos conosco um papa que escolhe esse nome.”
Nesses 12 anos do papado, Francisco cumpriu essa missão. Deixa para a igreja um caminho sem volta, mesmo que a gente permaneça num espaço ainda de muito conservadorismo.
Foi um papa progressista, que teve a coragem de lidar com os temas mais atuais da humanidade, como o tema dos imigrantes, dos conflitos armados, do combate à fome, dos direitos humanos, do acolhimento a toda diversidade. Lidou com o tema ambiental, com o cuidado com a Mãe Terra.
Ele colocou esse ponto de inflexão na Humanidade, nesse tempo em que a extrema direita avança, quando algumas pessoas, inclusive dentro da própria da igreja ou das igrejas e das religiões, tentam conciliar, nem sei como, a religião com a indústria armamentista e a desigualdade, que são as mãos ao fascismo, ao nazismo.
O papa Francisco foi o homem que disse que não dá para trilhar caminhos tão opostos, tão díspares. A religião é o encontro com o divino, seja ela católica, cristã ou qualquer outra. Toda religião se baseia no acolhimento generoso, na fraternidade e no compromisso com os empobrecidos e os excluídos.
Esse é o legado que o futuro papa herdará, com a responsabilidade de continuar a pauta humanitária que o papa Francisco trouxe para nós. Precisamos fazer essa reflexão no Brasil e no mundo. Enfrentar os preconceitos, o racismo, a misoginia, a LGBTfobia, a intolerância religiosa, a propagação do ódio como arma política, contra de modelos econômicos que punem os povos e levam o planeta à degradação social e ambiental.
Em sua última mensagem, na véspera da morte, o Papa Francisco deixou um ensinamento irreversível: “Neste dia, gostaria que todos nós renovássemos a esperança e renovássemos a nossa confiança nos outros, incluindo aqueles que são diferentes de nós, ou que vêm de terras distantes, trazendo costumes, modos de vida e ideias desconhecidos! Pois todos somos filhos de Deus. Gostaria que renovássemos a nossa esperança de que a paz é possível.”
É por isso que o papa Francisco não morre. Ele está presente, na plenitude da vida.
Deputado federal Reimont (PT-RJ), Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Minorias e Igualdade Racial
Artigo publicado originalmente no Portal 247