Reforma Fiscal no Brasil: Entre a Eficiência e o Peso Sobre os Vulneráveis
por Ana Luiza e Maria José
A reforma fiscal anunciada pelo Governo Federal busca equilibrar as contas públicas, combater desigualdades e promover o crescimento econômico sustentável. No entanto, as propostas levantam preocupações sobre seu impacto mais severo sobre os segmentos mais vulneráveis da população.
Uma das principais mudanças envolve o reajuste do salário-mínimo, que altera a fórmula tradicional adotada nos governos anteriores. Antes, o cálculo considerava a inflação do ano anterior somada ao crescimento real do PIB de dois anos antes. Agora, sob a nova regra, o crescimento real será limitado pelo arcabouço fiscal, comprometendo os ganhos reais para os trabalhadores e enfraquecendo o impacto redistributivo de uma medida que, no passado, desempenhou um papel crucial na promoção da justiça social e no fortalecimento do mercado interno.
O abono salarial é um benefício pago anualmente aos trabalhadores formais de baixa renda como uma forma de complementar a renda e promover maior equidade no mercado de trabalho. Atualmente, ele é concedido a quem recebe até dois salários-mínimos mensais, funcionando como uma espécie de 14º salário proporcional ao tempo trabalhado no ano anterior. No entanto, as novas regras propostas reduzem o critério de elegibilidade para R$ 2.640,00, com reajustes anuais até atingir o equivalente a 1,5 salário-mínimo.
No caso do Benefício de Prestação Continuada (BPC), as mudanças incluem a ampliação do cálculo da renda familiar para incluir cônjuges não coabitantes e filhos coabitantes, além da exigência de atualização cadastral e biometria. O controle para evitar fraudes é importante, mas é fundamental que as novas regras não se tornem um obstáculo para pessoas em situação de extrema necessidade que buscam acessar o benefício.
O Bolsa Família, programa central na estratégia de combate à pobreza, também sofrerá ajustes. Restrições a famílias unipessoais e novas exigências cadastrais visam evitar abusos, mas é essencial que as mudanças sejam implementadas com cuidado para não prejudicar os mais necessitados.
Outra iniciativa relevante é a inclusão das Forças Armadas no esforço de ajuste fiscal. Medidas como a eliminação de pensões por transferência, o aumento da contribuição ao fundo de saúde e a definição de uma idade mínima para a reserva remunerada – ou aposentadoria – trazem avanços importantes. Esse é um momento oportuno para enfrentar privilégios históricos em um setor que ganhou destaque no debate público recente.
Além disso, as mudanças nas emendas parlamentares buscam restringir o crescimento de despesas discricionárias, priorizando recursos para áreas essenciais, como o Sistema Único de Saúde (SUS). A reforma do Imposto de Renda também é significativa, com a ampliação da faixa de isenção para R$ 5.000 e compensações pela inclusão de faixas mais altas de renda na tributação.
Outras ações, como o incentivo à educação em tempo integral, a revisão de subsídios e subvenções e a introdução de gatilhos para evitar déficits, mostram um esforço de maior transparência e racionalização dos gastos públicos. No entanto, o sucesso dessas medidas exige que os ajustes sejam equilibrados, sem sobrecarregar os mais pobres, que já enfrentam desafios significativos.
Cabe ao Estado garantir o crescimento econômico e a promoção de uma sociedade mais equitativa, com maior distribuição de renda, desenvolvimento sustentável e proteção social. Esses objetivos exigem investimentos públicos robustos e a manutenção de políticas de seguridade social que assegurem condições dignas para a população mais vulnerável.
Ana Luiza – Professora colaboradora no Programa de Pós-graduação em economia da UFF, pesquisadora de pós-doutorado do programa CAPES/PIPD e pesquisadora do Finde/UFF
Maria José – Professora titular na Universidade Federal Fluminense, pesquisadora CNPQ e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento – Finde/UFF
Blog: Democracia e Economia – Desenvolvimento, Finanças e Política
O Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (FINDE) congrega pesquisadores de universidades e de outras instituições de pesquisa e ensino, interessados em discutir questões acadêmicas relacionadas ao avanço do processo de financeirização e seus impactos sobre o desenvolvimento socioeconômico das economias modernas.
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