Israel voltou a negar, nesta segunda-feira (26), uma proposta de cessar-fogo aceita pelo Hamas e mediada pelos Estados Unidos. O acordo previa uma pausa de 70 dias nos ataques, a libertação de dez reféns israelenses vivos e dez corpo de reféns mortos, além de centenas de prisioneiros palestinos.
Em troca, o Hamas exigiu uma garantia formal de que a segunda fase do acordo — um cessar-fogo permanente — seria respeitada. Essa exigência ocorre porque o governo de extrema direita de Benjamin Netanyahu já havia rompido o acordo anterior, firmado em janeiro, ao retomar o massacre contra Gaza em março.
O recuo israelense gerou novas críticas internas e ampliou a pressão internacional. Em meio à destruição de cidades inteiras como Rafah e Khan Yunis, mais de 50 mil palestinos já foram mortos desde outubro.
A negativa israelense, apesar da adesão do Hamas, impõe novos obstáculos à libertação de reféns e evidencia a opção do governo Netanyahu por uma estratégia de guerra permanente, rejeitada inclusive por parte da sociedade israelense.
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Netanyahu frustra famílias de reféns com recuos calculados
Em pronunciamento em vídeo publicado na noite de segunda-feira (26), o primeiro-ministro declarou que esperava “anunciar algo sobre os reféns, se não hoje [segunda, 26], então amanhã [terça, 27]”.
A frase aumentou as expectativas das famílias, que passaram a pressionar o governo por confirmações. Horas depois, um porta-voz anônimo afirmou que Netanyahu não falava de forma literal e que a posição do Hamas seguia inflexível. Ou seja, o acordo por uma troca de reféns não seria concretizado.
A resposta foi imediata. O Fórum das Famílias dos Reféns acusou o governo de abuso emocional.
“Nos sentimos abusados. Comentários como esse fazem nossos corações já despedaçados dispararem. Esperamos o mínimo de sensibilidade”, publicou o fórum, em nota.
Einav Zangauker, mãe do refém Matan Zangauker, afirmou que o governo do premiê atua como uma espécie de torturador psicológico. “Netanyahu está nos torturando dia e noite, enquanto meu filho está sozinho num túnel. Isso é terrorismo psicológico contra as famílias”, disse.
A ex-soldado israelense Na’ama Levy, libertada em janeiro, denunciou que seu maior medo durante o cativeiro eram os bombardeios de Israel.
“Primeiro vem o assobio, depois as explosões. A cada vez, eu achava que seria o fim. Essa era a minha realidade. É a realidade deles agora. Eles estão lá, tremendo de medo, sem para onde correr”. relatou Levy.
Outro refém libertado, em reunião com Netanyahu, relatou temer ser morto por Israel e depois responsabilizarem o Hamas.
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Shin Bet, reféns e a estratégia da guerra permanente
Na sexta-feira (24), Netanyahu nomeou o general David Zini como novo chefe do Shin Bet, o serviço de segurança interna de Israel. A escolha foi criticada por representantes das famílias, já que Zini defende abertamente a rejeição a trocas de reféns.
“Sou contra acordos de reféns. Esta é uma guerra para sempre”, teria dito, segundo a emissora Channel 12.
O Shin Bet é responsável por operações de repressão nos territórios palestinos ocupados, contraterrorismo e segurança política interna. Atua diretamente em negociações indiretas com o Hamas.
O Fórum de Famílias reagiu com indignacão. “Nomear um chefe do Shin Bet que prioriza a guerra de Netanyahu à vida dos reféns é um pecado sobre um crime. Um golpe contra a solidariedade e contra o dever sagrado de não deixar ninguém para trás”, publicou em nota.
Alemanha rompe o silêncio, Europa amplia pressão contra Israel
Ainda na segunda-feira (26), o novo chanceler alemão Friedrich Merz rompeu com a política de alinhamento completo entre Berlim e Tel Aviv e criticou duramente a ofensiva em Gaza.
“Francamente, já não compreendo mais qual é o objetivo do Exército israelense. Causar tanto sofrimento à população civil não pode mais ser justificado como luta contra o terrorismo”, disse.
Merz afirmou que deseja manter relações com Israel, mas que “nenhum governo pode fazer coisas que nem seus melhores amigos estão mais dispostos a aceitar”.
A Alemanha havia evitado se somar às críticas mais duras de países como França, Reino Unido e Canadá, mas agora também passou a questionar as exportações de armas.
O comissário alemão contra o antissemitismo, Felix Klein, declarou que ‘fazer os palestinos passarem fome não tem nada a ver com proteger o direito de existência de Israel”.
Na União Europeia, o comissário de Esportes Glenn Micallef sugeriu sanções contra Israel também no campo cultural e esportivo: “Não deve haver espaço em competições para países que não compartilham nossos valores”.
“Há sangue derramado em Gaza, civis pagando o preço. O esporte deve promover os valores em que acreditamos — com qualquer país”, concluiu.
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