Segundo denúncia exclusiva recebida pelo Diário Causa Operária (DCO), a Polícia Federal (PF) mantém um palestino preso no aeroporto de Guarulhos há mais de 20 dias.
Abdullah Abu Zaid, de 47 anos, chegou ao Brasil em 14 de abril, quando foi detido. Natural da Arábia Saudita, é palestino por nacionalidade e possui um passaporte palestino emitido pela Autoridade Palestina (AP) na cidade de Ramala, na Cisjordânia.
Abdullah é refugiado desde que nasceu, impedido de entrar em seu próprio país por não possuir a documentação necessária. Segundo informou ao DCO, ele decidiu vir ao Brasil, pois considerou que receberia asilo. Além disso, sua esposa e seus dois filhos estão no País, tendo chegado apenas quatro dias antes dele. Na ausência do palestino, no entanto, sua família foi obrigada a morar em um abrigo na Mooca, em São Paulo.
“Não posso entrar na Palestina porque sou um refugiado e não possuo carteira de identidade nacional palestina. Decidi vir ao Brasil porque eu não tenho um país ou uma pátria, sou um refugiado segundo a lei internacional. Decidi vir aqui para solicitar asilo e proteção internacional a mim e à minha pequena família, pois o seu país é o país da liberdade, da democracia, da segurança, da paz e da estabilidade”, afirmou.
A este Diário, Abdullah disse que as autoridades brasileiras não o informaram sobre o motivo de sua detenção. Ele tampouco recebeu qualquer documento que explicasse as medidas tomadas pelos agentes da PF.
No entanto, há duas semanas, o supervisor da Qatar Airways no aeroporto de Guarulhos falou diretamente com Abdullah, afirmando que seu asilo não foi aceito e que ele deveria “voltar de onde veio”. “Disse imediatamente a ele que não concordo com isso e que esperava que a Polícia Federal falasse comigo diretamente, sem intermediários”, afirmou.
Além disso, um funcionário do aeroporto que também não trabalha na PF disse a ele que ele deveria ir para a Bolívia ou voltar para seu país de origem, já que o destino final de sua passagem não é o Brasil — prática comum e legal conhecida como skiplagging, quando o passageiro desembarca antes do final de seu trajeto.
Na Tunísia, ao solicitar asilo para o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), disse não ter recebido resposta. “Eles não me responderam, não cooperaram comigo e não me concederam permissão de residência de refugiados ou proteção internacional”.
O órgão emitiu, porém, um documento comprovando sua situação enquanto refugiado, no qual consta:
“Atenção: este documento não é um documento de identidade. O titular deste comprovante de agendamento é, no entanto, uma pessoa que apresentou um pedido de Proteção Internacional e deve ser protegida contra um retorno forçado ao seu país de origem ou a outro país onde possa ocorrer uma devolução forçada.”
Enquanto isso, Abdullah enfrenta um tratamento desumano no aeroporto de Guarulhos. Segundo relatou, está sendo privado de atendimento médico, alimentação e local para dormir adequados. Reproduzimos, abaixo, carta que ele redigiu descrevendo sua situação e clamando para que o presidente Lula intervenha para permitir sua entrada no Brasil.
“Para todos os envolvidos.
Sou um palestino chamado Abdullah Abu Zaid, detido no GRU Aeroporto de São Paulo desde 15/4/2025. Enviei um pedido de asilo. Minha esposa e meus filhos estão morando em São Paulo, em um abrigo do governo no bairro da Mooca.
Não esconderei de vocês que minha condição psicológica, moral e de saúde está piorando a cada dia. Estou fisicamente exausto há três dias e tenho amigdalite. Solicitei ambulância e atendimento médico mais de uma vez, mas só chegaram uma vez. Eles me deram apenas duas injeções. Eles não me deram remédios nem analgésicos. O tratamento aqui não é bom. Já faz 20 dias que entrei aqui e que faço solicitações e até agora não me atenderam em nada. São coisas muito simples, como utensílios de barbear e produtos de limpeza pessoal, como sabonete, xampu e pasta de dente.
Para sua informação, levei essas coisas dos requerentes de asilo comigo para o mesmo quarto. Para sua informação, também pedi que trouxessem minha bolsa e eles não me responderam. Para sua informação, há mais de três semanas não troco de roupa. Eu só tomo banho e visto as mesmas roupas. As pessoas aqui me odeiam por causa do cheiro podre das minhas roupas. Não tenho roupas para vestir e minhas roupas estão na mala e perguntei a eles e eles também não responderam, mesmo no nível de uma xícara de café ser proibido.
Por que esse tratamento ruim e essa crueldade? Eu sou um criminoso? Sou um terrorista por ser tratado dessa maneira em um país de liberdade, democracia e humanidade como o Brasil? E para sua informação também, todos que entraram aqui foram embora, menos eu, que fiquei por mais de três semanas!!! Por que todo esse tempo para processar e tomar uma decisão simples por um pobre palestino que não tem país nem abrigo, tudo isso porque eu sou palestino? Por que o palestino é um lutador do mundo inteiro? Por que ele não recebe proteção internacional, assistência, cuidado, atenção, apoio psicológico, espiritual, social e moral como o resto das outras nacionalidades neste mundo contraditório?
Peço a Deus e ao presidente brasileiro Lula, apoiador e simpatizante da causa palestina e da defesa dos direitos do povo palestino, que me apoiem, me ajudem e conquistem para mim segurança, proteção, paz, estabilidade, liberdade e dignidade aqui no amado Brasil.”
OUTRO LADO
O Diário Causa Operária (DCO) tentou contato com os Ministérios da Justiça e das Relações Exteriores, com a Polícia Federal (PF) e com a Presidência da República.
O Ministério da Justiça nos orientou a contatar a Polícia Federal, que, por sua vez, solicitou que a demanda fosse encaminhada para sua assessoria em São Paulo — o que já havia sido feito. O Itamaraty se limitou a “sugerir” que contatássemos as autoridades migratórias brasileiras.
Até o fechamento desta edição, não obtivemos resposta. O espaço segue aberto para esclarecimento por parte das autoridades brasileiras.