
O voto do ministro Luiz Fux na Ação Penal 2668, que julga o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete réus por tentativa de golpe de Estado, abriu divergência no Supremo Tribunal Federal (STF) e trouxe à tona novamente episódios polêmicos de sua trajetória. Nesta quarta-feira (10), Fux afirmou que o Supremo não tem competência para conduzir o processo, já que os réus não possuem prerrogativa de foro, e pediu a nulidade de todos os atos.
A manifestação contraria o relator Alexandre de Moraes e foi recebida com entusiasmo por advogados de Bolsonaro. Celso Vilardi, um dos defensores do ex-presidente, em conversa no intervalo do julgamento, declarou: “Lavou nossa alma”. Para o ministro, a mudança de interpretação sobre foro privilegiado “gera questionamentos sobre casuísmos” e pode ferir princípios como o juiz natural e a segurança jurídica.
Filha desembargadora
A fala de Fux, considerado por bolsonaristas “a esperança” de absolvição, reaviva lembranças de momentos em que seu nome esteve no centro de controvérsias. Um dos episódios mais lembrados envolve sua filha, Marianna Fux, nomeada desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro em 2016 sem passar por um concurso.
A escolha feita pelo então governador fluminense Luiz Fernando Pezão causou desconforto na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e em magistrados, que viram constrangimento em rejeitar a candidatura de uma advogada jovem, ligada a escritórios influentes e filha de um ministro do STF. A nomeação ocorreu após meses de disputas e acusações de “perseguição política”.
Após dois anos, Fux, quando presidia o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), absolveu Pezão de um processo por abuso de poder. Seu último ato na Corte foi interpretado como uma retribuição ao “favor” feito à sua filha.

Censura prévia
Outro momento marcante foi a decisão de 2018, quando Fux impediu Luiz Inácio Lula da Silva (PT), então preso por ordem de Sergio Moro, de conceder entrevista à Folha de S.Paulo na prisão, revertendo uma decisão do Ricardo Lewandowski, também do STF na época.
Na liminar, o ministro escreveu: “Determino que o requerido Luiz Inácio Lula da Silva se abstenha de realizar entrevista ou declaração a qualquer meio de comunicação”. E completou: “Determino, ainda, caso qualquer entrevista já tenha sido realizada, a proibição da divulgação do seu conteúdo”. A medida foi vista como censura e gerou ampla repercussão política e jurídica.
In Fux we trust
Nas conversas divulgadas pela Vaza Jato, entre o então juiz Moro e o ex-procurador do Ministério Público Deltan Dallagnol, um trecho chamou atenção pelo alinhamento de Fux com a operação Lava Jato, comprovadamente irregular.
Na ocasião, Dallagnol contou a Moro que tinha conversado com o ministro sobre ações da operação e de um embate com o ex-colega de Corte Teori Zavascki.
Animado com o relato do então procurador, o ex-juiz comemorou: “In Fux we trust” (em Fux nós confiamos, em tradução livre). A expressão voltou a ser repetida por Dallagnol após o voto contraditório nesta quarta-feira.
In Fux we trust pic.twitter.com/AWvl3J8gNa
— Cida Falabella (@FalabellaCida) September 10, 2025
8 anos travando direitos trans
Em 2015, o STF iniciou o julgamento que uma mulher trans moveu contra um shopping de Santa Catarina que a impediu de adentrar ao banheiro feminino. Após Luís Roberto Barroso e Edson Fachin votarem no que poderia abrir um precedente importante para pessoas trans, Fux pediu vistas do processo e só retomou a discussão no plenário em 2023.
No fim, a Corte decidiu por 8 votos a 3 rejeitar o recurso por entender que não se tratava de uma questão constitucional. Ou seja, o STF não chegou a julgar o mérito do caso. Assim, não há definição se pessoas transexuais podem ou não utilizar o banheiro de acordo com sua percepção de gênero.
Antes do STF
A carreira de Fux já havia sido marcada por outra polêmica, quando José Dirceu declarou em 2013 ter sido “assediado moralmente” por ele enquanto ainda era ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo Dirceu, Fux teria prometido absolvê-lo caso chegasse ao STF.
O ministro respondeu na época: “Ministro do Supremo não polemiza com réu”. Anos depois, no julgamento do mensalão, votou pela condenação do ex-ministro da Casa Civil. Fux é ministro da principal corte do país desde 2011, quando foi indicado pela então presidente Dilma Rousseff (PT).

Fux e o bolsonarismo
Durante o governo Bolsonaro, Fux foi condecorado com a Ordem de Rio Branco no grau de Grã-Cruz, em 2020. Apesar de nunca ter sido próximo do ex-presidente, proferiu votos que favoreceram o governo em alguns momentos, como na liberação da venda de subsidiárias da Petrobras e na decisão que barrou a reeleição de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre no Congresso, em sintonia com os interesses do Planalto.
Em outras ocasiões, porém, contrariou Bolsonaro, como ao manter Alexandre de Moraes como relator do inquérito sobre interferência na Polícia Federal e ao votar para permitir que estados e municípios decretassem a obrigatoriedade da vacinação contra a Covid-19.
Agora, no julgamento da trama golpista, seu posicionamento volta a colocar em evidência sua relevância política e jurídica. Para críticos, Fux tenta reabrir uma discussão já superada pela Corte sobre competência do STF.
Para defensores de Bolsonaro, no entanto, sua fala sinaliza a possibilidade de revisão do processo. O ministro ainda não concluiu seu voto, mas a expectativa é que finalize mantendo a tese de que “impõe-se a nulidade de todos os atos decisórios praticados”.