O artigo “Tenho preço”, de Oliveiros Marques, publicado nesta segunda-feira (8), no Brasil247, tenta criar um clima de muito espanto sobre uma coisa até corriqueira na política, o estabelecimento de preços. Embora a atitude de Flávio Bolsonaro não tenha o valor que Marques tenta estipular.
No primeiro parágrafo lê-se que “qualificar como apenas ‘desastrosa’ a declaração do senador Flávio Bolsonaro – aquela em que ele afirma que a manutenção de sua candidatura à Presidência tem um preço – é um gesto de generosidade olímpica. Em tempos de cortes, trata-se de um luxo retórico que ninguém deveria se permitir. Dentro do contexto, já é uma sinalização péssima. Fora dele, beira a automutilação política. Em qualquer das circunstâncias é digna de fazer a cotação do cacau disparar nas bolsas de valores de Londres e Nova Iorque”.
Não tem nada de automutilação política. Flávio Bolsonaro dobrou a aposta, pois a prisão de seu pai, Jair Bolsonaro, tinha por objetivo justamente comprar seu apoio ao candidato da burguesia para a próxima corrida presidencial. Se Bolsonaro fosse o candidato do grande capital, por que todo esse ruído nas Bolsas?
Prender alguns generais de pijama e Bolsonaro, supostamente, o forçaria a negociar. Contra a parede, no entanto, a resposta foi: “vocês querem fazer negócio: o preço é este”. Quanto à cotação do cacau, o aumento do dólar, o barulho nas bolsas, provam que Jair Bolsonaro não fez o esperado, apoiar Tarcísio de Freitas, candidato a Milei brasileiro.
Assim como não quer Lula, a burguesia também não quer Bolsonaro no poder. A jogada inesperada dos Bolsonaros bagunçou o jogo do imperialismo.
No segundo parágrafo, Marques escreve que “embora a sinapse não seja exatamente o ponto forte do cariótipo familiar, o movimento do clã está corretíssimo sob a ótica deles. Lançar – e manter – a candidatura de Flávio é a forma mais eficiente de seguir no jogo de 2026 em posição menos vulnerável do que estariam caso apoiassem outro nome da direita. A jogada, vista do planalto emocional do bolsonarismo, preserva o rebanho ‘intra-cercas’, impede dispersão precoce e mantém a marca Bolsonaro viva e competitiva para 2030”.
Oliveiros Marques deveria se perguntar: por que Bolsonaro negociaria o capital político que quase o fez vencer as últimas eleições presidenciais? Talvez a esquerda esteja acostumada com as manobras do PT, que conseguiu destruir sua base no Rio de Janeiro, bem como apoiar Guilherme Boulos, candidato de outro partido, à prefeitura da cidade mais importante do País.
Apoiar outro candidato pode estragar tudo. Não adianta chamar o eleitorado bolsonarista de rebanho, e dizer que os Bolsonaros são burros. Manter a “marca viva e competitiva” parece ser bem melhor do que rifar, ou abandonar, a própria base. Apoiando Tarcísio, Bolsonaro ficaria refém de sua política.
Adiante, no terceiro parágrafo, tem-se que “há um dado irrefutável: o eleitorado disposto a seguir qualquer coisa que venha acompanhada do sobrenome Bolsonaro não baixa de dois dígitos. Por que, então, arriscar transferir prestígio a um adversário potencial de 2030 numa eleição em que Lula aparece como adversário difícil de ser batido? Do ponto de vista deles, apostar em outro nome da direita é alimentar um rival em formação – e, pior, entregar-lhe musculatura para enfrentá-los quando o ambiente estiver mais favorável e os desgastes do golpismo, das ‘rachadinhas’ e de outros crimes já tiverem decantado”.
No final do parágrafo acima se nota a mania da esquerda pequeno-burguesa, tratar política como crime. Sendo que ninguém liga para isso. O Brasil já teve político cujo lema era “rouba, mas faz”. A grande imprensa é a primeira a trazer à tona, ou abafar, crimes, tudo é uma questão de interesses. Aliás, nem é preciso cometer crime para ser preso no Brasil, ainda mais quando se tem um Supremo Tribunal Federal que é um verdadeiro partido político.
Oliveiros Marques diz que “o quebra-cabeça que se apresenta à direita e extrema-direita, portanto, se converte em um enorme abacaxi para o Centrão descascar. A aritmética não fecha com naturalidade. Apoiar Flávio Bolsonaro agora significa aceitar que qualquer plano de ter um ‘puro-sangue’ do próprio campo comandando a direita ficará adiado por longos anos. Não o apoiar, lançando outro nome na corrida, significa facilitar ainda mais a vida de Lula rumo à reeleição”. Se o articulista pensa assim, o título de seu artigo deixa de fazer sentido. Não se trata simplesmente de ter um preço.
No penúltimo parágrafo, Marques parece que foi pego trapaceado no jogo, diz que “o quebra-cabeça que se apresenta à direita e extrema-direita, portanto, se converte em um enorme abacaxi para o Centrão descascar. A aritmética não fecha com naturalidade. Apoiar Flávio Bolsonaro agora significa aceitar que qualquer plano de ter um ‘puro-sangue’ do próprio campo comandando a direita ficará adiado por longos anos. Não o apoiar, lançando outro nome na corrida, significa facilitar ainda mais a vida de Lula rumo à reeleição”.
Ainda é cedo para dizer que Lula terá vida fácil nas próximas eleições, mas a verdade é que Bolsonaro jogou o problema para o outro lado, que não pensa em engolir um novo mandato petista.
Diante daqueles sujeitos que supostamente fazem poucas sinapses, Marques diz que “a pergunta inevitável é: mas a reeleição de Lula já não estaria praticamente encaminhada? Talvez seja justamente essa a conta que estrategistas do Centrão deveriam fazer. Se 2026 parece uma partida praticamente jogada, por que não antecipar 2030? Nesse raciocínio, lançar uma candidatura com fôlego para crescer, mesmo que não vença agora, pode ser o movimento mais inteligente”.
Marques está falando em 2030, mas Flávio Bolsonaro pode ir para o segundo turno já nas próximas eleições. E o articulista deveria se perguntar: quem o grande capital vai apoiar?
Desistindo de raciocinar, Oliveiros Marques diz que “ao fim e ao cabo, mover as peças nesse tabuleiro é problema da direita e da extrema-direita”. Errado, é problema da esquerda também, pois a política seguida até agora tende ao desastre.
O apoio às instituições golpistas, como o STF e a PF; a política econômica desastrosa de juros altos que freiam a economia e penalizam o trabalhador; a insistência em aumentar punições e apoiar a censura, tudo isso só pode favorecer um possível Flávio Bolsonaro, que provavelmente contaria com a anuência do grande capital.