A mais recente rodada da pesquisa Quaest sobre as eleições de 2026 confirmou aquilo que venho sustentando nesta coluna desde 2023 — e que os levantamentos sucessivos, deste e de outros institutos, vêm reiterando ao longo dos últimos anos: a disputa presidencial caminha, novamente, para uma polarização entre Lula e Bolsonaro.
A principal novidade do levantamento divulgado em 16 de dezembro, com entrevistas realizadas entre os dias 11 e 14, foi a inclusão de Flávio Bolsonaro como candidato testado à Presidência. Até então, os cenários simulavam embates entre Lula e Jair Bolsonaro, ou com Eduardo Bolsonaro, ou ainda com Michelle Bolsonaro. Desta vez, Flávio foi o único representante da família a figurar no questionário, ao lado de governadores frequentemente ventilados como opções — Tarcísio de Freitas (Republicanos), Ratinho Jr. (PSD), Ronaldo Caiado (União) e Romeu Zema (Novo).
O consórcio formado entre setores da direta, do mercado financeiro, do agronegócio e da mídia empresarial esperava que a Quaest revelaria Flávio como um candidato pouco competitivo, abrindo espaço para Tarcísio, o nome preferido dessa coalizão. Esse grupo acredita em uma operação mágica na qual o governador de São Paulo pode ganhar os votos do Bolsonaro sem carregar sua rejeição, o que faria dele o competidor mais viável contra Lula. Crê também, a despeito de todas as pesquisas anteriores, que um nome da família Bolsonaro não pontuaria bem entre os eleitores de direita.
Os números da Quaest, no entanto, jogaram água fria nesse plano. Já nas intenções espontâneas de voto (quando o eleitor responde sem receber uma lista de candidatos) Lula aparece com 20%, enquanto Jair Bolsonaro marca 5% e Flávio Bolsonaro os mesmos 5%. O núcleo mais fiel da extrema-direita já começa a reconhecer Flávio como herdeiro político do pai. Tarcísio, assim como os demais governadores, simplesmente não pontua.
Nos cenários estimulados, a dinâmica se repete. Lula lidera em todas as simulações, com Flávio Bolsonaro ocupando o segundo lugar em todos os casos. No cenário que inclui Tarcísio de Freitas, Lula alcança seu melhor desempenho, com 41%, contra 23% de Flávio e apenas 10% do governador paulista. Nos demais cenários, Lula varia entre 39% e 34%, enquanto Flávio oscila de 27% a 21%. Já os governadores patinam: chegam a um máximo de 13% e, em alguns casos, não passam de 4%.
Outros indicadores reforçam a tendência de polarização. Do lado da extrema-direita, Flávio Bolsonaro ainda é pouco conhecido, com 39% dos entrevistados afirmando não saber que ele foi escolhido pelo pai como candidato à Presidência. Longe de ser um obstáculo, esse dado indica margem de crescimento junto ao eleitorado conservador. Além disso, 19% afirmam que Michelle Bolsonaro deveria ser a candidata, contra 16% que preferem Tarcísio. É razoável supor que parte significativa desse eleitorado migre para Flávio, caso Michelle venha a se engajar na pré-campanha, o que ainda não ocorreu.
No campo da esquerda, os sinais também são positivos. A diferença entre desaprovação e aprovação do governo caiu de três para um ponto percentual entre novembro e dezembro. Programas estratégicos, que devem formar o eixo da campanha de Lula, mantêm índices de aprovação elevados: 90% para o Minha Casa Minha Vida e 87% para a Farmácia Popular. Outras iniciativas, como a isenção da conta de luz para famílias de baixa renda, o Gás do Povo, o Pé-de-Meia e a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais, têm aprovação entre 75% e 60%. Em todos esses casos, porém, o desconhecimento ainda é alto, variando de 24% a 15%, o que aponta para amplo espaço de expansão do apoio popular.
Lula e Flávio Bolsonaro exibem rejeições elevadas — dado que alimenta, mais uma vez, os sonhos da chamada “terceira via”. É sonho de verão. Em disputas polarizadas, candidatos com baixa rejeição tendem também a ter baixíssima intenção de voto. A rejeição, nesse tipo de eleição, é um subproduto da força política: só se rejeita aquilo que se percebe como ameaça real.
Essa dinâmica, conhecida como “eleição de rejeição”, já se manifestou em 2018 e 2022. Ciro Gomes era menos rejeitado do que Fernando Haddad, em 2018, e do que Lula, em 2022, porque o eleitorado de direita não o via como risco concreto, concentrando sua oposição no PT. O mesmo fenômeno se repete agora com os governadores da direita tradicional. O eleitorado de esquerda sabe que, sem o apoio explícito de Bolsonaro, cenário hoje mais provável, esses nomes não decolam. Assim, tanto a rejeição quanto as intenções de voto se concentram em duas pontas. E a polarização se impõe mais uma vez.
Eleições presidenciais polarizadas também favorecem a eleição de deputados e senadores dos partidos que lideram cada campo. Essa é mais uma razão pela qual Flávio Bolsonaro e o PL não têm incentivo algum para abrir mão da cabeça de chapa na disputa contra Lula e o PT.