O longa Dark Horse, cinebiografia sobre Jair Bolsonaro dirigida por Cyrus Nowrasteh e estrelada por Jim Caviezel, foi gravado em São Paulo entre outubro e novembro de 2025. A produção é conduzida pela Go Up Entertainment, empresa de Karina Ferreira da Gama. Ao mesmo tempo, Karina lidera o Instituto Conhecer Brasil (ICB), que recebeu R$ 108 milhões da Prefeitura para instalar pontos de Wi-Fi em áreas vulneráveis.
Esse cruzamento de papéis — produtora de cinema e gestora de contrato público milionário — levantou suspeitas. Reportagem de Laís Martins e Tatiana Dias do Intercept Brasil mostra que o ICB foi a única entidade a participar da licitação e que o valor por ponto de acesso, cerca de R$ 1.800, ficou muito acima dos R$ 230 praticados em contratos anteriores da Prodam.
Mais de um ano depois, apenas 3.200 pontos estão ativos. A maioria foi instalada em período pré-eleitoral de 2024. Mesmo assim, já foram pagos R$ 69 milhões, incluindo antecipações e prorrogações de prazo. O Tribunal de Contas do Município apontou ao menos 20 falhas no processo, como insuficiência técnica do ICB e indícios de preços inflados. Apesar dos alertas, a gestão Ricardo Nunes manteve os repasses.
Quase todo o dinheiro foi repassado a empresas terceirizadas: Make One (R$ 36 mi), UltraIP (R$ 30 mi), Favela Conectada (R$ 12 mi), Complexys (R$ 8,6 mi) e Fast Future (R$ 3 mi). A Favela Conectada, em especial, ganhou um destaque sombrio e negativo. O portal Metrópoles apurou que a empresa pertence a Alex Leandro Bispo dos Santos, preso em flagrante em novembro de 2025 pela morte de sua esposa, caso tratado como feminicídio pela polícia.
Emendas de parlamentares bolsonaristas
Além do contrato de Wi-Fi, Karina também lidera a Academia Nacional de Cultura, que recebeu cerca de R$ 2,6 milhões entre emendas parlamentares e contratos de campanha de aliados de Bolsonaro. Entre eles, Mário Frias, Alexandre Ramagem, Carla Zambelli, Bia Kicis, Marcos Pollon e Gil Diniz.
Não há provas de que o dinheiro público tenha financiado diretamente o filme Dark Horse. Mas a sobreposição de contratos, repasses e vínculos políticos gera dúvidas sobre apoio indireto à produção.
A Prefeitura nega qualquer relação entre o programa de Wi-Fi e o filme. Em nota, afirma que o ICB cumpriu critérios técnicos e que o projeto é transparente, com 3.200 pontos ativos e previsão de mais 1.800 em 2026.