O procurador do Tribunal Penal Internacional Karim Khan anunciou, nesta quinta-feira 23, que solicitará ordens de prisão contra altos líderes do Taleban no Afeganistão por perseguição de mulheres, um crime contra a humanidade.
“Existem motivos razoáveis para acreditar que o líder supremo do Taleban, Hibatullah Akhundzada, e o presidente do Supremo Tribunal do ‘Emirado Islâmico do Afeganistão’, Abdul Hakim Haqani, têm responsabilidade penal pelo crime contra a humanidade de perseguição por gênero”, disse Karim Khan em um comunicado.
De acordo com o procurador, “mulheres e meninas afegãs, assim como membros da comunidade LGBTQI+, enfrentam uma perseguição inaceitável, sem precedentes e contínua por parte dos talebans”.
“Nossa ação envia uma mensagem de que o status quo não é aceitável para mulheres e meninas no Afeganistão”, enfatizou.
Os juízes do TPI, com sede em Haia, agora examinarão o pedido do procurador para decidir se devem ou não emitir as ordens de prisão. O processo levará semanas ou meses.
O TPI, responsável por crimes de guerra e contra a humanidade, não possui força policial própria, por isso depende da boa vontade de seus 125 países-membros para executar os mandados de prisão.
Khan advertiu que pedirá mandados de prisão contra outros oficiais do Taleban e enfatizou que outros crimes contra a humanidade também estavam sendo cometidos no Afeganistão.
Um islã ultrarrigoroso
Depois de retomar o poder no Afeganistão em agosto de 2021, o Taleban prometeu inicialmente ser mais tolerante com as mulheres do que durante seu primeiro mandato no comando do país, entre 1996 e 2001.
No entanto, os islamistas impuseram gradualmente uma série de restrições às mulheres, a ponto de a ONU denunciar a existência de um verdadeiro “apartheid de gênero”.
Atualmente, as mulheres afegãs não podem ter acesso à universidade ou ao ensino médio, não podem frequentar parques, academias ou salões de beleza.
Uma lei as proíbe de cantar e recitar poesias, com base, como as outras diretrizes, em uma visão ultrarrigorosa da lei islâmica. Elas também são forçadas a cobrir o corpo quando saem de casa.
Algumas estações de rádio e televisão locais pararam inclusive de transmitir vozes femininas.
O procurador do TPI declarou enfaticamente que “a interpretação da lei sharia pelos talebans não pode ser usada para justificar a privação de direitos humanos fundamentais”.
O governo taleban afirma que a lei islâmica “garante” os direitos das mulheres e que tais críticas são infundadas.
Shukria Barakzai, ex-deputada afegã e ex-embaixadora da Noruega, comemorou a decisão do procurador do TPI. “É uma vitória” para “o feminismo em geral e as mulheres no Afeganistão em particular”, afirmou à AFP.
O relator especial da ONU Richard Bennett elogiou um “passo crucial para que sejam responsabilizados”.
Segundo a Human Rights Watch, a iniciativa poderia dar um novo destino às mulheres afegãs no centro da agenda internacional.
“É um momento importante para as mulheres e crianças afegãs que esperaram a justiça por muito tempo”, declarou Heather Barr, vice-diretora de direitos das mulheres da ONG.
O emir Akhundzada é responsável por algumas das restrições draconianas impostas às mulheres no país. Ele vive praticamente isolado em seu feudo em Kandahar, uma fortaleza do Taleban no sul do Afeganistão, e raramente aparece em público.