
Em meio à expansão do agronegócio e à crescente pressão sobre áreas de preservação, a Reserva Ecológica Porto das Antas, em Jataí (GO), tornou-se símbolo de resistência ambiental. Criada há 25 anos por um grupo de amigos liderado pelo professor de História Marco Antônio Gomes de Carvalho, o Marquinho, a área hoje abriga 171 hectares, dos quais 144 foram recentemente transformados em Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN), reconhecimento federal que garante sua preservação perpétua.
A história da reserva começa muito antes, nas memórias de infância de Marquinho, que viveu parte da infância em uma fazenda cortada pelo Rio Claro, no interior de Goiás, época em que o contato com a natureza ficou marcado. “Eu me apaixonei pela natureza, e embora a gente tivesse uma vida muito simples lá, mas o contato com a natureza, com a água, o rio que passa no fundo da fazenda, chama-se Rio Claro, que passa aqui dentro de Jatai agora, Jatai já incorporou o rio. Antigamente ele ficava a uns 5 quilômetros dele, agora a cidade já chegou. Esse rio passa no fundo da fazenda, que é o maior rio da região, e um ribeirão de água transparente cortava a porta da fazenda, né, leste-oeste, já não sei dizer também. Então é isso, e eu fiquei com essa coisa na cabeça.”
Nos anos 1990, já formado em História e professor no Instituto Federal de Jataí, ele conheceu uma área que reunia as características que sempre sonhou preservar. “Há 25 anos atrás, um paranaense rico, eu jogava bola num campo de futebol dele particular, e ele me falou que estava olhando umas terras que descobriu essa terra lá, que tinha o perfil do que eu queria.”
Sem recursos próprios para comprá-la, mobilizou amigos e ex-colegas de faculdade, formando um grupo que arrecadou o valor necessário. Em 2000, fecharam o negócio e fundaram a Sociedade Ecológica Porto das Antas.
O objetivo inicial era proteger a área contra as ameaças do desmatamento e da especulação imobiliária, que já avançavam sobre a região, pois, se não tivessem comprado a área, hoje ela seria pasto ou estaria tomada por ranchos de luxo na beira do rio, como aconteceu em propriedades vizinhas.
Desde 2017, a reserva é credenciada junto ao Ibama como área de soltura de animais silvestres, recebendo espécies resgatadas, como lobos-guará, onças e, no futuro, antas — animal que dá nome à reserva. O novo projeto do professor prevê a criação de um centro para reabilitação e reintrodução de antas na natureza, com acompanhamento e treinamento para que aprendam a se alimentar e sobreviver sozinhas.
“O nosso turismo será muito específico, será um turismo de observação de pássaros, mas basicamente parcerias com instituições de ensino, Universidade Federal de Jataí, que aqui tem a Universidade Federal, que eu sou professor de História, e daí instituições privadas também que queiram elaborar um plano de pesquisa aprovado pelo nosso Conselho da Sociedade Ecológica Porto das Antas”, explica o professor.
O reconhecimento como RPPN, publicado em decreto federal no fim de 2024, foi uma estratégia para garantir a proteção da área mesmo no futuro. “Então, o Porto das Antas sou eu. Eu morrendo, o Porto das Antas corre risco. Então, o que eu fiz? u que agilizei esse processo da RPPN, porque se eu morrer e se venderem a área, quem comprar não pode desmatar. Eu estou entregando os anéis para salvar os dedos”, explica.






















Apesar do simbolismo, manter a reserva é um desafio constante. Marquinho vive em Jataí e visita o local a cada 15 dias. Sem caseiros fixos e com histórico de furtos, a estrutura ainda é precária. Ele busca recursos públicos e privados para instalar energia solar, câmeras de monitoramento e infraestrutura para pesquisa e educação ambiental.
Mesmo diante das dificuldades, o professor não perde o espírito de luta para lidar com o risco de incêndio – natural ou criminoso-, as ameaças de caçadores e a especulação imobiliária para o turismo de luxo na região. “O fascismo vindo a galope. Um congresso que fez o que fez ontem. Então, eles podem mudar uma lei amanhã e acabar com as FPPNs, entendeu? É isso. Depois da perda e devastação, não tem o que dizer, sabe? Então, é isso, vamos lutando.”
O futuro do Porto das Antas ainda é incerto, mas a história de sua criação revela a força de iniciativas coletivas que, mesmo pequenas frente ao latifúndio e à degradação ambiental, se tornam faróis de resistência — segurando, como diz Marquinho, “a primavera entre os dentes, mesmo em meio à tempestade”.

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