Nesse domingo (8), o presidente sírio Bashar al-Assad abandonou o cargo e deixou o país, em meio àquele que se tornou o mais recente golpe de Estado no mundo. A deposição de Assad ocorreu poucos dias depois de um levante armado organizado pela chamada Frente Al-Nusra, grupo anteriormente filiado à Al-Qaeda. O grupo derrubou o governo sírio, invadiu as embaixadas do Irã e da Rússia e está apresentado como aquele que provavelmente irá governar o país. Horas depois, “Israel” aproveitou a crise para atacar a Síria, ocupando parte do território ao sul.

A queda do governo Assad é, sem dúvidas, uma derrota dos povos e governos que lutam contra o imperialismo. O regime sírio, independentemente de seu caráter moderado, se colocava abertamente a favor da Rússia, do Irã e da Palestina. Sua derrocada, portanto, é uma vitória para o sionismo e para o imperialismo.

Da mesma forma, não restam dúvidas de que a operação que levou à derrubada do governo foi uma operação imperialista. A Frente Al-Nusra foi treinada pelo imperialismo, armada pelo imperialismo e patrocinada pelo imperialismo.

O imperialismo atingiu a resistência internacional no seu calcanhar de Aquiles, no ponto mais fraco do Eixo da Resistência, formado pela República Islâmica do Irã e partidos revolucionários, como o Hesbolá, o Hamas e o Ansar Alá, e um dos pontos mais fracos de todo o bloco de países que lutam contra o imperialismo, como é o caso da Rússia, da China e da Coreia do Norte.

Uma combinação de fatores permitiu que o imperialismo derrubasse o regime sírio. A Rússia está envolvida em uma guerra com a Ucrânia que, embora neste momento esteja sob controle, pode rapidamente escalar para um conflito nuclear com países imperialistas. O Hesbolá, por sua vez, ainda que tenha derrotado “Israel” na tentativa de invasão do Líbano, sofreu perdas significativas com a guerra. O Irã e a China, ainda que não estejam diretamente em guerra, estão sob uma forte pressão do imperialismo. Já a Turquia, que é um país com uma presença importante no Oriente Próximo e que sempre teve uma posição ambígua entre o bloco imperialista e o bloco liderado por Rússia, Irã e China, favoreceu a ação da Frente Al-Nusra. O governo de Recep Erdogan, ainda que não tenha sido decisivo para a queda de Assad, aproveitou a debilidade do regime para conseguir aumentar a sua influência sobre a Síria, uma vez que a Turquia possui uma preocupação com a atuação dos curdos.

Por fim, é preciso ainda considerar como um fator importante a traição dos generais ao governo de Assad. Não houve resistência militar à tomada de Damasco, o que mostra que parte das forças armadas sírias já havia sido cooptada pelo imperialismo.

Ainda que todos esses fatores tenham favorecido o golpe, há um elemento fundamental que criou as condições para a queda do regime. A Síria estava sob bloqueio econômico do imperialismo desde o ano de 2011, o que, somada à guerra civil, destruiu o país. Um ataque econômico dessa envergadura, levado por anos a fio, enfraquece qualquer governo perante as massas, caso o governo não tome medidas à altura para reagir às sanções.

O bloqueio econômico é uma arma de guerra, dirigida não especificamente contra o governo, mas contra a população. Ele visa fazer a população sofrer para que assim ela se revolte contra o próprio governo. Essa é uma política tradicional do imperialismo. Na Segunda Guerra Mundial, por exemplo, o imperialismo foi além e bombardeou a população civil da Itália e da Alemanha para tentar fazer o povo se levantar contra o regime. É uma política criminosa.

O mundo hoje assiste ao resultado do cerco econômico monstruoso de “Israel” à população da Faixa de Gaza. Os palestinos são impedidos de receber alimentos e remédios básicos desde 2006. Também não há quem não tenha ouvido falar do bloqueio econômico criminoso imposto a Cuba por mais de seis décadas, que impede que o país se desenvolva em qualquer área.

De acordo com a plataforma alemã Statisa, a Síria era, em 2022, o terceiro país mais sancionado do planeta. Naquele ano, 90% da população síria vivia abaixo da linha da pobreza.

Em 2021, um grande terremoto acometeu a Síria e a Turquia, deixando dezenas de milhares de mortos. O país ainda passou por um inverno rigoroso em meio a chuvas, inundações, temperaturas rígidas e um surto de cólera em andamento. Somente no noroeste, 1,8 milhão de pessoas vivem em acampamentos e locais superlotados em tendas com temperaturas abaixo de 0 °C, com acesso limitado ou sem acesso a água, serviços de saúde e eletricidade.

Neste sentido, os esforços humanitários, até janeiro de 2023, contavam com apenas 78% do caixa necessário para o pleno funcionamento no noroeste da Síria — área mais afetada pelos tremores — e com um nível de financiamento igualmente baixo de 29% para todo o país. Apenas 1,4 milhão de pessoas foram alcançadas até o final de dezembro de 2022 através dos recursos disponíveis, deixando 2,8 milhões de sírios vulneráveis, sem abrigo de emergência adequado ou itens não-alimentícios para se protegerem frente às duras condições do inverno.

Tanto os EUA quanto a União Europeia impuseram sanções ao país, incluindo uma combinação de congelamento de ativos e proibição de entrada nesses países para indivíduos e entidades sírias envolvidas em violações de direitos humanos contra civis. As sanções mais gerais ou setoriais proíbem certas atividades, como a compra, venda ou exportação de bens e materiais relacionados a setores específicos que possam ser usados contra civis. Isso inclui tecnologia, petróleo e gás, e materiais utilizados em projetos de infraestrutura, como redes de fornecimento de eletricidade.

Outras sanções são financeiras, afetando tanto indivíduos quanto setores. As medidas incluem restrições à venda de títulos ou à abertura de novas contas bancárias para instituições financeiras sírias e indivíduos sírios fora da Síria, bem como restrições a transações financeiras com sírios designados.

As sanções primárias dos EUA ao governo sírio são as mais severas, proibindo quase todos os laços comerciais e financeiros entre os EUA e a Síria. Isso inclui a proibição de exportação ou reexportação de bens, software, tecnologia e serviços dos EUA para a Síria, com algumas exceções para certas categorias de ajuda humanitária, como alimentos e medicamentos, além da proibição de bancos e empresas estrangeiros utilizarem o sistema financeiro dos EUA para processar transações relacionadas à Síria. Em 2019, foram introduzidas sanções secundárias sob a Lei de Proteção Civil César para a Síria, destinadas a banir certas categorias de comércio com terceiros países.

Essa lei permite sancionar empresas de outros países que realizem determinadas transações com o governo sírio, entidades de propriedade ou controladas pelo governo sírio, e outras empresas, indivíduos ou entidades sírias sancionadas. Isso inclui empresas que apoiem a produção de petróleo e gás do governo sírio, bem como serviços de construção e engenharia, efetivamente interrompendo esforços para reconstruir a Síria.

Um trabalhador de uma organização humanitária, cuja entidade analisou o impacto das sanções na educação na Síria, afirmou que, devido às restrições na importação de equipamentos de TI, software dos EUA e ao uso da Syriatel, crianças na Síria não conseguiam acessar serviços educacionais remotamente.

A Organização das Nações Unidas (ONU) não impôs sanções ao governo sírio, mas o Conselho de Segurança da ONU estabeleceu medidas de contraterrorismo contra grupos armados e indivíduos afiliados designados como atores terroristas operando no país. Os Estados-membros da ONU são obrigados a cumprir essas medidas.

O Programa Mundial de Alimentos estima que 12,1 milhões de pessoas na Síria sofrem de insegurança alimentar.

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Last Update: 10/12/2024