*João Daniel
O Brasil vive um momento crítico diante da escalada da violência contra mulheres e suas famílias. Casos recentes de feminicídio expõem uma chaga social que não pode ser naturalizada. Há uma misoginia estrutural que leva muitos homens a se sentirem donos das mulheres com quem se relacionam ou se relacionaram. Essa visão de posse é absurda e alimenta agressões, abusos e mortes. Nenhuma mulher é propriedade; todas são sujeitos de direitos e merecem respeito e liberdade.
Exemplos recentes, como o de Recife — em que um homem trancou a família em casa e ateou fogo, matando a esposa e quatro filhos pequenos —, ou casos em que mulheres foram brutalmente atacadas com armas de fogo e um outro caso terrível em São Paulo, em que um ex-namorado atropelou uma jovem e arrastou-a por cerca de 1 Km, apesar de ser advertido, provocando a amputação de suas pernas e problemas físicos gravíssimos, mostram uma violência fora de qualquer limite, e repugnantes. Tudo isso em menos de uma semana.
Em novembro de 2025, a Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher, realizada pelo Instituto DataSenado, entrevistou 21.641 brasileiras e revelou que 88% já sofreram violência psicológica, tornando esse tipo de agressão o mais comum no país. Ainda em 2025, 21,4 milhões de mulheres (37,4% do total) relataram algum tipo de violência nos últimos 12 meses. A maioria das agressões ocorre na presença de terceiros, inclusive crianças.
Os casos de feminicídio vêm crescendo desde a tipificação do crime em 2015. Em 2023, foram registrados 1.438 feminicídios; em 2024, o recorde histórico, com quase 1500 casos (média de quatro mortes por dia). Em 2025, até novembro, já havia mais de 1.000 registros, com destaque para São Paulo, que contabilizou 207 feminicídios entre janeiro e outubro.
A Lei Maria da Penha, criada em 2006, é considerada uma das legislações mais avançadas do mundo no combate à violência contra a mulher. Ela estabeleceu mecanismos de proteção, como medidas protetivas urgentes, afastamento do agressor e maior rigor nas penas. A ONU reconhece sua relevância, pois deu visibilidade ao tema e encorajou muitas mulheres a denunciarem casos antes invisíveis. No entanto, sozinha, a lei não tem conseguido eliminar o problema. Persistem falhas na aplicação, falta de estrutura nos serviços de apoio e desconhecimento da lei por parte da população.
Nos últimos 12 meses, 3,7 milhões de brasileiras sofreram violência doméstica; 58% enfrentam agressões recorrentes, mas apenas 28% procuram Delegacias da Mulher. Além disso, 67% conhecem pouco a lei, e entre mulheres mais velhas a confiança em sua eficácia é menor. Delegacias especializadas, casas de abrigo e equipes multidisciplinares ainda são insuficientes em muitas regiões do país. A aplicação da lei precisa ser acompanhada de políticas públicas robustas e de uma mudança cultural profunda para reduzir os índices de violência.
O presidente Lula, ao comentar os casos em Recife, destacou que “só depende de nós” fazer campanhas contra a violência doméstica, criar formas de acolhimento para as vítimas, endurecer leis contra agressores e investir em educação, em casa e nas escolas, para mudar a mentalidade dos homens desde cedo. Apesar da queda em outros tipos de homicídios, os feminicídios seguem aumentando.
A violência se concentra nas classes menos favorecidas, mas não se limita a elas. Atacar a base da estrutura social — educação, trabalho e oportunidades — é um caminho necessário. Contudo, as ações precisam atingir todas as classes sociais, acompanhadas de uma mudança de comportamento dos homens, orientada pelo reconhecimento da equidade de gênero e do respeito à dignidade das mulheres.
Assessoria do Deputado João Daniel