A Polônia afirmou nesta quarta-feira (10) ter abatido drones que violaram seu espaço aéreo durante um ataque aéreo massivo da Rússia contra a Ucrânia, no primeiro episódio em que um membro da Otan dispara diretamente no contexto da guerra. 

O primeiro-ministro Donald Tusk classificou a ação como “provocação em larga escala” e invocou o artigo 4º do tratado da aliança, mecanismo que prevê consultas entre aliados diante de ameaças à segurança. 

O gesto polonês, celebrado por líderes europeus como demonstração de firmeza, acentuou os temores de que a guerra se expanda para além das fronteiras ucranianas.

Ao discursar no Parlamento, Tusk declarou que foi “o mais próximo que estivemos de um conflito aberto desde a Segunda Guerra Mundial”. 

Disse, contudo, não acreditar que o país esteja “à beira da guerra”, embora tenha advertido que “a situação é séria, e ninguém duvida de que devemos nos preparar para vários cenários”. 

As Forças Armadas da Polônia informaram que detectaram 19 incursões aéreas em sete horas e abateram ao menos três drones. O chefe do Estado-Maior, general Wieslaw Kukula, chamou o episódio de “ato de agressão que representou ameaça real à segurança dos nossos cidadãos”.

A resposta envolveu caças F-16 poloneses, F-35 holandeses, aviões de espionagem italianos e um avião-tanque também da Holanda. 

Radares Patriot da Alemanha auxiliaram a identificar os alvos, segundo comunicado militar. Durante a madrugada, o espaço aéreo foi fechado em quatro aeroportos, incluindo os dois da capital, Varsóvia. 

O Aeroporto Chopin retomou voos pela manhã, mas alertou que atrasos persistiriam ao longo do dia. Populares receberam mensagens de emergência nos celulares orientando a reportar destroços de drones e a não se aproximar.

Os restos de aeronaves abatidas foram encontrados em sete regiões, além de fragmentos de um míssil não identificado, que militares sugeriram poder ser de defesa aérea ucraniana. 

Em Lublin, moradores relataram ter sido acordados pelo barulho de caças durante a madrugada. Para Tusk, “o fato de esses drones terem sido derrubados muda a situação política” e exige que o país se prepare para “vários cenários”.

Moscou nega ataque e fala em diálogo

A Rússia rejeitou as acusações polonesas e negou qualquer responsabilidade sobre drones no espaço aéreo da Otan. O ministério da Defesa, Andrey Belousov, afirmou que os alvos da operação eram “instalações industriais no oeste da Ucrânia” e que “os drones não têm alcance para penetrar tão fundo em território polonês”. 

Disse ainda estar à disposição para conversar com os vizinhos sobre o episódio. O encarregado de negócios russos em Varsóvia, Andrei Ordach, convocado pelo governo local, declarou que “os drones vieram da Ucrânia”, ecoando a versão oficial de Moscou.

O discurso foi reforçado por Belarus, que alegou ter alertado a Polônia sobre drones fora de rota devido a interferências de guerra eletrônica. 

O chefe do Estado-Maior bielorrusso, general Pavel Muraveiko, disse que parte das aeronaves foi interceptada por defesas do país e que “as comunicações com a Polônia fazem parte de um protocolo regular de ameaças aéreas”. 

Ao se colocarem como atores dispostos ao diálogo, Moscou e Minsk tentaram conter o ímpeto belicista que marcou a retórica europeia.

O coro europeu e a sombra da Terceira Guerra

A União Europeia e os principais líderes da Otan reagiram em tom de gravidade. A chefe da diplomacia do bloco, Kaja Kallas, considerou o episódio “a mais séria violação do espaço aéreo europeu pela Rússia desde 2022” e afirmou que “indícios sugerem que foi intencional, não acidental”. 

A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, pediu mais sanções contra Moscou e anunciou que o bloco prepara medidas contra petroleiros da chamada “frota sombra” e países que compram petróleo russo. 

O presidente francês Emmanuel Macron disse que a incursão foi “simplesmente inaceitável”, enquanto o britânico Keir Starmer e líderes da Finlândia e da Holanda repetiram a condenação.

Aliado próximo de Moscou, Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria, declarou que “violação de soberania é inaceitável”. O premiê eslovaco, Robert Fico, destoou parcialmente ao pedir cautela: “É preciso estabelecer se foi intencional ou acidental, e quem controlava os drones”. 

O temor explícito é de que o incidente leve a uma escalada indesejada que poderia resultar em choque direto entre a Rússia e a Otan. Parlamentares americanos chegaram a falar em “Terceira Guerra Mundial” na noite desta terça-feira (9). 

Analistas ouvidos pela imprensa europeia sugeriram que o número elevado de drones desviados pode ter sido uma ação para testar a reação dos aliados.

Cenário de militarização acelerada

O incidente ocorre às vésperas do exercício militar Zapad, realizado pela Rússia em conjunto com Belarus, tradicionalmente visto como demonstração de força contra o Ocidente. 

Previsto para começar nesta sexta-feira (12), o exercício deve envolver entre 6.000 e 13 mil soldados, incluindo simulação de ataques nucleares táticos, segundo autoridades bielorrussas. A Polônia já havia fechado fronteiras preventivamente e é o país da Otan que mais investe em defesa em proporção ao PIB: 4,12% em 2024, com meta de chegar a 5% em dez anos.

Tusk declarou que a consulta pelo artigo 4º “muda a situação política” e que o país se prepara para “vários cenários”. 

A fala ecoa a opção polonesa por acelerar a militarização, com planos de dobrar o efetivo das Forças Armadas para meio milhão de soldados. Em maio, o premiê chegou a aventar a aquisição de armas nucleares, sinalizando que Varsóvia busca se firmar como linha de frente da Otan no leste europeu.

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Last Update: 10/09/2025