Wagner Gomes 

A diplomacia brasileira sempre gostou de vestir o manto do equilíbrio, mesmo quando era puxada pelos fios invisíveis de Washington, Pequim ou das ambições internas de quem assinava os telegramas. O Itamaraty, instituição de brilho protocolar e verniz aristocrático, uma pálida sombra do que já foi, aprendeu a operar como um piano de cauda em meio à pancadaria da geopolítica mundial: fala manso, mas pisa firme — ou finge. Nos últimos anos, no entanto, a política externa do Brasil transformou-se num espelho trincado da própria instabilidade doméstica. Sem projeto, sem doutrina, sem pragmatismo — apenas recalques ideológicos embalados em papel reciclado da Guerra Fria. Em vez de soberania, ruído. Em vez de estratégia, performance para palanques internos. O mundo, esse ente vasto e cínico, não perdoa vacilo — e o Brasil vacilou com entusiasmo. Com Donald Trump, o país ensaiou um servilismo atroz — um “alinhamento automático” que agradava colunistas de WhatsApp e deixava diplomatas constrangidos. Com Joe Biden (foto/reprodução internet), tropeçou na ressaca ideológica, tentando flertar com progressistas americanos enquanto empurrava conflitos internos com a barriga. A China — maior parceira comercial — foi ora demonizada, ora bajulada. O resultado? Nenhuma confiança plena em lugar algum. Enquanto isso, o mundo se reorganiza. EUA e China trocam sanções como quem joga xadrez com martelos. A Europa ensaia autonomia, mas ainda fala com sotaque americano. A Rússia reescreve mapas com tanques. E o Oriente Médio, velho laboratório de impérios, volta ao noticiário como lembrete de que petróleo ainda sangra. O Brasil assiste — e hesita. Fala em multipolaridade, mas age com bipolaridade. Senta à mesa dos fóruns globais sem saber se quer servir ou ser servido (ou querendo uma coisa e obtendo outra). A retórica da paz convive com a omissão calculada. De mediador para a irrelevância, foi um pulo. A política externa, que deveria ser bússola, virou espelho: reflete nossas inseguranças, nossas contradições e nosso eterno medo de escolher um lado — porque escolher implica perder privilégios que, num país de contrassenso, já não temos. 

*Wagner Gomes

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 27/04/2025