Uma poetisa mineira é a vencedora da edição 2024 do Prêmio Camões, o reconhecimento mais importante da literatura portuguesa. O anúncio foi feito na tarde desta quarta-feira 26 pela Fundação Biblioteca Nacional.
A conquista celebra uma semana especial da autora, considerada a maior poetisa brasileira viva. Há seis dias, a poetisa foi agraciada com o prêmio Machado de Assis, a maior honraria da Academia Brasileira de Letras (ABL) e uma das mais tradicionais do país.
Mineira de Divinópolis, a poetisa tem 88 anos. Na bagagem, além de poetisa leva os ofícios de professora, filósofa, romancista e contista. Os primeiros poemas foram publicados em jornais da cidade natal e Belo Horizonte.
A leitura de originais da poetisa impressionou o poeta Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), que enviou escritos para que fossem publicados como livro, em 1975. Publicado com o nome Bagagem, o livro de poemas chamou atenção da crítica pela originalidade e pelo estilo.
Com o livro O Coração Disparado, de 1978, conquistou o Prêmio Jabuti de Literatura, conferido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL). Em 1981 lançou Terra de Santa Cruz.
A produção intelectual da poetisa teve espaço para literatura em prosa, com os livros Solte os Cachorros (1979) e Cacos para um Vitral (1980).
A autora, que também publicou obra para o público infantil, mantinha em sua produção conteúdos ligados à fé católica. As páginas escritas pela mineira costumavam trazer temas ligados a Deus, família e a perspectiva da mulher.
A mais nova vencedora do Camões prepara um livro para ser lançado em breve, Jardim das Oliveiras, uma referência ao lugar onde, segundo a tradição cristã, Jesus Cristo rezou na véspera da crucificação.
A poetisa se adaptou ao mundo digital para que parte de sua obra continue sendo acompanhada pelas redes sociais. Pela conta de Instagram é possível ouvi-la falar a respeito ou simplesmente recitar poesias.
O prêmio
Criado em 1988, o Prêmio Camões tem o objetivo de consagrar um autor de língua portuguesa que, pelo conjunto da obra, tenha contribuído para o enriquecimento do patrimônio literário e cultural do idioma. O nome é uma homenagem a Luís Vaz de Camões, um dos maiores poetas portugueses.
A vencedora receberá um prêmio de 100 mil euros, o equivalente a mais de R$ 580 mil. O valor é subsidiado igualmente entre as duas instituições que organizam o Camões: o Ministério da Cultura português e a Fundação Biblioteca Nacional, vinculada ao Ministério da Cultura brasileiro.
Ainda não há data marcada para a entrega da premiação, que pode ser no Brasil ou em Portugal.
Escolha
A escolha da poetisa foi feita por um júri de seis pessoas, sendo duas representantes do Brasil, duas de Portugal e duas de Moçambique. A cada duas edições, um terceiro país é escolhido para representar os demais integrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).
Os integrantes brasileiros foram o escritor Deonísio da Silva e o professor e pesquisador Ranieri Ribas. Os dois participam da reunião diretamente da Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro.
Pelo lado de Portugal figuram as professoras Clara Crabbé Rocha e Isabel Cristina Mateus. O filósofo e crítico de arte poética Dionisio Bahule e o professor Francisco Noa formaram a triparte moçambicana do júri.
Em comunicado sobre a escolha, o júri classificou a poetisa como “autora de uma obra muito original, que se estende ao longo de décadas, com destaque para a produção poética”.
“A poetisa é há longos anos uma voz inconfundível na literatura de língua portuguesa”, completa.
Os jurados lembraram o elogio que Carlos Drummond de Andrade fez à conterrânea. Nas palavras dele, reproduz o comunicado, “A poetisa é lírica, bíblica, existencial, faz poesia como faz bom tempo”.
Outros vencedores
O vencedor da edição 2023 foi o ensaísta, crítico literário, cronista e tradutor português João Barrento.
Entre os 36 vencedores do Prêmio Camões estão 15 brasileiros, 14 portugueses, três moçambicanos, dois cabo-verdianos, um angolano e um luso-angolano.
O brasileiro que mais recentemente conquistou o Camões foi outro mineiro, escritor Silviano Santiago, em 2022.
Entre os brasileiros agraciados aparecem João Ubaldo Ribeiro (2008), Lygia Fagundes Telles (2005), Jorge Amado (1994), Rachel de Queiroz (1993) e João Cabral de Melo Neto (1990).
Recusa
A edição de 2019 foi marcada por uma recusa em entregar o diploma de vencedor. O premiado da 31ª edição era o escritor, cantor e compositor Chico Buarque. Mas o então presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), de quem o músico é crítico, não cumpriu o protocolo, fazendo com que a láurea só chegasse às mãos de Chico em 2023, com a assinatura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
“Reconforta-me lembrar que o ex-presidente teve a rara fineza de não sujar o diploma do meu Prêmio Camões, deixando seu espaço em branco para assinatura do nosso presidente Lula”, disse Chico na cerimônia.