
A Polícia Federal (PF) afirmou, em relatório final sobre a “Abin paralela”, que a atual gestão da Agência Brasileira de Inteligência tentou criar um fato político para embaraçar o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF). A manobra teria o objetivo de dificultar as investigações sobre o uso indevido da ferramenta First Mile por servidores durante o governo Bolsonaro, conforme informações do Globo.
Segundo a PF, a tentativa ocorreu após Dino, então ministro da Justiça, determinar a abertura do inquérito que deu origem à apuração sobre o uso ilegal do sistema de monitoramento. A decisão foi tomada em janeiro de 2023, dois dias após reportagens revelarem que o software havia sido usado sem autorização judicial no governo anterior.
O relatório encaminhado ao STF destaca uma conversa registrada em outubro de 2023 entre Alessandro Moretti, então diretor-adjunto da Abin, e Marcelo Furtado, diretor do Departamento de Operações. No diálogo, Furtado envia informações sobre um contrato assinado em 2017 pelo governo do Maranhão — época em que Dino era governador.
“Opa. Boa tarde. Dr. Achei isso do governo Dino no Maranhão. Queria ver se pode ser o First Mile ou outra ferramenta da mesma empresa”, escreveu Furtado. Em resposta, Moretti diz: “Vou dar uma olhada. Te aviso.” Segundo a PF, o acesso à conversa foi possível após quebra de sigilo autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes.
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“O contexto converge com o cenário já delineado, no qual havia um ambiente que permitiu a MARCELO FURTADO MARTINS DE PAULA, investigado nos presentes autos, encaminhar um fato que pudesse ser usado politicamente contra o então Ministro da Justiça, FLÁVIO DINO DE CASTRO E COSTA, para causar embaraço à apuração”, diz o relatório.
A PF ainda afirma que a mensagem é “prova cabal da tentativa de criar um fato político para embaraçar a apuração” e que a resposta de Moretti “demonstra seu envolvimento direto na manobra”.
Chefe da Abin
O relatório final da PF também aponta irregularidades cometidas por Luiz Fernando Corrêa, atual diretor-geral da Abin. Segundo os investigadores, ele exerceu o cargo de forma informal antes de sua nomeação oficial, participou de reuniões sigilosas e agiu para proteger Paulo Maurício Fortunato Pinto, ex-número três da agência e apontado como um dos responsáveis pela degradação do órgão.

Luiz Fernando foi indiciado por crimes como prevaricação, coação no curso do processo e por atrapalhar a investigação. A PF afirma que, já atuando como chefe da Abin, ele minimizou o escândalo sobre o uso clandestino do First Mile ao afirmar que “a montanha vai parir um rato”.
Ainda de acordo com o relatório, Corrêa tentou descredibilizar a investigação ao classificá-la como “política” e adotou uma postura agressiva contra servidores que colaborassem com a apuração.
“A insatisfação com aqueles que colaborassem com a presente investigação era devidamente exposta pelo diretor-geral da Abin, tanto que defendeu em tom agressivo a ‘intervenção na corregedoria’”, aponta a PF.
Os investigadores também afirmam que a cúpula da Abin agiu para controlar os depoimentos e evitar que servidores contribuíssem com as investigações.