Uma equipe de pesquisadores da China anunciou um avanço no campo da criptologia quântica ao fatorar com sucesso um número RSA de 90 bits utilizando um computador quântico D-Wave Advantage.
A conquista foi liderada pelo professor Wang Chao, da Universidade de Xangai, e representa um novo marco na aplicação de tecnologias quânticas em sistemas de segurança digital.
O RSA é um dos algoritmos criptográficos mais utilizados na proteção de comunicações digitais. Sua segurança é baseada na dificuldade matemática de fatorar números inteiros grandes.
O avanço divulgado pela equipe chinesa amplia o debate global sobre a capacidade de computadores quânticos em quebrar sistemas criptográficos, uma possibilidade conhecida como Dia Q — cenário em que máquinas quânticas teriam poder suficiente para decifrar algoritmos considerados seguros.
A pesquisa foi realizada por meio da integração de algoritmos de recozimento quântico com técnicas clássicas de criptografia.
O processo envolveu o uso do sistema D-Wave Advantage, equipamento desenvolvido no Canadá com capacidade de 5.760 qubits, unidades fundamentais de informação na computação quântica.
Segundo o professor Wang, a abordagem adotada pela equipe utilizou uma combinação de física quântica, criptografia e arquitetura computacional para superar limitações técnicas anteriores.
“A força do recozimento quântico reside em sua capacidade de escapar rapidamente de ótimos locais e se aproximar de uma solução global por meio do tunelamento quântico”, afirmou Wang no artigo que descreve a pesquisa.
Para realizar a fatoração, os pesquisadores transformaram o problema RSA em um Problema de Vetor Mais Próximo (CVP).
Em seguida, aplicaram múltiplos algoritmos clássicos junto ao efeito de tunelamento quântico para otimizar a solução. A técnica de recozimento quântico busca o estado de menor energia de um sistema, o que corresponde à melhor solução possível para o problema em análise.
O resultado supera marcas anteriores de fatoração quântica. Pesquisadores da Fujitsu haviam alcançado fatoração de 9 bits, enquanto a Lockheed Martin registrou 13 bits e a Universidade Purdue, 20 bits.
Até 2023, estudos conduzidos por pesquisadores do Google e da IonQ apontavam que a fatoração de números RSA acima de 80 bits continuava inviável com a tecnologia disponível.
Em 2024, o Google lançou o chip quântico Willow, mas o dispositivo ainda não foi utilizado com sucesso em ataques criptográficos. Tanuj Khattar, do Google Research, declarou na época que “[o método atual] não consegue encontrar relações de fatoração suficientes para números inteiros aleatórios de 80 bits e além”.
Apesar do avanço, Wang reconhece que o feito não compromete a segurança das chaves RSA atualmente em uso, que possuem, em sua maioria, pelo menos 2.048 bits.
Segundo o pesquisador, o método híbrido desenvolvido pode ser escalável para desafios maiores, mas limitações práticas, como o tempo de coerência dos estados quânticos e a taxa de sucesso das operações, ainda impõem barreiras significativas.
O progresso obtido pela equipe chinesa reacende discussões sobre a preparação de sistemas de segurança digital para o cenário pós-quântico. Setores como bancos, plataformas de blockchain e serviços governamentais estão entre os que mais investem em soluções de criptografia resistentes à tecnologia quântica.
A adoção da criptografia pós-quântica, prática conhecida como “migração quântica”, busca proteger informações sensíveis contra a possibilidade de quebra futura por computadores quânticos.
Um especialista em computação quântica baseado em Pequim, que não teve a identidade revelada, afirmou que “o progresso na computação quântica tem sido lento por dois motivos principais: os computadores quânticos atualmente carecem de recursos de autocorreção, tornando os cálculos propensos a erros, e a incompatibilidade entre hardware e software”. Segundo ele, a metáfora adequada para a situação é “operar um trem de alta velocidade em trilhos estreitos”.
A equipe de Wang argumenta que a velocidade de evolução da computação quântica pode superar o ritmo de adaptação das defesas criptográficas.
“A computação quântica pode evoluir mais rápido do que o esperado, ultrapassando as defesas existentes”, declarou Wang. O pesquisador destacou ainda que os caminhos entre ataque e defesa nem sempre seguem o mesmo ritmo, o que pode abrir espaço para vulnerabilidades.
Especialistas alertam que, embora a fatoração de um inteiro RSA de 90 bits não represente uma ameaça imediata aos sistemas criptográficos robustos, o avanço técnico aponta para a necessidade de desenvolvimento contínuo em tecnologias de segurança digital. A expectativa é que a integração de soluções quânticas e clássicas acelere os processos de pesquisa e desenvolvimento no setor.
A pesquisa conduzida pela equipe da Universidade de Xangai reforça o papel da China na disputa global por liderança em tecnologias emergentes, incluindo inteligência artificial, computação quântica e criptografia.
O estudo contribui para o debate sobre as implicações da tecnologia quântica na segurança da informação e amplia a pressão para que governos e empresas revisem suas estratégias de proteção de dados.
Com informações da SCMP