Pesquisadores do Centro de Inovação em Novas Energias (CINE) desenvolveram um sistema capaz de produzir hidrogênio sem emissão de carbono utilizando apenas luz solar, água e materiais abundantes no Brasil. O protótipo, um fotoeletrolisador, foi testado com sucesso tanto em laboratório quanto ao ar livre e teve seus resultados publicados na revista científica ACS Energy Letters.
Criado em 2018 pela FAPESP em parceria com a Shell, o CINE é um Centro de Pesquisa Aplicada sediado na Unicamp, USP e UFSCar, com participação de outras oito instituições brasileiras.
Embora ainda não disponíveis comercialmente, os fotoeletrolisadores despontam como alternativa promissora para a produção de hidrogênio verde. Diferentemente dos eletrolisadores convencionais, esses dispositivos são energeticamente autossuficientes graças ao uso de um fotoânodo, eletrodo capaz de absorver luz solar e convertê-la diretamente em energia para promover as reações necessárias à separação do hidrogênio da água.
O grande desafio, porém, tem sido desenvolver fotoânodos eficientes, estáveis, de baixo custo e fabricáveis em larga escala.
“Neste trabalho, apresentamos um avanço essencial nesse caminho ao superar um dos principais gargalos da área: a obtenção de um fotoânodo de hematita eficiente, estável e escalonável”, explica Flavio Leandro de Souza, professor da UFABC, pesquisador do LNNano/CNPEM e integrante do CINE, que liderou o estudo.
A hematita, um óxido de ferro abundante e resistente à água, é considerada um dos materiais mais promissores para fotoeletrólise. Para aumentar sua eficiência sem comprometer a estabilidade, os pesquisadores incorporaram pequenas quantidades de óxidos de alumínio e zircônio — ambos amplamente disponíveis no país.
Com foco na escalabilidade, a equipe desenvolveu um método de produção que pode ser aplicado em escala industrial. Foram fabricados cem fotoânodos idênticos, utilizados para montar um sistema modular: cada fotoeletrolisador reúne dez desses eletrodos, e dez fotoeletrolisadores formam um módulo de um metro quadrado.
Em testes laboratoriais com um simulador de luz solar, o sistema operou de forma estável por 120 horas. Um protótipo menor, com dois fotoeletrolisadores, também foi avaliado ao ar livre e apresentou o mesmo desempenho, demonstrando robustez.
A pesquisa, conduzida por seis cientistas no CNPEM, contou com a colaboração de Renato Gonçalves, do IFSC-USP, responsável pela construção do simulador solar de grande área usado nos ensaios.
Agora, os pesquisadores trabalham no desenvolvimento do cátodo — o segundo eletrodo do sistema — com o objetivo de que ele também funcione exclusivamente com luz solar. “O próximo passo, já em andamento, é um módulo operando 100% com irradiação solar, com cada fotorreator composto por fotoânodo e fotocátodo”, afirma Souza.
Segundo ele, a tecnologia é ideal para indústrias que necessitam de hidrogênio verde em pontos específicos do processo, permitindo a injeção direta do gás e a adaptação modular dos equipamentos conforme a demanda.
A equipe planeja ampliar ainda mais a escala de produção, mas destaca que essa etapa exige investimentos consideráveis em infraestrutura e segurança. “A colaboração com empresas interessadas será fundamental”, ressalta o pesquisador.
O trabalho também recebeu apoio da FAPESP por meio do Centro de Pesquisa em Engenharia Molecular para Materiais Avançados (CEMol).
O artigo completo, Photoelectrode Fabrication and Modular PEC Reactor Integration for Stable Solar Hydrogen Production, está disponível neste link.
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