A recente troca de farpas entre Pablo Marçal, candidato à Prefeitura de São Paulo, e Jair Bolsonaro, ex-presidente e figura central da extrema-direita brasileira, revela um movimento que muitos já antecipavam: a fragmentação do bolsonarismo e a ascensão de novos líderes que, embora bebam da mesma fonte extremista, começam a se descolar da figura do ex-presidente.
O incidente teve início quando Marçal, que outrora buscava apoio de Bolsonaro, decidiu responder a uma postagem no Instagram do ex-presidente com um elogio disfarçado de alfinetada. A resposta seca de Bolsonaro, “Nós? Um abraço”, foi suficiente para desencadear uma série de réplicas e tréplicas que, longe de prejudicar Marçal, acabaram por reforçar sua imagem pública.
Acabou acusando Bolsonaro de cheirar cocaína, como fez com Guilherme Boulos. Marçal, que já foi chamado de “ex-coach” e hoje se apresenta como empresário e político, parece ter entendido a fórmula para se destacar: rebaixar ainda mais o nível do debate, sem a necessidade de subordinação a Bolsonaro, que abriu a porta para um delinquente ainda pior que ele.
Este episódio marca um ponto de inflexão na extrema-direita brasileira. Durante anos, o bolsonarismo parecia ser um movimento monolítico, com Jair Bolsonaro como sua única face visível. No entanto, a recente pesquisa Datafolha para a Prefeitura de São Paulo mostra que a realidade pode estar mudando. Com Marçal tecnicamente empatado na liderança com Guilherme Boulos (PSOL) e Ricardo Nunes (MDB), surge espaço para outras vozes dentro do espectro fascista, vozes essas que não necessariamente precisam do endosso de Bolsonaro para prosperar.
O ex-presidente, que por muito tempo foi o bastião do extremismo no Brasil, começa a se ver isolado por figuras que, embora tenham surgido à sua sombra, agora buscam protagonismo. Marçal, ao transformar um confronto com Bolsonaro em material de campanha, demonstra uma audácia que poderia ser impensável há poucos anos.
Essa independência crescente de Bolsonaro é um fenômeno que pode ter consequências duradouras. A extrema-direita, outrora coesa em torno de um único líder, agora se fragmenta em várias facções, cada uma tentando se destacar com seu próprio discurso. Se, por um lado, isso dilui o poder de Bolsonaro, por outro, pode tornar a extrema-direita mais perigosa e imprevisível. Afinal, sem um líder centralizador, novas lideranças podem surgir, cada uma com sua própria agenda e métodos, tornando o cenário político ainda mais ameaçador.
A pesquisa Datafolha, ao revelar o crescimento de Marçal à frente de Ricardo Nunes, atual prefeito de São Paulo e apoiado por Bolsonaro, é um indicador claro dessa nova realidade. Enquanto Bolsonaro tenta se agarrar ao legado de 2018, novos atores como Marçal avançam rapidamente, ocupando espaço e angariando apoio. E, embora Marçal tente manter alguma ligação com o bolsonarismo, sua reação rápida ao ser rejeitado demonstra que ele está mais do que preparado para seguir seu próprio descaminho, mesmo que isso signifique entrar em conflito direto com o ex-presidente.
Essa dinâmica de conflito interno e crescimento de novas lideranças pode indicar que o bolsonarismo, como movimento centralizado, está com seus dias contados. O perigo agora é que, em seu lugar, cresça uma extrema-direita mais pulverizada, mas igualmente eficaz em mobilizar a população. A política brasileira, assim, pode estar entrando em uma nova fase, em que o perigo não vem de uma única figura, mas de um conjunto diversificado de líderes.
Em suma, a discussão entre Pablo Marçal e Jair Bolsonaro não é apenas um episódio isolado de vaidades políticas. É, antes de tudo, um sinal de que a extrema-direita brasileira está evoluindo – ou, dependendo do ponto de vista, se degenerando – para um novo formato. Esse novo cenário pode resultar em uma direita mais fragmentada, mas também mais resiliente e adaptável, capaz de perpetuar suas ideias e influenciar a política nacional por mais tempo que poderíamos imaginar.