Apesar da redução, o Brasil se mantém, pelo 17º ano consecutivo, como o país que mais mata pessoas trans no planeta. No ano passado, foram registradas 105 mortes, 14 casos a menos em relação ao ano anterior.

Os dados estão no Dossiê: Registro Nacional de Mortes de Pessoas Trans no Brasil em 2024: da Expectativa de Morte a um Olhar para a Presença Viva de Estudantes Trans na Educação Básica Brasileira, da Rede Trans Brasil.

A secretária adjunta de Comunicação da Rede Trans Brasil, Isabella Santorinne, diz que a queda no número de mortes de pessoas trans em relação a 2023 é um pequeno alívio, mas não se pode ignorar que elas ainda acontecem.

“Isso reflete como o Brasil está em um processo lento e desigual de mudança. Apesar de avanços em debates públicos e de maior visibilidade, a violência e o preconceito ainda são uma realidade para muitas pessoas trans. Essa trajetória mostra que, embora existam sinais de progresso, a luta está longe de acabar”, destaca.

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O Nordeste concentra o maior número de casos (38%), seguido do Sudeste (33%), Centro-Oeste (12,6%), Norte (9,7%) e Sul (4,9%).

A presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, deputada Daiana Santos (PCdoB-RS), considera que o número de mortes “é estarrecedor e comprova o quanto o país ainda é conservador e pode ser cruel com pessoas LGBTI+”.

“Nos últimos anos, houve avanços nos debates e na visibilidade de pessoas trans. Entretanto, a violência ainda é uma realidade. A preservação da vida das pessoas LGBTI+ passa por uma mudança no pensamento da nossa sociedade, mas também pela aprovação de leis que garantam punições mais severas para quem comete esses tipos de crime”, lembra.

A deputada diz que, no ano passado, houve a aprovação na Comissão de Direitos Humanos do projeto de lei 7292/2017, que considera o LGBTcídio como homicídio qualificado e o classifica como crime hediondo.

“É necessário pressionarmos para que esse projeto seja analisado pela CCJ e, posteriormente, vá à votação no plenário. Enquanto não houver políticas públicas eficazes, a luta por dignidade continuará sendo uma realidade”, adverte.

Deputada Daiana Santos (Foto: Christiane Peres/PCdoB na Câmara)

“Histórias interrompidas”

A deputada estadual Dani Balbi (PCdoB), primeira mulher trans eleita para a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, diz que os números não são apenas estatísticas, são histórias interrompidas, sonhos destruídos, vidas que não puderam ser vividas plenamente por causa do ódio e da violência.

“Enquanto a primeira deputada trans eleita no Rio de Janeiro, ressalto a minha indignação diante dessa realidade e seguirei lutando por dignidade para pessoas trans e travestis. Precisamos de ações imediatas para proteger nossas vidas: políticas públicas efetivas, segurança, respeito à diversidade e justiça”, defende.

Para ela, trata-se de uma situação que não pode continuar. “É nosso dever lutar por um país onde pessoas trans e travestis possam viver sem medo. Nossas vidas importam e não podem ser tratadas como descartáveis. Vamos seguir lutando para que o Brasil seja um lugar de Justiça e igualdade para todas, todos e todes”, ressalta.

“Os dados ainda são incipientes, e há poucas informações sobre países conhecidos por serem persecutores de pessoas LGBTQIAP+. Então, talvez a expressão desses dados, além de incompleta, faça com que o Brasil figure nessa posição”, completa.

Deputada Dani Balbi (Foto: Reprodução)

Mundo

A Rede Trans Brasil colabora com a pesquisa Trans Murder Monitoring, que monitora os assassinatos de pessoas trans e de gênero em diversos países. A América Latina e o Caribe, por exemplo, reúnem cerca de 70% dos casos.

Na região, o Brasil é seguido pelo México (71), Colômbia (25), Equador (14), Honduras (6), Argentina (6), Guatemala (5), Venezuela (4), Cuba (3), Panamá (3), Peru (2), Bolívia (2), Nicarágua (2), Uruguai (1), Porto Rico (1), Chile (1), Guiana (1), Trindade e Tobago (1) e República Dominicana (1).

“Os dados ainda são incipientes, e há poucas informações sobre países conhecidos por serem persecutores de pessoas LGBTQIAP+. Então, talvez a expressão desses dados, além de incompleta, faça com que o Brasil figure nessa posição”, avalia Dani Balbi.

Para além dos dados, a deputada afirma que o país continua sem políticas públicas para a integração plena desse segmento na sociedade. “São políticas que visam inserir as pessoas transexuais e travestis no curso do ensino básico, entrada, ingresso e conclusão do ensino superior, políticas de incentivo à contratação por meio dos mecanismos como a oferta de renúncia fiscal para empresas e também a adoção de percentual de concurso público. Tudo isso ajuda a desfazer dogmas persecutores, mas também constrói condições de autonomia plena”, diz.

Por fim, Balbi avalia um terceiro elemento, que é o aumento de um fundamentalismo. “Uma inflexão conservadora que o Brasil vem atravessando, que faz com que o estímulo à perseguição, às violações de direitos, violências e assassinatos se torne maior e com mais difícil contenção”, considera.

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Last Update: 23/01/2025