Esposa de um general, cunhada de um desaparecido político, filha de um fundador do PDT de Minas Gerais, Maria Elizabeth Rocha, ministra do Superior Tribunal Militar há 17 anos, fez história ao ser eleita a primeira mulher a presidir a corte castrense em 217 anos de história.

Única mulher entre os 15 membros do STM, Maria Elizabeth, 65 anos, toma posse do mandato de presidente nesta quarta-feira, 12 de março, e seguirá no comando da corte pelos próximos dois anos.

Em dezembro de 2024, após ter sido eleita pelos pares, Maria Elizabeth concedeu ao jornalista Luis Nassif, da TV GGN, uma entrevista exclusiva [assista abaixo], onde falou, com uma visão garantista e humanizada, sobre a ditadura e a tentativa de golpe de 8 de Janeiro, o fortalecimento da democracia, o papel histórico do STM, criminalidade no Brasil, a formação dos militares, racismo estrutural, entre outros temas.

O STM é o mais longevo tribunal do país, criado em 1808 por Dom João, quando este ainda era príncipe regente no Brasil colonial. Seu papel é julgar crimes militares (matéria penal) praticados por membros das Forças Armadas e civis. A corte especial não tem tribunais intermediários, ou seja, seus recursos vão diretamente ao Supremo Tribunal Federal. Já a Justiça Militar nos estados funciona com distinções: julgam crimes militares e administrativos (penal e cível) praticados somente pelos membros das policiais militares e do corpo de bombeiros.

Na entrevista exclusiva ao jornalista Luis Nassif, a nova presidente do STM defendeu a imagem da instituição que vai comandar entre 2025 e 2027, bem como sua atuação durante o regime militar. A ministra declarou que os militares, via de regra, “sempre foram legalistas”, a despeito do rompimento constitucional que se deu em 1964, episódio que ela chamou de “apocalipse”.

Segundo Maria Elizabeth, são exceções os militares que apoiaram a tentativa de golpe para manter Jair Bolsonaro em 2022. O então comandante da Marinha, Almirante Garnier, foi um dos conspiradores e hoje encontra-se preso. De acordo com a ministra, a despeito do envolvimento de Garnier, “o almirantado [em geral] sequer tomou conhecimento desse plano escabroso”.

Para a ministra, o 8 de Janeiro deixou lições sobre democracia, assim como as novas da revelações da Polícia Federal a respeito do plano de golpe de 2022, que envolveu tentativa de assassinato de Alexandre de Moraes, Lula e Geraldo Alckmin. Esses fatos ensinam que “a democracia nunca está pronta e acabada. Ela tem que ser vigiada permanentemente, construída diariamente.”

Na visão da magistrada, a fragilidade da democracia brasileira tem relação com o racismo estrutural, com a sociedade patriarcal e heteronormativa que foi construída pelas elites do país, e que ainda hoje deixam cicatrizes profundas na população e nas instituições.

Eu realmente acreditei, quando a Constituição de 1988 foi promulgada, que estávamos virando uma página da história. Mas eu vi que não. E eu fico assustada quando a juventude fala em autoritarismo e pede intervenção militar, porque essa juventude não conheceu o que é o autoritarismo, as dores e mazelas de um estado autocrático“, declarou.

Trajetória e carreira

Eleita presidente do STM em 5 de dezembro de 2024, a ministra Maria Elizabeth possui uma longa trajetória na Justiça Militar. No biênio 2013-2015, exerceu a vice-presidência da Corte e, por nove meses, atuou como presidente interina após a aposentadoria compulsória do então presidente Raymundo Nonato de Cerqueira Filho.

Natural de Belo Horizonte (MG), nasceu em 29 de janeiro de 1960. É bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) e possui mestrado em Ciências Jurídico-Políticas pela Universidade Católica Portuguesa, em Lisboa. É também doutora em Direito Constitucional pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e fez pós-doutorado em Direito Constitucional na Universidade Clássica de Lisboa. Atuou por muitos anos como professora na Universidade de Brasília (UnB) e no Centro Universitário de Brasília (UniCEUB).

Antes de assumir a magistratura no STM, foi procuradora federal – cargo conquistado após aprovação em primeiro lugar em concurso público de provas e títulos -, tendo atuado em diversos órgãos, incluindo o Congresso Nacional, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a Subchefia para Assuntos Jurídicos da Casa Civil da Presidência da República.

No Tribunal, presidiu a Comissão de Direito Penal Militar, responsável pela atualização da legislação específica da área, modernizando dispositivos que datam de 1969, uma das ações mais importantes da Corte nos últimos anos.

Assista a entrevista abaixo:

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Com informações do STM

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Last Update: 12/03/2025