Por que analistas esquecem o impacto do bloqueio econômico na Venezuela?
No período anterior às eleições do dia 28 de julho, na Venezuela, o noticiário da mídia empresarial, seguindo orientação dos conglomerados internacionais da comunicação, já estava recheado de falas genéricas, destemperos, rótulos e comentários sem base factual sobre o processo bolivariano na Venezuela.
Uma das coisas mais graves é uma ideia construída durante anos: a maioria dos analistas ignora ou diminui o peso do bloqueio econômico, ou então o menciona como mero detalhe, sendo que este é um fator decisivo para as dificuldades que o país enfrenta durante quase uma década.
A história do bloqueio contra o governo bolivariano e contra todo o país começa em dezembro de 2014, quando o congresso dos EUA aprovou a Lei de Defesa dos Direitos Humanos 113-278, que previa a aplicação de sanções contra os venezuelanos.
No ano seguinte, a ofensiva do governo dos EUA se intensificou, com Ordem Executiva do governo Obama, declarando o país sul-americano como uma “ameaça inusual para a segurança interna do Estados Unidos”.
O governo Trump, em 2019, aplica bloqueio econômico completo, no mesmo ano quando ocorre a desestabilização do país pela oposição de direita, com a violência das chamadas “guarimbas”.
Vídeo recente do próprio Trump atesta o lamento do ex-presidente de que aquela crise era o momento “certo” para o país ser invadido e os recursos energéticos, tomados.
Com isso, a economia passou a sofrer retenções bancárias, queda na entrada de moedas estrangeiras, com a população perdendo capacidade de compra.
Em um país onde, até 2020, cerca de 80% do consumo interno era suprido com produtos importados, intensificou-se a queda no abastecimento nacional. Somente da Europa, as importações caíram 65% de 2015 para 2019.
No plano internacional, potências imperialistas como EUA e Inglaterra aplicaram simplesmente o saque contra empresas e recursos venezuelanos.
Houve ataques diretos a reservas internacionais da Venezuela e o roubo da distribuidora e refinadora de petróleo Citgo, uma subsidiária da empresa estatal venezuelana PDVSA, com sede em Houston (EUA).
Houve também o confisco de ativos em ouro depositados na Inglaterra, com o governo de Londres travando depósitos e 1,95 bilhão de dólares em reservas.
Além disso, ocorreu a apropriação ilegal de empresas venezuelanas instaladas na Colômbia do governo de Álvaro Uribe, que ao longo de anos serviu de cabeça de ponte dos EUA para o assédio contra o país.
Imaginem o que aconteceria com a economia brasileira se as reservas internacionais e se empresas como a Petrobras fossem fatiadas e saqueadas?
Empresas dos EUA precisam de licença especial para investir ou abrir negócios na Venezuela.
Há proibição de empresas venezuelanas de operarem no mercado de capitais estadunidense.
Mas os problemas não se dão apenas na esfera financeira, eles têm um desdobramento no cotidiano do povo.
O bloqueio causa transtornos na vida cotidiana da população, o que pude atestar em estadia no país em 2019. E o governo dos EUA sempre contou com isso para desgastar o governo bolivariano.
Recentemente, a economia do país e o setor petroleiro se recuperaram, devido à resistência no período de crise, à parceria com China, Rússia e Irã, além de reabertura parcial do comércio com os EUA, no contexto da guerra da OTAN/Ucrânia contra a Rússia.
O governo dos EUA autorizou, por exemplo, a importação do hidrocarboneto venezuelano recentemente pela Índia.
Na coletiva de imprensa cedida por Maduro no 31 de julho (quarta), aliás, com participação de vários canais de comunicação, caso do Washington Post, fato curioso para uma “ditadura”, Maduro reafirmou a soberania do país, e a partir disso confirmou a disposição ao comércio energético com os EUA.
Ressaltando sempre a soberania e a manutenção de princípios soberanos com que faz a negociação.
A recuperação da situação econômica na Venezuela contrasta então com a gritaria da oposição no Brasil e com o assédio da oposição na Venezuela tentando construir a condição para um golpe.
Esse episódio de lançar para o mundo uma ideia equivocada do que se passa na Venezuela, uma ideia de caos, já foi visto e ficou evidente no conhecido capítulo da tentativa de golpe de 2002, contra o governo de Hugo Chávez, comandado por setores da elite petroleira que vinham perdendo espaço no país, e o golpe e sequestro de Chávez lançou a notícia falsa ao mundo de que as pessoas estavam nas ruas para derrubar Chávez. Quando, na verdade, buscavam apoiá-lo e restabelecê-lo no poder.
Ficou famoso, com isso, o documentário “A revolução não será televisionada” sobre esses dias turbulentos.
O imperialismo dos Estados Unidos historicamente usa o método de chantagem econômica para pressionar, desgastar e derrubar governos revolucionários, como ocorreu com o bloqueio contra a revolução cubana e no financiamento da contrarrevolução para derrubar a Nicarágua sandinista.
O método é realmente eficaz: a população tende a se desgastar com o governo e não necessariamente contra medidas econômicas e externas abstratas.
Há vários outros fatores ignorados por analistas enfurecidos e linhas editoriais frustradas.
A participação popular no processo eleitoral e cotidiano; a defesa soberana do país e contra ingerências externas; a riqueza de recursos minerais – do ouro, passando pelo coltán -, na bacia do Orinoco que são alvo do interesse do imperialismo; e, o principal, a violência da extrema-direita venezuelana.
Seu componente de agitação, desestabilização e caos no país. Nada disso tem peso em algumas análises que apenas repetem: ditadura.
Neste momento, desgastado com o financiamento do genocídio do povo palestino e com o financiamento da guerra da Ucrânia, o governo dos EUA talvez não tenha como realizar a sonhada derrota do processo bolivariano – como foi dito expressamente por Trump, em 2019.
Porém, vemos o resultado de uma década de bloqueio, chantagem, desconstrução na mídia, segue tentando impedir que os venezuelanos possam construir um caminho de paz.
Nenhum processo revolucionário ou sequer soberano (como já vimos na Líbia e Síria) terá condições de se desenvolver sem o assédio do imperialismo. É uma lição pra organização dos povos.
Referências: [Seu Site]
HARNECKER, Marta. Um mundo a construir. Expressão Popular, 2018.
SERAFINO e VIELMA. Radiografía de un país bajo asedio. Mision Verdad. Caracas, 2019.
Edição: [Seu Nome]
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