Em 2023, a renúncia fiscal do governo para incentivo à cultura foi de R$ 2,5 bilhões, mas o valor captado para o setor foi de R$ 2,3 bilhões
A participação da despesa com cultura no total de gastos públicos caiu de 0,40% em 2013 para 0,38% em 2023. Apenas o gasto municipal mostrou recuperação do patamar encontrado no início da série (de 1,05% da despesa para 1,09%), com retração para a participação nos níveis estadual (de 0,46% para 0,39%) e federal (de 0,09% para 0,04%). A queda ocorreu entre os anos de 2013 e 2021, quando chegou ao mínimo de 0,27%. Em 2022, cresceu para 0,31%, chegando a 0,38% em 2023.
Em termos nominais, o total de gastos públicos com cultura cresceu 122,4% entre 2013 e 2023, de R$ 8,5 bilhões para R$ 18,9 bilhões. Em termos de comparação, o IPCA cresceu cerca de 109% nesse período.
Levando em conta as transferências e contabilizando as políticas de auxílio apenas no destino, as despesas em cultura no nível federal diminuíram 7,3%, de R$ 923,5 milhões, em 2013, para R$ 856,1 milhões, em 2023. A esfera estadual teve aumento de 84,3% no mesmo período (passando de R$ 3,1 bilhões para R$ 5,7 bilhões). Já a esfera municipal teve o maior crescimento, totalizando R$ 12,3 bilhões, um aumento de 175,9% em comparação a 2013.
Os dados são da publicação Despesa por Função do Governo Geral, da Secretaria de Tesouro Nacional, e fazem parte do Sistema de Informações e Indicadores Sociais (SIIC) 2013-2024, divulgado hoje (12) pelo IBGE. O estudo reúne informações sobre o setor cultural de diversas pesquisas do IBGE sobre empresas, ocupação, preços e acesso à cultura, além de outros dados administrativos do governo.
Segundo o coordenador do estudo, Leonardo Athias, “o salto em números absolutos é recente, pois a despesa total orbitou abaixo de R$ 10 bilhões entre 2013 e 2021, crescendo fortemente nos dois últimos anos da série. Somente agora houve recuperação ante a inflação”.

Na distribuição por categoria de despesa, Outros gastos, que incluem parte dos auxílios concedidos ao setor no período pós-pandemia, passou de 6,7%, em 2013, para 22,0%, em 2023, com crescimento a partir de 2020. Em sentido oposto, a participação das remunerações caiu, passando de 32,2% do total, em 2013, para 27,1%, em 2023. O mesmo aconteceu nos gastos com bens e serviços (custeio), que passaram de 52,8% do total em 2013 para 45,2% em 2023. Investimento bruto, que inclui construções e aquisição de máquinas e equipamentos culturais, também caiu de 6,0%, em 2013, para 3,7%, em 2023, e Outras classificações econômicas (que incluem subsídios, transferências e benefícios sociais) caíram de 2,3%, em 2013, para 2,0%, em 2023. “Não houve perda absoluta nessas categorias, mas perda de participação com o crescimento de Outros gastos”, analisa Athias.
As leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo contribuíram recentemente para o aumento do total de gastos públicos. Dados do Boletim de Monitoramento, da Secretaria de Fomento e Incentivo à Cultura, mostram que governos estaduais e municipais receberam R$ 3,0 bilhões em recursos da Lei Aldir Blanc em 2023. Deste total, mais de R$ 1,1 bilhão foi direcionado para estados e municípios do Sudeste. Já o Painel de Dados da Lei Paulo Gustavo mostra que R$ 3,9 bilhões foram repassados a estados e municípios em julho e agosto de 2023, também com predominância do Sudeste.
Uma análise dos municípios, esfera que possui o maior peso nos gastos públicos em cultura, mostra que, apesar da perda de participação no período, o Sudeste ainda é a região mais relevante, passando de R$ 2,3 bilhões, em 2013 (51,9% do total), para R$ 5,5 bilhões, em 2023 (44,7% do total). O Nordeste ganhou participação no período, passando de 27,0%, em 2013, para 31,8%, em 2023, um aumento de 225,3% em valores absolutos (de R$ 1,2 bilhão para R$ 3,9 bilhões). Já o Centro-Oeste foi a região com a menor participação dos gastos municipais, com apenas 5,3% em 2023. Por outro lado, foi a que teve o maior aumento percentual em valores absolutos no período, com 310,3%.
Quanto à renúncia fiscal do governo para incentivo à cultura via Pronac (Programa Nacional de Apoio à Cultura), em 2013, o valor renunciado foi de R$ 1,1 bilhão e o valor captado por produtores culturais foi de R$ 1,3 bilhão. O investimento privado foi de R$ 182,6 milhões, sendo 14,5% do total. Já em 2023, a renúncia fiscal foi de R$ 2,5 bilhões, mas o valor captado para o setor foi de R$ 2,3 bilhões. Desse total, R$ 901,2 milhões foram direcionados a 1.374 projetos culturais no estado de São Paulo. No total nacional, foram 4.579 projetos culturais aprovados em 2023 contra 3.493 em 2013.
Balança comercial de bens culturais é deficitária
Em 2024, os bens culturais exportados somaram cerca de R$ 4,0 bilhões e os importados, R$ 20,8 bilhões. Considerando uma balança comercial de bens culturais, em 2024 exportações representaram 16,3% e importações, 83,7% do total gasto. Essa situação deficitária foi encontrada em toda a série estudada (com menor participação de exportações em 2014, 11,8%, e maior em 2016, com 22,7%). Os dados são do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e Serviços no período de 2014 a 2024.
“O estudo de comércio exterior de bens e serviços culturais se justifica pelo impacto econômico que podem ter, com possibilidade de orientar políticas direcionadas a essa área, além de representar potencial de incremento na fruição cultural pelas pessoas e mesmo ter efeitos na cooperação internacional”, destaca Athias.

Quanto a produtos importados em 2024, cerca de um terço do valor absoluto (35,1%) esteve ligado a aparelhos eletrônicos, com maiores participações para microfones, alto-falantes e smartphones. Outros produtos relevantes foram máquinas de impressão (25,5%) e brinquedos, jogos e artigos para divertimento (16,3%). Em relação aos produtos exportados, sobressaíram objetos de arte, de coleção e antiguidades, com 37,7% do total. Em segundo lugar, apareceram produtos eletrônicos, com 20,7%, em terceiro, livros e outros produtos gráficos, com 11,9%.
Entre os destinos das exportações brasileiras de bens culturais, em 2024, os destaques são os Estados Unidos (31,7%) e a Argentina (9,1%). Os outros países que estiveram incluídos nesta lista foram na sua grande maioria europeus ou latino-americanos. Em relação à origem das importações brasileiras, a China respondeu por mais da metade (55,6%) do total das importações dos bens culturais em 2024, ou seja, um resultado maior do que a soma de todos os outros países juntos. Em seguida, foram contabilizados os Estados Unidos (6,3%) e a Alemanha (5,0%).
Com dados do Balanço de Pagamento, do Banco Central do Brasil, é possível fazer uma comparação entre as exportações (receitas) e importações (despesas) relacionadas a “Serviços audiovisuais e relacionados”, que compreendem serviços ligados a cinema, TV, música, incluindo licenças, remuneração de artistas etc.
A relação entre importações e exportações de serviços audiovisuais e relacionados se mostrou superavitária entre 2016 e 2023, com exceção de 2018 (52,1% de importações e 47,9% de exportações) e 2024 (empate, com 49,9% para exportações, ante 50,1% para importações), e maior participação de exportações em 2016 (84,4%) ante importações (15,6%).
Na comparação da proporção de exportações (receitas) e importações (despesas) de “serviços audiovisuais e relacionados” em comparação com o total de serviços, observa-se que, diferentemente de bens, há maior representatividade nas exportações relacionadas à cultura (1,07% em 2024) do que nas importações (0,50% em 2024).
Cerca de 2,7 milhões de pessoas têm formação ligada à cultura
Com dados do Censo Demográfico 2022, tinha-se que cerca de 2,7 milhões de pessoas de 25 anos ou mais tinham formações ligadas à cultura, as quais abrangiam 10,9% dos cursos de graduação concluídos em 2022. Maiores proporções foram encontradas para mulheres (11,9%), ante homens (9,9%), e para pessoas de cor ou raça indígena (14,9%) e preta (12,0%), ante pessoas de cor ou raça branca (11,1%), amarela (10,5%) e parda (10,4%). Por faixa etária, a maior proporção estava entre as pessoas a partir de 50 anos (13,4%).
Em 2022, cerca de 2,0 milhões de pessoas de 25 anos ou mais com áreas de formação de curso de graduação ligadas à cultura estavam ocupadas. No entanto, destas, 25,4% trabalhavam no setor cultural e 74,6%, fora. Maiores proporções de ocupação na cultura foram encontradas para pessoas de cor ou raça amarela (33,9%), cor ou raça branca (29,4%), homens de 25 a 39 anos (31,8%) e mulheres de 25 a 39 anos (34,4%).
Regionalmente, maiores proporções foram encontradas em São Paulo (31,6%), Rio de Janeiro (30,7%) e Santa Catarina (30,7%); menores, no Amapá (8,5%), Roraima (8,8%) e Tocantins (9,2%).
“Pessoas ocupadas em atividades ou ocupações culturais (formais e informais) eram cerca de 5,7% do total segundo o Censo Demográfico 2022. Para além das capitais, havia, entre outros, concentrações em diversas localidades do Ceará, Central Potiguar (RN), Agreste de Pernambuco, Centro Goiano (GO) e Vale do Itajaí (SC)”, destaca Athias.

Os dados do Censo permitem ainda a análise da principal atividade cultural por município. A atividade que aparece no maior número de municípios é Confecção de artigos do vestuário e acessórios, com 1.846 municípios, seguida por Fabricação de móveis (805) e Telecomunicações e serviços de informações (610).
Entre as maiores capitais, Atividades artísticas, criativas e de espetáculos se destacam na primeira posição no Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Salvador, com segunda posição em São Paulo e Brasília, locais onde Publicidade teve primeira posição.

‘Assistir a vídeos’ é o destaque cultural no acesso à internet
Pelos dados do módulo de Tecnologia da Comunicação e da Informação – TIC da PNAD Contínua, em 2024, 89,2% ou 165,1 milhões de pessoas de 10 anos ou mais acessaram a internet pelo menos uma vez nos três meses anteriores à entrevista. Em 2016, ano em que começou a série histórica, o percentual foi de 66,0% ou 115,1 milhões de pessoas.
Entre as finalidades de acesso à internet investigadas em 2024 relacionadas à cultura estão: “Assistir a vídeos, inclusive programas, séries e filmes”, com 88,5% dos usuários de Internet; “Ouvir músicas, rádio ou podcast”, com 83,5%; “Ler jornais, notícias, livros ou revistas pela Internet”, com 68,8%; e “Jogar (pelo videogame, celular, computador etc.)”, com 30,3%.
“Assistir a vídeos, inclusive programas, séries e filmes” e “Ouvir músicas, rádio ou podcast” tiveram menor penetração entre pessoas de 60 anos ou mais: 71,3% e 62,2%, respectivamente. Quase todas as finalidades de acesso tiveram maior proporção entre jovens de 15 a 29 anos, em 2024, em comparação aos demais grupos. A exceção foi “Jogar (pelo videogame, celular, computador etc.)”, que teve 47,3% dos jovens e um percentual maior entre as pessoas de 10 a 14 anos (71,8%). Essa finalidade foi também maior para homens (37,0%) em comparação com mulheres (24,1%).
“Ler jornais, notícias, livros ou revistas pela internet” mostrou diferenças por sexo e cor ou raça, com mulheres pretas ou pardas (65,5%) apresentando 7,8 pontos percentuais abaixo de homens brancos (73,3%), o grupo com mais acesso. Essa finalidade também mostrou grande diferença entre pessoas sem instrução ou fundamental incompleto (49,2%) e ensino superior completo (88,6%).
Os dados também revelam a evolução tecnológica da televisão. Aumenta a proporção de domicílios com televisão de tela fina entre 2016, eram 65,3% dos domicílios, ante 2024, com 90,5%, um equipamento com potencial de acesso e uso da Internet. Na comparação entre 2016 e 2024, decresce o número de domicílios com acesso a televisão por assinatura, de 33,2% para 24,5%. O acesso a serviço pago de streaming de vídeo, que começou a ser investigado em 2022, estava presente em 10,9% dos domicílios, e chega a 11,4% em 2024. Mulheres brancas (13,9%) e homens brancos (13,5%) eram moradores de domicílios com streaming em maior proporção do que mulheres pretas ou pardas (9,8%) e homens pretos ou pardos (9,5%). Esse serviço também esteve mais presente em domicílios das regiões Sudeste (12,9%), Sul (14,2%) e Centro-Oeste (13,0%) em comparação com as regiões Norte (9,8%) e Nordeste (7,6%).
Moradores com maior rendimento viajam mais para cultura e gastronomia
Entre as 7,0 milhões de viagens de lazer realizadas em 2024, 1,7 milhão tinham como finalidade cultura e gastronomia e 1,5 milhão, natureza, ecoturismo ou aventura. Somadas, essas categorias representaram cerca de 46% das viagens de lazer. Os números superaram 2023, que teve 6,8 milhões de viagens de lazer, sendo 1,5 milhão de cultura e gastronomia e 1,5 milhão de natureza, ecoturismo ou aventura. Os dados são do módulo de Turismo da PNAD Contínua, que quantificou os fluxos de turistas nacionais entre as diferentes regiões do país e para o exterior.
Em 2024, contabilizaram-se cerca 8,1 viagens do tipo cultura e gastronomia por 1.000 habitantes no Brasil. As unidades da federação de origem dos viajantes que se destacaram acima da média nacional foram Rio de Janeiro (13,5), Rio Grande do Sul (12,8) e Espírito Santo (11,3).
As viagens de lazer do tipo cultura e gastronomia, e do tipo natureza, ecoturismo ou aventura estiveram mais concentradas nos 20% dos domicílios com os maiores rendimentos per capita em 2024. Esses domicílios concentraram 63,3% das viagens para cultura e gastronomia e 58,9% das viagens para natureza, ecoturismo ou aventura. Por outro lado, os 20% dos domicílios com menores rendimentos fizeram 10,3% das viagens para cultura e gastronomia e 9,4% das viagens para natureza, ecoturismo ou aventura.
Mais sobre a pesquisa
O Sistema de Informações e Indicadores Culturais – SIIC visa desenvolver uma base consistente e contínua de informações sobre o setor cultural e construir indicadores relacionados ao tema. Em sua sétima edição, além de atualizar e aprofundar temas (como turismo e uma nova abordagem para despesas públicas), o estudo inova ao explorar o comércio exterior de bens e serviços culturais, dados sobre os Microempreendedores Individuais – MEI no setor cultural e, com dados do Censo Demográfico 2022, traz informação relativa à ocupação no setor cultural e à formação superior relacionada à cultura.
Destaques
- A participação da despesa com cultura no total de gastos públicos nas três esferas de governo caiu de 0,40% em 2013 para 0,38% em 2023.
- Apenas o gasto municipal com cultura mostrou recuperação frente a 2013 (de 1,05% para 1,09%, em 2023), com retração da participação nos níveis estadual (de 0,46% para 0,39%) e federal (de 0,09% para 0,04%).
- A queda ocorreu principalmente entre os anos de 2013 e 2021, quando chegou ao mínimo de 0,27% do total de gastos públicos. Em 2022, cresceu para 0,31%, chegando a 0,38% em 2023.
- Gastos públicos com cultura tiveram crescimento de 122,4% entre 2013 e 2023, de R$ 8,5 bilhões para R$ 18,9 bilhões, em termos nominais. No mesmo período o IPCA foi de cerca de 109%.
- Também entre 2013 e 2023, na esfera federal, as despesas diminuíram (-7,3%), enquanto houve aumento nos âmbitos estadual (84,3%) e municipal (175,9%).
- As leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo contribuíram recentemente para o aumento do total de gastos públicos.
- Em 2024, os bens culturais exportados somaram cerca de R$ 4,0 bilhões e os importados, R$ 20,8 bilhões. Considerando uma balança comercial de bens culturais, em 2024, exportações representaram 16,3% e importações, 83,7% do total gasto.
- As formações educacionais ligadas à cultura tinham cerca de 2,7 milhões de pessoas e 10,9% dos cursos de graduação concluídos pelas pessoas de 25 anos em 2022. Maiores proporções foram encontradas para mulheres (11,9%), pessoas de cor ou raça indígena (14,9%), pessoas a partir de 50 anos (13,4%).
- O acesso a serviço pago de streaming de vídeo foi de 10,9% dos domicílios, em 2022, para 11,4% em 2024. Mulheres brancas (13,9%) e homens brancos (13,5%) eram moradores de domicílios com streaming em maior proporção do que mulheres pretas ou pardas (9,8%) e homens pretos ou pardos (9,5%).
- Entre as viagens de lazer realizadas em 2024, 1,7 milhão foram para cultura e gastronomia e 1,5 milhão para natureza, ecoturismo ou aventura. A soma delas representou cerca de 46% das viagens de lazer.
Publicado originalmente pela Agência de Notícias IBGE em 12/12/2025
Por Sabrina Pirrho – Editoria Estatísticas Sociais
Arte: Helga Szpiz