Os novos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). Foto: Brenno Carvalho

Por Jeferson Miola, publicado em seu blog

No discurso de posse como presidente da Câmara dos Deputados, o deputado Hugo Motta evocou nada menos que 14 vezes o nome de Ulysses Guimarães.

Engana-se, no entanto, quem interpreta tal evocação como sinal de compromisso fervoroso do herdeiro de Cunha e Lira com a democracia e com a convivência republicana entre os poderes. E, tampouco, como sinal de compromisso com a decência pública.

As menções a Ulysses ou tiveram um sentido dúbio e fora de contexto, ou foram empregadas de modo capcioso, como quando Hugo Motta condenou o que considera “o superpresidente, o presidencialismo absoluto” para propor no seu lugar, em contraposição, um “parlamento parlamentarista”, que insinua ser o ideal de Ulysses que ele promete materializar na presidência da Câmara.

Referindo-se a parlamentos parlamentaristas contemporâneos, versão exótica de um sistema de governo que só existe nas cabeças genais dos congressistas brasileiros, mas em nenhum outro país do mundo, Hugo Motta afirmou que essa “vontade dos Constituintes originários [a usurpação do orçamento da União] foi adiada por quase 4 décadas”. “Os Constituintes estabeleceram a corresponsabilidade e a coparticipação do Governo”, afirmou.

Numa espécie de homenagem histórica a Eduardo Cunha, ele disse que “foi nessa época que aqui, nesta Casa, em 2016, por meio da adoção das emendas impositivas, o Parlamento finalmente se encontra com as origens do projeto constitucional e se afirma”.

E numa referência implícita ao antecessor e padrinho político Arthur Lira, que avançou com o esquema corrupto do orçamento secreto, Hugo Motta comemorou que “o Poder Legislativo recuperou suas prerrogativas, definidas pelos Constituintes originários, proclamadas aqui, nesta mesma cadeira, e o fez após os tormentosos abalos desde a redemocratização”.

Quando mencionou “os tormentosos abalos desde a redemocratização”, Hugo Motta fez alusão aos processos de impeachment de Collor, em 1992, e de Dilma, em 2016.

E deixou no ar o que pode ser interpretado como uma ameaça velada também ao presidente Lula: o “distanciamento dos princípios dos Constituintes levou ao primeiro impeachment –sintoma claro do poder constitucional novo do Parlamento, ainda não compreendido pelo sistema político–; a inúmeros abalos e escândalos; às crises que só ganharam proporção; ao segundo impeachment; até à erosão completa do sistema político como um todo e à onda antipolítica”.

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre, também criticou a atuação do STF em relação às emendas parlamentares.

Ele disse que “as decisões do Supremo Tribunal Federal devem sim ser respeitadas, mas é igualmente indispensável garantir que este Parlamento não seja cerceado em sua função primordial de legislar, de representar os interesses do povo brasileiro, inclusive levando recursos e investimentos a todas as regiões do Brasil”.

Davi Alcolumbre. Foto: Antônio Cruz/ Agência Brasil

O fervor federalista de Davi Alcolumbre tem razão de ser; mas uma razão nada republicana. Ele foi o 6º parlamentar, dentre os 594 deputados e senadores, que mais distribuiu emendas em 2024, num total de R$ 72,7 milhões – cifra superior ao total de verbas para investimentos da imensa maioria de municípios brasileiros.

Relatório da CGU [Controladoria Geral da União] de setembro do ano passado revelou que os três municípios do Brasil que mais receberam emendas do orçamento secreto de 2020 a 2023 são paróquias eleitorais do senador no seu Estado natal, Amapá.

Nos anos de 2020 a 2024 os congressistas destinaram a cifra astronômica de R$ 148,9 bilhões em emendas parlamentares ao orçamento da União. E agora os parlamentares achacam o governo para garantir no orçamento de 2025 mais 50 bilhões de reais.

O esquema de emendas orçamentárias é uma fonte de desvios, de corrupção, de clientelismo e de demagogia eleitoral que sequestra do governo eleito a prerrogativa de executar as políticas e programas escolhidos pela soberania popular, além de trazer prejuízos incomensuráveis às políticas públicas.

As emendas parlamentares funcionam como instrumentos de pilhagem e assalto ao orçamento e aos fundos públicos. Lamentavelmente, este câncer maligno já não se restringe somente ao Congresso Nacional, está disseminado nos legislativos das demais esferas de governo.

A Suprema Corte, por meio da firme atuação do ministro Flávio Dino, tem tentado colocar um freio neste parlamentarismo de achaque e pilhagem.

Por isso mesmo Dino é o alvo central da ira de congressistas achacadores e saqueadores, que não hesitarão em criar uma crise institucional grave para manter esse roubo bilionário de verbas públicas.

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Last Update: 04/02/2025