Ela foi a anfitriã dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 e durante dez anos comandou Paris com planos de uma cidade mais verde, acessível para pedestres e ciclistas. A menos de um ano e meio para as próximas eleições municipais na França, a prefeita de Paris, a socialista Anne Hidalgo, anuncia que não vai concorrer a um terceiro mandato e defende o seu legado.
A primeira mulher a dirigir Paris, Anne Hidalgo está à frente da prefeitura da capital francesa desde 2014. Foi através do jornal Le Monde, publicado nesta terça-feira (26), que ela anunciou a intenção de não se candidatar a um terceiro mandato em 2026, como havia decidido “há muito tempo”.
Em Paris, a votação é um pouco diferente. Os eleitores votam em seus distritos para eleger os conselheiros que farão parte do Conselho de Paris. Estes, por sua vez, elegem o prefeito da capital.
“Sempre defendi a ideia de que dois mandatos eram suficientes para realizar mudanças profundas”, diz Anne Hidalgo, de 65 anos. Na França, os mandatos de prefeito têm duração de seis anos.
Ela já fala em “passar o bastão”, apoiando o senador do Partido Socialista Rémi Féraud e desencadeando uma guerra de sucessão dentro da esquerda parisiense.
O segundo mandato de Anne Hidalgo foi marcado pelo sucesso popular dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos no coração de Paris, em julho e agosto passados.
Para tranquilizar os atletas e o público, ela não hesitou em cumprir sua promessa de nadar no rio Sena, acompanhada pelo presidente do Comitê Organizador (COJO) Tony Estanguet. O mergulho histórico aconteceu nove dias antes dos Jogos Olímpicos.
Passado o evento, ela desabafou sobre o bashing sofrido durante os últimos nove anos – dois de candidatura para os Jogos Olímpicos e sete de preparação da cidade. Em entrevista à RFI, Hidalgo lamentou a propagação de “uma imagem de degradação da capital francesa que não era real”.
“Claro que quando você tem 2,2 milhões de pessoas que vivem em uma cidade, e um total de 5 milhões que a atravessam diariamente, questões de limpeza e segurança sempre vão existir. Mas hoje em dia, muitos franceses e mesmo estrangeiros voltaram atrás, eles dizem que finalmente Paris está bonita, limpa, e com minha equipe estamos muitos felizes e orgulhosos desse resultado”, celebrou.
“As mudanças do ponto de vista ecológico, as ciclovias, todos os espaços verdes, a adaptação da cidade às mudanças climáticas, tudo isso será uma herança duradoura”, defendeu a prefeita.
Amizade com o Rio
Anne Hidalgo nunca escondeu a sua inspiração nos Jogos Olímpicos Rio 2016, lembra Rafael Lisbôa, consultor de comunicação da prefeitura do Rio de Janeiro para grandes eventos. “A prefeita Anne Hidalgo e o prefeito Eduardo Paes são muito próximos.
Eles trocaram muitas ideias e experiências por conta das Olimpíadas e a prefeita Anne Hidalgo, em várias oportunidades, já destacou como a experiência olímpica do Rio era uma inspiração”, disse em entrevista à RFI. “Ela repete que aprendeu com o prefeito Eduardo Paes duas lições: a primeira, antecipar ao máximo tudo. E a segunda, apostar em estruturas já existentes e pensar em reaproveitar estruturas temporárias para novos equipamentos públicos”, diz. “Então, essa lição de não deixar elefante branco é algo que Paris se inspirou no Rio”, destaca Lisbôa.
Em dez anos à frente da prefeitura de Paris, a socialista Anne Hidalgo aprovou projetos para tornar a metrópole mais verde, voltada para o ciclismo e acessível aos pedestres. O fechamento de grandes eixos da cidade à circulação de veículos, como a famosa Rue de Rivoli, paralela ao Museu do Louvre, assim como os cais do Sena, causaram polêmica. Anne Hidalgo também é fortemente criticada pela dívida da prefeitura e por suas escolhas para o desenvolvimento de Paris.
Rede de prefeitos
Anne Hidalgo também foi presidente do C40, uma rede global de quase 100 prefeitos das principais cidades do mundo, unidos em ações para enfrentar a crise climática. À frente da entidade de 2016 e 2019, Hidalgo defendeu a diplomacia urbana em todo o mundo, trabalhando para aumentar o papel dos prefeitos nos assuntos globais.
Ela garante que será prefeita de Paris “até ao último dia, com a mesma energia” de quando sucedeu o socialista Bertrand Delanoë, em 2014.
Hidalgo disse que queria anunciar a decisão de não se reapresentar “com bastante antecedência” por “respeito” aos parisienses e para preparar “uma sucessão tranquila”, que ela espera que seja com o senador socialista Rémi Féraud, um de seus fortes apoiadores.
O senador se coloca numa “lógica de sucessão, para que a história da esquerda em Paris, iniciada em 2001, possa continuar”. “Não devemos mudar a história, devemos estendê-la, abrir um novo capítulo do livro”, acredita.
Nenhuma eleição presidencial à vista
Questionada sobre projetos futuros, Anne Hidalgo afirmou ao Le Monde que “não será candidata” nas próximas eleições presidenciais da França. Ela representou o Partido Socialista na corrida ao Palácio do Eliseu em 2022, quando registrou uma pontuação historicamente baixa (1,74%).
Depois de 2026, Hidalgo diz que deseja “ajudar no surgimento de uma força social-democrata e ecológica” junto ao PS, mas também com o eurodeputado Raphaël Glucksmann, que a seu ver poderia “assumir a liderança” desta força.
“Ao mesmo tempo, continuarei a investir em questões de justiça climática, em escala nacional e internacional”, conclui Anne Hidalgo.
De acordo com a publicação Le Canard Enchaîné, ela poderá assumir a liderança da Fundação Bloomberg, em Bruxelas.