Ex-ministro das Finanças da Grécia, Yanis Varoufakis se destacou por suas opiniões críticas em relação à austeridade fiscal imposta pela União Europeia e pelo FMI, que quase destruíram o país.
Em artigo ao “Project Syndicate”, ele minimiza as ameaças de Donald Trump de aumento tarifários. Diz ele que os líderes chineses interpretam como jogadas políticas simbólicas, e não armas econômicas – mesmo porque, empresas americanas estão entre as grandes beneficiárias da produção chinesa.
O grande dilema chinês é se deve ou não desvincular sua economia do sistema monetário dominado pelo dólar, montando um arranjo tipo Bretton-Woods com os BRICS.
A bola está com os falcões de Trump encarregados de pensar a China.
Tarifas de importação, mais cortes de impostos para grandes corporações e desregulamentação radical aumentarão os lucros e os preços das ações nos EUA. A consequência será aumentar o fluxo de capital estrangeiro para os EUA.
Haverá um aumento do déficit orçamentário e um fortalecimento inicial do dólar, mitigando o efeito negativo das tarifas sobre as exportações chinesas. Mas há um limite, diz Varoufakis, que é a crença dos investidores de que o aumento nos rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA não ofuscará os índices de ações dos EUA. Aumentará a lacuna entre poupança doméstica e investimento, a causa raiz do déficit comercial dos EUA em relação à China e à Europa.
Varoufakis descreve os problemas de Trump como um “trilema”: como combinar tarifas altas, um dólar mais fraco e manter a hegemonia global do dólar?
Os líderes chineses julgam que Trump tentará com eles o que Ronald Reagan fez com o Japão no Plaza Accord de 1985.
Nos anos 1980, o dólar americano estava extremamente valorizado devido a uma combinação de altas taxas de juros nos EUA e políticas fiscais expansionistas do governo Reagan. Essa valorização tornou as exportações americanas muito caras e pouco competitivas, ao mesmo tempo que incentivava a entrada de importações baratas, ampliando o déficit comercial dos EUA.
Foi fechado um acordo com o Japão e a Alemanha Ocidental. Ambos se comprometeram a valorizar suas moedas em relação ao dólar, barateando as exportações americanas e encarecendo as suas exportações.
Com o acordo, o dólar perdeu 50% de seu valor. A valorização do iene acabou provocando a formação de uma bolha de ativos que explodiu anos depois e a crise financeira continuou nos anos 90.
Obviamente, a China não é o Japão. Na época, havia 55 mil militares dos EUA estacionados no Japão, derrotado na Segunda Guerra Mundial. Além disso, a China já não é mais tão dependente do mercado norte-americano, diversificou, montou cadeias de suprimento próprias, indispensáveis em todo o mundo.
Não há chance, portanto, de um repeteco do Plaza Accord com a China. Mas é possível que aceite uma negociação simbólica com um acordo envolvendo tarifas ligeiramente mais baixas.
O maior impacto será sobre a União Europeia. A recalibração do comércio mundial se dará com os EUA comprando mais do Vietnã e da Índia e a China disparando suas exportações para a Europa e o resto do mundo. Além disso, a valorização do dólar provocará uma transferência de capitais europeus para os Estados Unidos.
O enorme salto tecnológico recente da China foi reação à nova Guerra Fria produzida por Trump em seu primeiro mandato e intensificada por Joe Biden.
O risco maior será se os falcões pressionaram o governo Trump a impor sanções financeiras à China, como foram impostas à Rússia. A defesa da China será acelerar a moeda única dos BRIC. tendo o superávit comercial chinês como seu suporte.
Para consolidar a moeda, a China teria que disponibilizar seus excedentes aos BRICS para permitir que as rúpias que a Rússia recebe por suas exportações de petróleo à Índia possam ser trocadas, a uma taxa quase fixa, por renminbi, para serem gastos em produtos chineses. Foi o que os EUA fizeram nas décadas de 1950 e 1960 para consolidar o sistema de Bretton Woods.
Mas tudo isso dependerá do jogo geopolítico, não da economia.
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