A Sérvia, principal país da antiga Iugoslávia, é o último alvo da intervenção imperialista. Em janeiro de 2025, os estudantes começaram uma série de manifestações golpistas contra o governo nacionalista do país. O processo é muito semelhante ao de Bangladexe, que culminou em um golpe de Estado em 2024. A OTAN está envolvida diretamente no golpe, que tem relações com a guerra da Ucrânia devido ao tradicional alinhamento da Sérvia com a Rússia. Mas a esquerda pequeno-burguesa é incapaz de compreender o que é um golpe de Estado.

O grupo pseudo-trotskista francês Revolution Permanent publicou em seu portal o artigo Serbie. La révolte étudiante contre trois décennies de capitalisme fait tomber le Premier ministre (Sérvia: a revolta estudantil contra três décadas de capitalismo derruba o primeiro-ministro). Só pelo título já fica claro que a análise está totalmente fora de realidade. O principal choque do governo da Sérvia não é com uma mobilização de estudantes socialistas, é contra o imperialismo, que foi o responsável pela queda do premiê.

O texto começa: “A revolta estudantil expressa algo mais profundo: a contestação de um legado prejudicial de privatizações, ataques às condições de vida e aos direitos dos trabalhadores e das classes populares, desigualdades e injustiças que não oferecem um futuro desejável nem para a juventude nem para os setores mais desfavorecidos da sociedade sérvia. Por isso, a luta dos estudantes encontra grande simpatia em diferentes setores da sociedade, ao mesmo tempo em que abre uma crise política e social que pode sair do controle do governo e ameaçar os lucros da classe capitalista. Muitos falam de uma luta por ‘uma sociedade mais justa’”. É verdade que a política neoliberal causa uma grande insatisfação na população. Até países com nacionalismo moderado acabam seguindo essa política, pois ela é dominante no capitalismo internacional. Isso é fácil de compreender observando o governo Lula no Brasil. Mas não é real que a insatisfação da população se volte contra o governo nacionalista. A tendência de todo o leste europeu é eleger governos semelhantes ao da Sérvia. Governos que não são tradicionalmente de esquerda, mas que se opõem à OTAN. É o caso da Eslováquia, da Romênia e até da Geórgia, que também estão na mira do golpismo imperialista.

O RP ignora completamente a presença do imperialismo na Sérvia, que atua da mesma forma que em outros países do mundo por meio de ONGs para financiar manifestações golpistas. Em vez disso, ele destaca que: “Os estudantes denunciam a progressiva privatização do ensino superior por meio do aumento das taxas de matrícula, além da pressão e da ansiedade que essa situação gera. Essa questão é particularmente sensível para os professores universitários, bem como para os do ensino primário e secundário. No sábado, 18 de janeiro, 4.000 professores aderiram ao movimento, e mais da metade das escolas do país entrou em greve em apoio aos estudantes mobilizados. O governo, consciente do potencial da aliança entre estudantes e professores, agiu rapidamente oferecendo aumentos salariais, que alguns sindicatos aceitaram, numa tentativa de enfraquecer a mobilização docente”. O fato de o RP apoiar totalmente a mobilização sem perceber seu caráter golpista coloca o partido francês como auxiliar do imperialismo. É o mesmo fenômeno do PSTU, que apoiou as manifestações contra Dilma em 2016. Interessante é que o governo, após a greve, garantiu o aumento salarial, algo que mostra que ele tem uma disposição social, não é nenhum governo ultra-neoliberal. Caso fosse, não haveria essa tentativa permanente de golpe imperialista.

Então ele comenta que: “O presidente Vučić anunciou a realização de um ‘contra-comício’ no mesmo dia da greve, na cidade de Jagodina, no centro do país. Para tentar demonstrar sua força frente às manifestações, seu partido organizou ônibus vindos de todas as regiões para levar o máximo de apoiadores ao evento. Em seu discurso, Vučić atacou os estudantes e outros setores mobilizados, afirmando que ‘a Sérvia está sendo atacada por dentro e por fora’. Um partido sério deveria exaltar essa medida do governo. Diante da intervenção imperialista no país, o presidente organiza uma mobilização popular, mesmo que a ação seja tímida, ela aponta na direção correta de mobilizar as massas. E novamente o RP se coloca totalmente contra o governo e a favor das mobilizações golpistas.

Por fim, o texto tenta argumentar que os protestos são de esquerda: “A juventude que hoje se mobiliza na Sérvia só conheceu o capitalismo agressivo que se instalou após o desmantelamento sangrento da Iugoslávia na década de 1990. Muitos são filhos das gerações que se revoltaram contra o regime de Slobodan Milošević no mesmo período, em meio a uma crise econômica e social e à interferência das potências imperialistas. A revolta atual, portanto, se insere na continuidade das lutas anteriores”.

O movimento estudantil estaria se revoltando contra o capitalismo que destruiu a Iugoslávia. Se isso fosse verdade, já existiriam organizações tradicionais da esquerda nas mobilizações, organizações que reivindicam o passado comunista, como o Partido de Sahra Wagenknecht na Alemanha, organizações que são radicalmente contra a OTAN. Mas nada disso aparece. São jovens mobilizados por ONGs imperialistas, assim como na Geórgia e em Bangladexe. O RP não consegue distinguir um protesto real de uma manifestação artificial organizada pelo imperialismo. O texto termina demonstrando sua ignorância: “A entrada da classe trabalhadora ao lado dos estudantes poderia ser o elemento explosivo que daria esperança a todos os explorados e oprimidos da região e do continente”.

O imperialismo organiza muitos protestos golpistas no mundo, mas nunca mobiliza a classe trabalhadora. Caso os operários entrem em ação, o que acontecerá será um desastre para o imperialismo, isso porque a classe operária é, em sua essência, inimiga do imperialismo. Por isso, a estratégia das ONGs sempre foca em camadas privilegiadas, como estudantes universitários.

No fim, a RP apoia o golpe de Estado na Sérvia. Um golpe de Estado que está sendo organizado também pelo próprio governo Macron. Sua posição é especialmente reacionária diante dessas circunstâncias.

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Last Update: 03/02/2025