Os urubus já estavam aí. Bozo é apenas a carniça que os uniu

por Armando Coelho Neto

O capitalismo nunca deu resposta às questões sociais, até por que, a isso nunca se propôs. E, no campo das obviedades, representantes do capital sempre defenderam seus interesses, tirou e tira proveito da exploração dos mais pobres e faz disso peça de engrenagem que fomenta a miséria no mundo, criando mão de obra excedente, de forma a manter sempre ativa a chama da ganância e dos lucros.

A direita jamais ganharia eleições dizendo que quer tonar os ricos mais ricos e os pobres mais pobres. Com que cara iria à TV, ao palanque, aos embates de rua, dizendo: eu preciso de seu voto para ficar mais rico? Ainda no campo das obviedades, dizer que vai acabar com direitos trabalhistas, lembrando com saudosismo que, durante a escravidão havia pleno emprego, casa, roupa e comida.

Eis que, a direita nativa, a exemplo de seus asseclas no mundo, cansada de perder eleições ou sentindo-se ameaçada (por seus próprios fantasmas, não os fantasmas do discurso popular), deve ter dito a si mesma: tenho o dinheiro, os meios de comunicação, as “boas” escolas e faculdades. “Temos as Forças Armadas” aliadas eternas das elites corruptas, temos os evangélicos e católicos venais, pervertidos…

A direita brasileira poderia também, ter apoio de facções criminosas, como o Primeiro Comando da Capital e Comando Vermelho (SP, RJ e outros estados); sem contar demais como Comboio do Cão e Família Monstro (Distrito Federal e Centro-Oeste), Nova Okaida (Nordeste), Bala na Cara (Região Sul)… Ah! Segue um respeitoso e acovardado salve (!) às demais facções, mais de 50 Brasil afora!

Conjugado todo potencial de forças em favor da direita há um capítulo dedicado à mídia, liderada por Globo, Folha, Estadão et caterva. Com o advento de Elom Musk, Mark Zuckerberg e Steve Bannon, perderam força. Todo modo, Marinhos, Ratinhos, Mesquitas, Saads, Sirotsky e outras falanges ainda guardam fel e força para sabotar Lula, o povo, mas sempre fiéis à rapinagem da vira-lata “Farinha Lima”, claro!

Fato: a facção midiática pavimentou a disfunção cognitiva social, e permanece cúmplice dos seus suportes, alimentando as distorções criadas pela barbárie do neoliberalismo. Nessa trilha flui o ódio, o preconceito, a falta de empatia, o conservadorismo barato, o nacionalismo zumbaia, o descrédito na política e nas instituições, a banalização da violência – seja de civis ou militares.

A chegada de Lula à Presidência da República foi antecedida por derrotas sempre calcadas em mentiras e artimanhas. As leis eleitorais foram sendo mudadas, do horário eleitoral reduzido às formas de propaganda, proibições de bebida, bocas de urnas, seguidas leis “pega-Lula”, até, finalmente, criar pechas até hoje coladas à imagem de Lula. A corrupção do sistema até hoje é creditada ao atual presidente.

Na lei da ficha limpa (“Pega-Lula”), o mínimo garantido a qualquer candidato, a Lula não serviu, em nome da “segurança jurídica e estabilidade”. Prazos foram reduzidos até resvalar no prende-solta Lula. Sempre, claro, sob supervisão das Forças Armadas com pilhérias ameaçadoras, alimentando fantasmas e chocando dentro do seu próprio ninho militar, o ovo da serpente que atacaria a democracia.

O preconceito contra nordestinos nas redes sociais por conta das vitórias de Lula e Dilma (muitos impunes) sob aplausos foram acentuando. A violência física entre políticos e eleitores nos grotões (uns tantos impunes) aumentou, atingindo a banalização da violência, da intolerância – vícios que passaram a integrar o discurso daquele que mais tarde sairia das trevas para encarnar todas as maldades.

Num crescente, de José Serra a Aércio e deste ao Bozo, o olfato dos urubus foi captando os odores fascistas, de forma que não se pode atribuir à dita esquerda, a violência consolidada como hoje conhecida. Bem diferente, aliás, dos atos ousados do Movimento dos Sem Terra, visto que o móvel sempre foi outro e não dirigido pura e simplesmente à mutilação do pensamento contrário, voltado à eliminação do outro.

As reações primitivas, irracionais, até então contidas ganharam espaço. Diante de tais contradições, fica claro que os urubus já estavam aí e que o Bozo foi apenas a carniça que os atraiu, os uniu. Aliás, teve menos urubus em Copacabana do que no passado. Talvez por que a carniça já tenha dado o que tinha que dar, ou quem sabe, decorrente do cheiro de podre que já se faz sentir do Palácio dos Bandeirantes…

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo

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Last Update: 19/03/2025