Reproduzindo matéria publicada originalmente pelo grupelho francês Révolution Permanente – pertencente à mesma “internacional” de brinquedo do MRT, espécie de apêndice do PSTU -, o pasquim autoproclamado revolucionário Esquerda Diário, mostrou-se mais uma vez um papagaio da política do imperialismo. Mascarada de tímida defesa do Irã contra a agressão israelense, sob um escrutínio mais atento, a peça intitulada Israel contra Irã: uma guerra sem retorno para o Estado colonial é na verdade uma absolvição do imperialismo e um ataque contra a República Islâmica.
Na matéria, os pretensos revolucionários buscam um tom de neutralidade para esclarecer o ocorrido. Não há, por exemplo, uma denúncia do caráter criminoso do ataque do imperialismo a um país atrasado. Há, no entanto, golpes de mão para reproduzir a propaganda israelense: “instalações nucleares, bases de mísseis, laboratórios científicos, centros de comando: todos foram alvos do exército israelense. Mas, embora a eficácia militar seja inegável, a estratégia política é muito menos clara”.
Ora, não é como se os israelenses tivessem bombardeado prédios residenciais em que militares de alta patente iranianos estavam com suas famílias… Se nos informássemos por meio deste jornaleco, estaríamos prontos para engolir a propaganda de que, pelo menos no caso iraniano, o imperialismo estaria levando adiante uma guerra “limpa”.
É verdade também que a “eficácia militar seja inegável”? Só se poderia afirmar tal coisa categoricamente nas primeiras doze horas da guerra, período que os iranianos levaram para recuperar-se do ataque eletrônico. O editorial, no entanto, foi publicado originalmente na segunda-feira (16), três dias depois. Hoje, está claro que, caso não haja entrada direta do imperialismo na guerra de agressão contra o Irã, os sionistas estão perdidos.
Continuam (grifo nosso):
“A pergunta não é se Israel pode atacar o Irã. Isso já foi provado. A questão é: a que custo estratégico, e com qual horizonte político? Porque se a operação não derrubar o regime iraniano, ela apenas reforçará sua narrativa de resistência e alimentará uma resposta assimétrica, prolongada e imprevisível.”
Ou seja, a República Islâmica do Irã não contribuiria de fato para a luta contra o imperialismo, seria mera questão de “narrativa”, isto é, propaganda. Não é como se tivesse tido papel central na defesa do Iêmen contra a agressão imperialista por meio dos seus monarcas-servos do Golfo, ou um papel central no treinamento das milícias iraquianas contra a ocupação do imperialismo, ou no treinamento do partido revolucionário libanês Hesbolá, em sua luta de vida ou morte contra o sionismo, ou no auxílio material e político ao conjunto da Resistência Palestina no acontecimento mais revolucionário dos últimos cinquenta anos: a operação dilúvio de al-Aqsa.
É repulsivo, não há outra maneira de colocar a questão. A rendição de parte significativa da esquerda “revolucionária” europeia ao imperialismo é total. Na América Latina, seus espantalhos são também verdadeiros inimigos da luta revolucionária no continente.
A matéria, então, se degenera numa verdadeira apologia do imperialismo, particularmente do norte-americano. Escrevem:
“Se os EUA se retirarem, como fizeram na Ucrânia — onde a Casa Branca se recusou a enviar tropas —, não apenas enfraquecerão sua já erodida identidade como superpotência, mas também arruinarão sua credibilidade. Isso seria um verdadeiro presente para Xi Jinping… e para todos aqueles que aguardam a retirada definitiva do ‘Ocidente’.”
Em abstrato, o trecho não parece grande coisa, o que haveria de errado aqui? Não fosse o fato de que o pasquim defende que China e Rússia são parte de um outro bloco imperialista. Ou seja, para os “trotskistas” do MRT, quem há de ganhar com o enfraquecimento do imperialismo norte-americano não são os povos do mundo, mas sim um “novo” imperialismo “autoritário” dos chineses e russos.
Pela sua incapacidade de entender que o trumpismo não é um movimento diretamente ligado ao setor majoritário do imperialismo, e que o presidente Trump já foi engolido pelo estado profundo norte-americano, ou seja, de que, no momento, não é a extrema-direita dentro dos países centrais os representantes do grande capital, os “revolucionários” acabam por absolver os mandatários do crime de sua culpa:
“A profunda crise da hegemonia estadunidense se manifesta com força no Oriente Médio: a realidade é que Tel Aviv não age mais simplesmente como aliado de Washington, mas como um ator que busca manipular seu protetor. Isso representa uma perigosa inversão dos papéis tradicionais entre o centro imperialista e seus estados clientes, com consequências imprevisíveis nos diversos cenários geopolíticos globais, onde Washington pretendia delegar seu antigo papel de polícia global.”
A culpa não é dos Estados Unidos, é de Israel! Particularmente, do “governo radicalizado” de Netaniahu. É ridículo. Sem o apoio incondicional do bloco imperialista de conjunto, o artificial estado sionista não sobreviveria, e só sobrevive por ser um capanga do capital internacional, como deixou bem claro Merz durante o encontro do G7 ao dizer que os israelenses fazem o “‘trabalho sujo’ para o Ocidente ao mirar o programa iraniano”.
O editorial termina numa desesperada tentativa de demonstrar que o regime político iraniano não teria, na verdade, apoio popular:
“O regime dos aiatolás emergiu da tomada de poder e do sangrento esmagamento da Revolução Iraniana de 1979 contra o Xá (título do então monarca iraniano). É um regime profundamente odiado por grandes massas — mulheres, jovens, classe trabalhadora —, conforme mostram sucessivos levantes nos últimos anos.”
A primeira colocação já é absurda: o regime político iraniano teria “emergido […] do sangrento esmagamento da Revolução Iraniano de 1979”! A segunda é negada pela realidade: se o regime fosse, de fato, “profundamente odiado pelas grandes massas”, já teria caído, vide a intensidade do cerco do imperialismo ao Irã.
O jornal “revolucionário” se apoia para defender tais teses estapafúrdias, é claro, nas palavras de Shervin Ahmadi, o responsável pela edição em farsi do jornal Le Monde Diplomatique, jornal “esquerdista” ligado ao grande capital. Conforme a situação internacional se agudiza, vemos que boa parte da esquerda “revolucionária” se prepara ideologicamente para ficar do lado do bloco imperialista.