
A morte da brasileira Juliana Marins, de 26 anos, após cair de um penhasco no Monte Rinjani, na Indonésia, levantou dúvidas sobre a segurança de trilhas de alto risco.
Juliana desapareceu no sábado (21), após se afastar do grupo com o qual fazia a subida. Seu corpo foi localizado três dias depois, na terça-feira (24), a mais de 600 metros abaixo do nível da trilha.
O corpo da brasileira foi resgatado nesta quarta-feira (25). A operação, conduzida por equipes da Agência Nacional de Busca e Resgate (Basarnas), durou mais de sete horas e enfrentou dificuldades como neblina intensa, terreno acidentado e variações bruscas de temperatura.
Especialistas em montanhismo, turistas experientes e guias apontam falhas que podem ter contribuído para a tragédia. Com informações do G1.
Falta de exigência de equipamentos de segurança
Segundo relatos de pessoas que já subiram o Monte Rinjani, não há exigência de equipamentos básicos como cobertores térmicos, casacos ou luvas. A triatleta e montanhista Isabel Leone, que fez a trilha há dez anos, destacou a diferença de protocolos em relação ao Brasil:
“Não tem obrigação de equipamentos de emergência. Hoje você faz qualquer prova aqui em Itatiaia, você tem que levar cobertor, casaco, luva, gorro. Lá (na Indonésia) não, eles não exigem nada”, afirmou.
O abandono
Durante o segundo dia da subida, Juliana se sentiu cansada e pediu para descansar. O guia, no entanto, seguiu com o grupo e retornou minutos depois, conforme relato da família. O guia Ali Musthofa, de 20 anos, afirmou ao programa “Fantástico” que ficou apenas três minutos à frente e voltou ao notar a demora da brasileira.
Para especialistas, a separação do grupo em trilhas perigosas é uma falha grave. “Se começaram em grupo, precisam terminar em grupo. Todos precisam manter contato visual e orientação pela pessoa mais experiente do grupo, que no caso era o guia”, disse a montanhista Aretha Duarte.
Silvio Neto, presidente da Associação Brasileira de Guias de Montanha, reforçou: “O ideal é sempre manter o grupo junto. Mesmo pequenos, os grupos são heterogêneos, e isso exige adaptação”.
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Falta de preparo dos guias locais
Relatos de turistas revelam que muitos guias no Monte Rinjani andam descalços e levam pouca comida e água. Isso evidencia falhas na estrutura do turismo local. “A precariedade dos guias lá é grande. Vários andando descalço, levando peso absurdo, pouca água, pouca comida”, relatou Leone.
Terreno instável e clima extremo
Com 3.721 metros de altitude, o Monte Rinjani é conhecido por ser traiçoeiro. De 2020 até hoje, o Parque Nacional registrou 190 acidentes, com nove mortes e 180 feridos — 44 deles estrangeiros. A trilha passa por encostas íngremes, pedras soltas e áreas de difícil acesso, além de clima instável, frio intenso e neblina.
“É muita chuva, frio intenso e condições bem traumáticas. O clima mudava muito rápido. Chovia, barraca arrastava”, lembrou o cinegrafista Claudio Carneiro. Isabel Leone também relatou: “Senti muito frio, meus dedos quase congelaram. Tive que usar uma canga no nariz por causa da poeira”.
Resgate lento e desorganizado
Apesar de um drone ter localizado Juliana no sábado, o resgate só foi concluído três dias depois. Especialistas destacam que a demora pode ter sido fatal. “O tempo realmente pode fazer a diferença entre a vida e a morte. Se a equipe não tem condição de fazer o resgate imediato, é necessário acionar autoridades locais, bombeiros, embaixada, seguro de viagem”, alertou Aretha Duarte.
Um dos principais problemas foi a falta de cordas com o comprimento adequado. Juliana estava a cerca de 300 metros da trilha, mas a corda levada tinha apenas metade desse tamanho. A distância entre o local do acidente e a base da montanha levava cerca de seis horas para ser percorrida, o que dificultou ainda mais o resgate.
Informações desencontradas
A família de Juliana enfrentou confusão com informações divulgadas ao longo das buscas. Chegou-se a afirmar que ela havia recebido água e comida, mas essa informação foi desmentida depois pelo embaixador brasileiro e pelos parentes, que criticaram a comunicação pouco clara e desorganizada.
Uso tardio e limitado de tecnologia
Drones com câmeras térmicas foram usados, mas não conseguiram localizar Juliana com precisão a tempo. A ineficiência do equipamento gerou críticas sobre o preparo técnico das equipes de resgate na região.
Imagens de drone mostram turista de Niterói com dificuldades para se locomover após cair de trilha em região montanhosa na Indonésia.
Crédito: Reprodução pic.twitter.com/CUnP8S0XxT
— Jornal O Dia (@jornalodia) June 21, 2025
Agência contratada
Especialistas lembram que a empresa contratada por Juliana tinha responsabilidade direta e deveria ter providenciado o suporte necessário rapidamente. “Existe uma responsabilidade civil inerente à atividade. Era importante que a agência tivesse assumido essa responsabilidade imediatamente”, afirmou Aretha.
“Ela contratou uma agência e um guia, ela estava com certeza considerando receber orientações e uma rede de apoio de pessoas experimentadas, suficientemente certificadas para que pudessem ofertar segurança”, completou a montanhista.
Obstáculos diplomáticos e logísticos
O pai de Juliana enfrentou dificuldades para viajar à Indonésia por conta do fechamento do espaço aéreo no Catar, motivado por tensões no Oriente Médio. Embora o governo brasileiro tenha prestado apoio, a distância dificultou ações rápidas para acelerar o resgate.