Os jornais entre a sobrevivência e a relevância

por Rodrigo Mesquita

As notícias que você lê, os vídeos que assiste, os tweets que viralizam – nada disso é aleatório. Hoje, quase toda a informação passa por plataformas digitais onde a mediação pública foi automatizada por algoritmos invisíveis, projetados para capturar atenção, prever comportamentos e moldar o pensamento coletivo. Essa transformação radical opera silenciosamente: reorganiza valores, invisibiliza temas relevantes e privilegia a performance comercial sobre a função cívica da informação.

Os responsáveis são as Big Techs — Google, Meta, Amazon, Twitter/X, TikTok — que controlam agendas políticas, econômicas e sociais globais, operando modelos de negócios oportunistas, baseados na exploração de dados e no engajamento a qualquer custo. Essas empresas concentraram um poder inédito sobre o fluxo informacional, criando monopólios que sufocam a diversidade e ameaçam a democracia e o capitalismo.

Pensadores como Shoshana Zuboff, Yochai Benkler e Zeynep Tufekci alertam: vivemos sob uma censura algorítmica, silenciosa e sem controle democrático. A tecnologia publicitária, como aponta o Guide to Advertising Technology do Tow Center, organiza a sociedade ao vender emoções, reforçar preconceitos e fragmentar consensos. O debate público é regido por algoritmos que maximizam engajamento, não a verdade — impulsionando extremismo, radicalização e desconfiança nas instituições.

Para Zuboff, trata-se do “capitalismo de vigilância”. Para Benkler, da corrosão da esfera pública. Para Tufekci, da manipulação algorítmica dos afetos. Todos concordam: a crise é estrutural, não apenas de conteúdo, mas da própria infraestrutura da comunicação social.

Nesse contexto, a imprensa falhou. Primeiro, ao não denunciar essa transformação de forma vigorosa. Depois, ao se submeter a ela, transformando redações em fábricas de cliques e assinaturas, sem investir em novas formas de estruturar o espaço público.

Hoje, poucos jornais conseguem sustentar-se com assinaturas digitais: menos de 20 ultrapassaram 500 mil assinantes pagos — e alcançar 50 mil ainda é exceção. Paywalls e modelos tradicionais não bastam. A função pública da imprensa foi deixada de lado em favor de modelos fragmentados e comerciais.

O jornalismo precisa ir além do entendimento técnico das tecnologias publicitárias e das plataformas. Precisa enfrentá-las, hackeá-las e superá-las. Não com códigos, mas com visão. Com estratégia. Com serviços que respondam à necessidade de articulação social em um mundo hiper conectado.

É hora de investir em plataformas dinâmicas, focadas em escuta pública, curadoria, agregação de saberes e construção de redes de confiança. O jornalismo precisa parar de disputar audiência nos moldes das Big Techs e oferecer serviços estruturantes às comunidades. A arquitetura da informação é agora uma questão de política pública.

Não existem dois mundos — analógico e digital —, mas um só tecido social em transformação. E ele precisa urgentemente de novas infraestruturas públicas de informação. A imprensa só será relevante se voltar a ser parceira da sociedade. A narrativa é a mensagem. E a mensagem é: precisamos reinventar o jornalismo.

Rodrigo Mesquita – Jornalista, conselheiro do InovaUSP e pesquisador do ecossistema informacional. Ex-diretor do Jornal da Tarde e da Agência Estado.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected]. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.

“Democracia é coisa frágil. Defendê-la requer um jornalismo corajoso e contundente. Junte-se a nós: www.catarse.me/jornalggn “

Categorized in:

Governo Lula,

Last Update: 12/05/2025