Fred Schwaller, DW
Milhões de espécies de fungos estão presentes no ar, mas apenas cerca de 20 podem causar infecções em seres humanos. Isso ocorre porque o sistema imunológico é muito hábil na proteção contra esse grupo de patógenos. Além disso, o corpo humano é muito quente para a sobrevivência da maioria das espécies de fungos.
No entanto, um novo estudo descobriu que alguns fungos estão evoluindo para se tornarem capazes de infectar humanos, e essa evolução pode estar relacionada à mudança climática. “O perigo e a importância dos fungos têm sido razoavelmente subestimados”, escrevem os autores no estudo publicado na revista Nature Microbiology em meados de junho.
Há também indicações de que o aumento das temperaturas esteja permitindo que os fungos sofram mutações e se tornem resistentes a antifúngicos.
Os pesquisadores estavam vasculhando os registros de infecções fúngicas de 98 hospitais na China, entre 2009 e 2019. Eles enviaram dois pacientes que já haviam sido infectados por um grupo de fungos que, até onde se sabe, nunca haviam causado doenças em humanos.
Os fungos foram isolados em laboratório e os pesquisadores descobriram que eles eram capazes de infectar camundongos que estavam com o sistema imunológico comprometido, imitando o que poderia acontecer em pacientes imunocomprometidos.
Devido à temperatura corporal de 37°C – muito elevada para a maioria das espécies de fungos, os mamíferos estão protegidos contra esses patógenos. Mas entre os novos registros, os pesquisadores descobriram que as espécies de fungos R. fluvialis e R. nylandii toleram bem a alta temperatura corporal.
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Além disso, a temperatura de 37°C aumentou a taxa de mutações em colônias de fungos em comparação com temperaturas mais frias de 25°C. Como resultado, os fungos tornaram-se resistentes a medicamentos antifúngicos.
“Esse estudo mostra que o mesmo mecanismo pode ocorrer em outros organismos que não causam doenças, o que significa que eles podem se adaptar para causar doenças em humanos”, explica Jatin Vyas, médico especialista em fungos da Faculdade de Medicina de Harvard, EUA.
“Podemos ver um cenário apocalíptico. Não vai ser como a série The Last of Us, mas significa que novos fungos podem causar doenças infecciosas graves. E temos muito poucos medicamentos para ajudar”, completa Vyas, que não participou do estudo.
O aquecimento global provocou uma evolução dos fungos?
Segundo os autores do estudo, o aquecimento global tem levado os fungos a desenvolver resistência a medicamentos e virulência – a capacidade de causar doenças.
“Essa é uma conclusão indireta derivada da observação de que a tolerância ao calor é uma virulência conhecida”, diz Toni Gabaldón, biólogo evolucionário do Instituto de Pesquisa em Biomedicina de Barcelona, na Espanha.
Vyas, por sua vez, não está certo de que as mudanças climáticas sejam o motivo da evolução dos fungos em temperaturas corporais mais altas no estudo. “Uma mudança repentina de 25 para 37 °C não é o que eu chamaria de resultado do aquecimento global. A temperatura na bacia amazônica aumentou 1°C na última década, o que teve um efeito profundo na ecologia”, destaca.
Os cientistas identificaram recentemente que alguns patógenos fúngicos, incluindo Candida auris, surgiram devido ao aumento da temperatura do solo em todo o mundo. Você acredita que isso provavelmente se deve ao aquecimento global.
Qual é o risco de disseminação de fungos resistentes a medicamentos?
De acordo com Vyas, há um risco de fungos resistentes a medicamentos se espalharem pelo mundo, já que foram detectados na Espanha, em Portugal e no Canadá.
“Existe o risco de que espécies resistentes a medicamentos se espalhem pelo mundo”, afirma Vyas. “Estamos começando a ficar nervosos com o que estamos vendendo. Quando encontramos nos bilhões de outros organismos que habitam a Terra, a grande maioria é completamente resistente aos medicamentos antifúngicos.”
As infecções fúngicas já causam cerca de 2,5 milhões de mortes por ano.
“A resistência aos antifúngicos é um problema grave e provavelmente aumentará, pois, em comparação com os antibióticos, temos apenas três famílias principais de medicamentos antifúngicos”, conta Gabaldón.
A dificuldade é que os fungos são organismos eucarióticos, assim como os mamíferos. Isso significa que o desenvolvimento de qualquer novo medicamento pode resultar em efeitos colaterais para os humanos, que, por sua vez, também precisam ser tratados. Pode-se esperar um longo processo até que os medicamentos possam ser usados em humanos.
Mas Vyas vê um ponto positivo nas mais notícias. “Estudos como esse nos preparam para organismos patogênicos”, explica. “Estamos começando a entender como os fungos estão se adaptando a partir desses casos raros, como na China. Assim, poderemos encontrar mecanismos para nos proteger no futuro.”
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