
O “Amen break” é o trecho de música mais sampleado da história, presente em mais de 6.000 canções. Com apenas seis segundos de duração, o solo de bateria ficou famoso ao aparecer em “Amen, Brother”, de 1969, dos Winstons, uma banda multirracial de soul. Apesar do sucesso incontestável, os membros do grupo nunca receberam um centavo pela composição.
Na época, ninguém imaginava que aquela sequência simples de bateria se tornaria um marco na música — nem mesmo os próprios compositores. A faixa foi criada em cerca de 20 minutos por Richard Spencer, ex-vocalista e saxofonista dos Winstons, enquanto o baterista Gregory “G.C.” Coleman não demonstrou entusiasmo, mas aceitou gravar a parte que mais tarde ficaria eternizada.
Embora outra música do grupo, “Color Him Father”, tenha feito sucesso nos Estados Unidos e recebido até uma indicação ao Grammy, “Amen, Brother” passou despercebida por mais de 15 anos. Os próprios Winstons, enfrentando dificuldades para conseguir shows no sul dos Estados Unidos, se separaram um ano depois, em 1970.
Foi apenas em 1986, quando o solo de bateria de Coleman foi incluído na famosa coletânea de hip-hop “Ultimate Breaks and Beats”, do DJ Breakbeat Lou, que o “Amen break” ganhou vida própria. No mesmo ano, o trio feminino de rap Salt-N-Pepa utilizou o Amen break no single “I Desire”. A música já traz o sample com uma variação mais lenta, em um ritmo único que acompanhou o crescimento do rap.
“Quando é usado, o Amen break raramente soa da mesma forma duas vezes; ele é acelerado, desacelerado, cortado, reorganizado e tem o tom alterado”, disse Stephen Collins, professor da Universidade Macquarie, na Austrália, à revista Business Insider. Segundo ele, o Amen break “forneceu as bases para muitos lançamentos iniciais do hip-hop” e mostrou “como um único solo de bateria poderia ser manipulado e reusado de forma criativa”.
Artistas de diferentes gêneros, como David Bowie, Amy Winehouse, Oasis e The Prodigy também aderiram ao “Amen break” em algumas de suas faixas. Bowie o fez em “Little Wonder”, Amy no hit “You Know I’m No Good” e o Oasis a sampleou em “D’you know what I mean?”. O trecho também é a base do tema dos desenhos animados “Futurama” e “As Meninas Superpoderosas”.
O Amen break se expandiu para o rock, o pop e até para o jazz. A fusão de sua batida crua com outros estilos musicais construiu novas sonoridades e manteve o sample vivo na cultura musical global, mas os Winstons nunca foram pagos por isso. Apenas em 2015, fãs de música realizaram uma vaquinha na internet para doar 24 mil libras (cerca de R$ 138 mil) a Richard Spencer, ex-vocalista e saxofonista do grupo.
Spencer, que desistiu da música e seguiu a vida num emprego burocrático em Washington, contou ao Financial Times que se sentiu “invadido” quando, em 1996, uma gravadora lhe pediu uma cópia da gravação original. “Eu senti como se tivesse sido tocado em um lugar onde ninguém deveria tocar”, disse ele.
O músico afirmou, porém, que se sentiu mais em paz com o uso do sample posteriormente. “Não é a pior coisa que pode acontecer com você. Sou um homem negro na América e o fato de alguém querer usar algo que eu criei — isso é lisonjeiro”, declarou à BBC em 2015.
Já Gregory Coleman, o baterista responsável pela gravação, morreu sem reconhecimento, morando na rua, em 2006. Spencer disse à BBC que ele provavelmente partiu sem saber da importância de seu trabalho para a história da música.