Habituado a abandonar soldados feridos pela estrada, Jair Bolsonaro não teve maior consideração pelos seus “Kids Pretos”. Após a prisão de um general, um tenente-coronel e dois majores ligados à força especial do Exército, que planejavam um golpe de Estado após Lula vencer as eleições de 2022, o ex-presidente rapidamente empurrou toda a responsabilidade para os militares que arriscaram seus pescoços por ele.

“Quem seria o grande beneficiado? Segundo o plano do general Mário Fernandes (um dos indiciados), seria uma junta criada após a ação do Plano Punhal Verde Amarelo, e nessa junta não estava incluído Bolsonaro”, afirmou Paulo Cunha Bueno, advogado do ex-presidente, em entrevista à GloboNews.

O plano, segundo a Polícia Federal, envolvia os assassinatos do presidente eleito, Lula, do seu vice, Geraldo Alckmin, e do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal. Além disso, documentos impressos no Palácio do Planalto mencionavam a criação de um “Gabinete Institucional de Gestão de Crise”, que seria comandado pelos generais Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional do governo Bolsonaro, e Walter Braga Netto, ex-ministro da Defesa e vice do ex-presidente na derrotada campanha à reeleição em 2022.

Mais preocupado em justificar-se para a militância bolsonarista do que em refutar o envolvimento na trama golpista, Braga Netto apressou-se a negar a tese do “golpe dentro do golpe”. Em nota divulgada por seus advogados, o general disse ser “um dos poucos, entre civis e militares, que mantiveram a lealdade ao presidente Bolsonaro até o final do governo, em dezembro de 2022, e a mantém até os dias atuais, por crença nos mesmos valores e princípios inegociáveis”. Já Heleno demonstrou a interlocutores “desapontamento” com a estratégia de defesa adotada pelo ex-chefe.

A rataria por trás do plano golpista sente a punhalada, mas não deveria estar surpresa. Um dos primeiros combatentes a serem rifados pelo capitão, ainda no primeiro ano de seu governo, Gustavo Bebbiano alertou que Bolsonaro jamais se manteve leal aos aliados: “Algumas pessoas dizem que o Jair tem deixado seus soldados para trás. Acho que é muito pior. Acho que ele próprio atira nos seus soldados. E pelas costas”.

CartaCapital premiada

A reportagem especial “Nordeste: Transição energética e indústria verde”, de autoria de Fabíola Mendonça, correspondente de CartaCapital no Recife, conquistou o principal troféu do Prêmio Banco do Nordeste de Jornalismo. O concurso reconhece produções que destacam iniciativas de desenvolvimento regional economicamente viáveis, socialmente justas, ambientalmente responsáveis e que respeitam a diversidade cultural. Ao entregar o Grande Prêmio Nacional na noite da terça-feira 3, o presidente do BNB, Paulo Câmara, exaltou a relevância do trabalho da jornalista. “Foi uma matéria que realmente nos tocou”, disse. “CartaCapital está de parabéns, especialmente Fabíola.”

São Paulo/ Selvageria fardada

PMs protagonizam novas cenas de barbárie contra suspeitos desarmados

Foram 11 tiros pelas costas. O policial à paisana alegou legítima defesa – Imagem: Redes Sociais

Após a morte do menino Ryan Silva Andrade Santos, de apenas 4 anos, e o assassinato de um estudante de Medicina desarmado, a Polícia Militar de São Paulo voltou a protagonizar episódios de barbárie. Vídeos registraram um soldado arremessando um suspeito de uma ponte e um policial à paisana executando um jovem negro com 11 tiros pelas costas na saída de um supermercado. A vítima havia furtado três pacotes de sabão.

O homem arremessado sobreviveu à queda de 3 metros. Após a repercussão do caso, 13 PMs envolvidos na ocorrência foram afastados, mas o comandante da tropa minimizou o caso. Segundo ele, foi um “erro emocional”. Já o policial à paisana alegou legítima defesa, embora as imagens provem o contrário.

Tarcísio de Freitas e seu secretário de Segurança Pública, Guilherme Derrite, agora repudiam as ações, mas são os principais responsáveis pelo descontrole da tropa. Além de sabotar o programa de câmeras corporais da PM, a dupla ignora denúncias de violência policial e apoia operações de vingança. “Pode ir à ONU, à Liga da Justiça, ao raio que o parta, que eu não tô nem aí”, disse certa vez o “moderado” governador, que almeja concorrer à Presidência da República com o apoio de Jair Bolsonaro.

Brasil condenado

Na quarta-feira 4, a Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou que o Brasil cumpra uma série de medidas de reparação pela Chacina do Acari, em 1990. Entre as recomendações, figuram o pagamento de indenizações, a emissão das certidões de óbito das vítimas desaparecidas e a retomada das buscas pelos corpos. À época, 11 jovens da favela do Acari, no Rio de Janeiro, foram sequestrados em um sítio em Magé, na Baixada Fluminense. O desaparecimento forçado foi atribuído a um grupo de extermínio integrado por policiais. Passados 34 anos, o crime segue impune e o paradeiro das vítimas é desconhecido. “É uma correção dos rumos da política do Estado contra violências desse tipo”, celebra Lúcia Xavier, coordenadora-geral da ONG Criola, que acompanha o movimento das Mães de Acari desde sua fundação. “Não podemos normalizar o desaparecimento forçado nem tolerar a existência de milícias.”

Coreia do Sul/ Autogolpe fracassado

O presidente agora corre o risco de perder o mandato

Os militares chegaram a invadir o Parlamento – Imagem: Yonhap/AFP

Estamos na Coreia do Sul, mas poderia ser nas gravações de uma novela mexicana. Após tentar um canhestro autogolpe, Yoon Suk-yeol enfrentará um processo de impeachment protocolado no Parlamento. O mandatário havia recorrido ao clássico fantasma do “inimigo interno” para justificar a edição de uma lei marcial, com suspensão dos direitos civis e da liberdade de imprensa. O objetivo, afirmou, seria “limpar” o país da influência da vizinha Coreia do Norte. Suk-yeol acusa a oposição de se aliar ao ditador Kim Jong-un. “Declaro lei marcial para proteger a livre República da Coreia da ameaça das forças comunistas norte-coreanas, para erradicar as desprezíveis forças anti-Estado pró-norte-coreanas que estão saqueando a liberdade e a felicidade do nosso povo, e para proteger a ordem constitucional livre”, declarou em cadeia de rádio e tevê. O Congresso, onde o presidente não tem maioria, reagiu e considerou inválida a lei marcial. Os militares enviados para ocupar o prédio deixaram o local após a decisão dos parlamentares. O ministro da Defesa e outros auxiliares diretos do presidente entregaram os cargos. O governo é impopular e perdeu as eleições legislativas de abril. O oposicionista Partido Democrático é hoje a principal força no Congresso.

EUA/ Mister Tarifa

Antes da posse, Trump distribui ameaças para todos os lados

O republicano promete taxar Deus e o mundo – Imagem: Jim Watson/AFP

O mais recente alvo do presidente eleito dos Estados Unidos, ­Donald Trump, são os BRICS. Caso o grupo formado inicialmente por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul avance no propósito de substituir o dólar nas transações comerciais, adverte, a Casa Branca se achará no direito de aumentar em 100% as tarifas de importação dos países associados. Obcecado pela guerra comercial, o magnata dirigiu ameaça parecida ao Canadá e ao México, parceiros no Nafta, o acordo comercial da América do Norte, responsáveis por suprir a maior parte das importações norte-americanas. Neste caso, a desculpa é um suposto descontrole do narcotráfico na fronteira. Aliados de Trump cogitam até invadir o território mexicano em nome do combate ao crime organizado. Sobrou também para o­ ­Hamas, embora não em forma de impostos. Em uma postagem na sua plataforma digital, a ­Truth Social, o republicano exigiu a libertação de todos os reféns israelenses antes de sua posse em 20 de janeiro. Caso contrário, a organização palestina vai “PAGAR CARO” (assim mesmo, em maiúsculas). Economistas advertem: um aumento generalizado de taxas alfandegárias elevará a inflação.

Estaca zero

Durou três meses a usurpação de poder na França liderada pelo presidente francês, Emmanuel Macron. Na quarta-feira 4, uma moção de censura apoiada tanto pela esquerda quanto pela extrema-direita provocou a queda do primeiro-ministro, Michel Barnier. A nomeação do premier nasceu de uma artimanha de Macron, que se recusou a escolher um nome da Nova Frente Popular, de esquerda, detentora do maior número de deputados no Parlamento. Sob o pretexto de garantir a estabilidade, o presidente ignorou a vontade popular e assentou no poder um aliado. A extremista Marine Le Pen pediu a renúncia de Macron. Com novas eleições à vista, tudo pode acontecer.

Filipinas/ Nem precisa de inimigos

Vice ameaça presidente de morte e enfrenta impeachment

Duterte diz que a intenção era se proteger – Imagem: Redes Sociais

A política anda perigosa nas Filipinas. Sara Duterte, vice-presidente, vai enfrentar um processo de impeachment por, entre outros motivos, ameaçar de morte Ferdinand Marcos Jr., chefe do Executivo. Duterte é acusada ainda de envolvimento em execuções extrajudiciais de usuários de drogas, corrupção e leniência com a alegada agressão da China no disputado Mar do Sul. Em 23 de novembro, durante uma coletiva de imprensa, ela declarou ter contratado um matador para eliminar Marcos, sua esposa e o presidente da Câmara, caso viesse a ser assassinada. As ameaças, descreve o texto da denúncia levada ao Parlamento, demonstram a “incapacidade mental, depravação e falta de aptidão para ocupar o alto cargo”. A maioria do Congresso é aliada de Marcos. “Esperamos que este processo encerre o pesadelo que a vice-presidente trouxe ao povo”, discursou o deputado Percival Cendana.

Publicado na edição n° 1340 de CartaCapital, em 11 de dezembro de 2024.

Este texto aparece na edição impressa de CartaCapital sob o título ‘A Semana’

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Last Update: 05/12/2024