As vitórias de Trump e do G20 social

por Leonardo Ferreira, Michele Ferreira de Oliveira, Gabriel Soprijo

A vitória de Trump reverberou durante o G20 Social, iniciativa inédita que visa ampliar a presença de atores, vozes e demandas durante a Cúpula de Líderes do G20. Com apreensão sobre quais compromissos seriam firmados pelo governo estadunidense, o G20 social apresentou um texto final que prioriza o combate à fome e à pobreza, a necessidade de uma aliança global para o enfrentamento da crise climática e os desafios da democratização da governança global.

O G20 Social

O G20, como é sabido, é um fórum internacional de cooperação econômica que reúne líderes dos vinte principais países desenvolvidos e emergentes anualmente. Realizado nos dias 18 e 19 de novembro na cidade do Rio de Janeiro, o encontro deste ano incluiu em sua programação o G20 social, iniciativa que visa aumentar a participação de atores não-governamentais no evento, pressionando pela inclusão de diferentes vozes, reivindicações e lutas. 

O G20 Social foi uma iniciativa inédita no mundo, anunciada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva já na 18ª Cúpula de Chefes de Governo e Estado do G20, em Nova Délhi, na Índia, em setembro do ano passado. O G20 Social precedeu a Cúpula dos Líderes, reunindo organizações da sociedade civil internacionais e brasileiras, como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), a Associação Brasileira Organizações Não Governamentais (Abong), a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Coalizão Negra por Direitos. No dia 16 de novembro de 2024 foi entregue para o presidente Lula e lideranças do mundo inteiro a declaração final do encontro, elaborada coletivamente pelos diferentes setores presentes. O documento aborda temas cruciais como as desigualdades sociais e econômicas, a urgência da transição energética e a necessidade da reforma da governança global. Um dos grandes destaques da iniciativa foi a proposta de uma Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que visa a criação de um fundo internacional financiado pelos mais países mais ricos, para a implementação de políticas públicas e programas sociais em países mais pobres. Entre os objetivos é que estes últimos recebam especialistas do mundo em desenvolvimento, com expertise na implementação de políticas públicas eficientes contra a pobreza, a fome, o aquecimento global, etc. Políticas, estas, que poderiam ser replicadas para atender as necessidades das populações dos países mais pobres, sem que estes percam a sua soberania.

Com o sucesso do G20 Social no Rio de Janeiro, os representantes do próximo país a sediar a cúpula, a África do Sul, já afirmaram que vão repetir a iniciativa. É importante enfatizar que a declaração final foi assinada por todos os líderes que corroboraram o compromisso no combate às mudanças climáticas e à fome, após um período de quatro anos sem consenso entre os líderes participantes.

Joe Biden, mandatário que em breve deixará o posto de presidente para que tome posse o ex-presidente republicano Donald Trump, também esteve na cúpula.  Em seus discursos, Biden citou o investimento de US$325 milhões em uma iniciativa do Banco Mundial para promover projetos de energia limpa (LIPTAK, 2024) e afirmou que US$160 bilhões foram investidos pelos EUA no desenvolvimento global, com foco no desenvolvimento sustentável e assistência aos mais necessitados. Mas pelo tom da recente campanha eleitoral de Trump, assim como pelos posicionamentos e pelas políticas implementadas em seu primeiro mandato, as organizações do G20 social preveem que os próximos anos serão de grandes desafios para a agenda do clima e a agenda econômica da fome.  Trump se diz conservador e anti-globalista (termo usado por alguns líderes para criticar a atuação das organizações multilaterais), e se afirma cético em relação ao colapso ambiental no planeta. O futuro presidente, inclusive, já manifestou que não tem interesse em cumprir os termos convencionados na Cúpula do G20. Espera-se resistência, entre outros pontos, àqueles relacionados à taxação de super ricos, ao fortalecimento das instituições multilaterais e ao combate à crise climática. Sua equipe já se prepara para retirar os EUA do Acordo de Paris, tratado internacional que vincula juridicamente os seus signatários a agirem para combater a crise climática

Apesar do cenário desanimador, o G20 Social foi uma grande vitória. A experiência pode (e deve) servir de impulso para o aprimoramento do trabalho coletivo de organizações sociais do Brasil e do mundo voltadas tanto ao combate da crise climática quanto a melhoria econômica e social das famílias mais pobres ao redor do mundo.

Referências

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Last Update: 09/12/2024