Uma das mais brutais e significativas revelações sobre os acontecimentos do 7 de outubro veio à tona através da própria imprensa sionista: o exército israelense não apenas falhou em conter a operação heroica do Hamas, mas deliberadamente ordenou o assassinato de seus próprios civis na aplicação da chamada Diretriz Aníbal. As informações são do Jerusalem Post, um dos principais jornais sionistas que cita militares do alto-escalão do exército israelense.

A Diretriz Aníbal é um protocolo militar israelense que autoriza o uso de força extrema para impedir que soldados e civis sejam capturados vivos pelo inimigo, ainda que isso signifique assassiná-los. No dia 7 de outubro, essa diretriz foi aplicada indiscriminadamente, resultando no massacre de civis, como revelado pela própria Força Aérea de “Israel”.

Segundo relatos, a aviação “israelense” executou a chamada Operação “Espada de Dâmocles”, que tinha como objetivo atacar comandantes do Hamas e suas bases. No entanto, esse bombardeio coincidiu com a diretriz de atirar em tudo que se movia na região da fronteira entre Gaza e “Israel”. Muitos pilotos, segundo os próprios relatórios da Força Aérea, relutaram em seguir as ordens por medo de atingir reféns, mas, ainda assim, os ataques ocorreram.

A operação resultou na morte de centenas de civis “israelenses”, particularmente aqueles que estavam na rave ao ar livre. Embora o governo sionista tenha inicialmente responsabilizado o Hamas pelos ataques contra os participantes do evento, agora fica evidente que a destruição foi obra das próprias forças militares sionistas.

Houve ainda uma falha estratégica notável. Enquanto o alto comando do exército de “Israel” focava seus esforços em supostamente atacar líderes do Hamas dentro de Gaza, a defesa das ocupações dos colonos e do próprio perímetro de “Israel” ficou em segundo plano. A Força Aérea dispunha de poucas unidades prontas para o combate imediato, porque parte do efetivo estava de férias, e as ordens para reforçar a segurança na região chegaram tardiamente. A demora na mobilização permitiu que os combatentes do Hamas retornassem à Faixa de Gaza com prisioneiros antes que a aviação israelense estivesse sequer apta a agir.

A crise gerada por essa revelação dentro das Forças Armadas sionistas é inegável. Pilotos e oficiais já admitiram que gostariam de ter utilizado o poder aéreo de maneira diferente, mas a ordem do alto comando era clara: o foco deveria estar em bombardear alvos em Gaza, mesmo que isso significasse sacrificar seus próprios cidadãos.

Rui Costa Pimenta: ‘é uma vitória espetacular da resistência’

Na mais recente edição da Análise Política da Semana, realizada no sábado (1º), Rui Costa Pimenta comentou sobre as recentes revelações das próprias autoridades israelenses. “As forças armadas israelenses reconheceram que atiraram na própria população dia 7 de outubro. É uma declaração oficial do chefe das forças armadas”, disse.

O presidente do PCO destacou que essa revelação apenas confirma o que já havia sido denunciado anteriormente, mas que parte da esquerda temia assumir:

“Nós falamos isso em diversas oportunidades, mas agora as próprias forças armadas sionistas revelaram que mandaram atirar sob a própria população. O Hamas, que foi caluniado e a esquerda se acovardou para não defender, não teve nada a ver com o fato. Na famosa rave, quem matou foi a aviação israelense.”

Além disso, Pimenta destacou a gravidade da crise nas fileiras sionistas. “A crise nas forças armadas israelenses é total. Muita gente acha que o que houve em Gaza foi um milagre. Acham que os israelenses estavam ganhando de 100 a 0 e, de repente, saíram de lá. A imprensa burguesa deu grande publicidade ao negócio dos pagers, ao assassinato de Sinwar, dando a impressão que ‘Israel’ estava ganhando, e eis que temos as forças armadas fora de condições de combater”, afirmou.

O dirigente ainda colocou o 7 de outubro como um marco histórico da luta contra o imperialismo. “As forças armadas sionistas estão fora de condições de combater por causa da resistência palestina. Há uma dissolução das forças armadas israelenses, um fenômeno revolucionário difícil até de quantificar. É uma vitória espetacular da resistência e vamos além”.

Segundo ele, a derrota do sionismo não é apenas uma vitória da causa palestina, mas um golpe global contra o imperialismo. “Se o Hamas e o restante da resistência palestina enfrentaram, em Gaza, uma invasão de 300 mil soldados, da força aérea altamente equipada, do serviço de espionagem e das armas de todos os países imperialistas e, mesmo assim, infligiram uma derrota ao sionismo, todo revolucionário deveria pensar. Isso mostra que o mundo está à beira de uma revolução. O dia 7 de outubro é um ponto de inflexão na situação mundial”, disse.

O que é a Diretriz Aníbal

Em artigo publicado no jornal israelense Haaretz, o jornalista e analista militar Amos Harel descreve qual a ação tomada pelos palestinos no dia em questão:

“O Escritório de Coordenação e Comunicação foi atacado em 7 de outubro, juntamente com todos os postos avançados ao longo da linha da divisão. Uma grande força do Hamas tomou o cruzamento adjacente de Erez, que estava fechado por causa do feriado de Simhat Torah. De lá, em poucos minutos e sem resistência, eles avançaram para a base militar, matando e sequestrando os soldados da Administração Civil, embora alguns deles tenham conseguido devolver o fogo antes de serem atingidos… O general Rosenfeld se entrincheirou na sala de guerra subterrânea da divisão, juntamente com alguns soldados, tentando desesperadamente resgatar e organizar o setor sob ataque. Muitos dos soldados, a maioria deles não pertencentes às equipes de combate, foram mortos ou feridos do lado de fora. A divisão foi obrigada a solicitar um ataque aéreo contra a própria base para repelir os terroristas [grifos nossos]” (“Failures Leading Up to the Hamas Attack That Changed Israel Forever”, Amos Harel, Haaretz, 20/10/2023).

Neste episódio, o analista explicita que a ação por parte do exército de Israel foi responder com uma grande operação militar que viria a matar, em primeiro lugar, seus próprios civis.

No sítio da Internet Electronic Intifada, é relatado, por meio de uma entrevista, que “eles [militares israelenses] eliminaram todo mundo, incluindo os reféns.” (“Israeli forces shot their own civilians, kibbutz survivor says”, Ali Abunimah e David Sheen, 16/10/2023). Os relatos acusam, inclusive, de bombardeio por parte do exército de Israel contra a população local, dentro do próprio Estado sionista.

Em meio a toda esta ocorrência, destacou-se na imprensa mais uma vez a chamada “diretriz Aníbal”, um procedimento utilizado desde os anos 80 pelo exército de Israel para “impedir a captura de soldados israelenses”.

Conforme aponta o livro Cativos, lançado pelo próprio instituto Van Leer de Jerusalém, o “Protocolo Aníbal” foi escrito em 1986 e se manteve totalmente secreto até o ano de 2003, tem como base “em caso de captura, a missão principal se torna resgatar os soldados dos captores, mesmo a custo de alvejar ou ferir nossos soldados”. A própria editora do livro, Merav Mack, descreve no prólogo que a “verdade chocante posta diante de um combatente no momento do sequestro ou da queda em cativeiro, um momento em que ele vai descobrir que o perigo principal à sua vida vem justamente do lado de seus colegas de armas”.

O caso tornou-se mais uma vez uma polêmica pública no ano de 2014, quando se utilizou o protocolo após uma ação do Hamas em Israel. Na mesma época, defensores da política de Israel afirmaram que o protocolo seria apenas “uma série de normas no caso de uma captura, como a abertura de fogo contra os sequestradores e destruição de pontes e estradas próximas a fim de evitar a fuga dos sequestradores.” Porém, que eventualmente seria “mal interpretada” pelos comandantes.

Fato é que este protocolo, em toda sua história, se revelou uma política de carnificina contra tudo e todos, atingindo inclusive a própria população de Israel durante o processo de “vingança” do exército.

“Israel o invocou pela última vez em 2014 durante a guerra em Gaza daquele ano de acordo com as gravações militares vazadas, embora o exército tenha negado que tivesse usado a doutrina. Dezenas de palestinos foram mortos no bombardeio israelense que se seguiu, provocando acusações de crimes de guerra contra o exército israelense”, afirmou um antigo soldado israelense à Al Jazeera (What’s Israel’s Hannibal Directive? A former Israeli soldier tells all, Al Jazeera). ““Você abrirá fogo sem restrições, a fim de evitar o sequestro’”, disse ele, acrescentando que o uso da força é realizado mesmo com o risco de matar um soldado em cativeiro.

Além de disparar contra os sequestradores, os soldados podem disparar em cruzamentos, estradas, rodovias e outros caminhos pelos quais os oponentes podem levar um soldado sequestrado, disse Shaul.

“Os militares israelenses negaram a interpretação da diretiva que permite a morte de seus companheiros de tropas, mas os soldados israelenses, incluindo Shaul, entendiam isso como uma licença para fazer exatamente isso, pois é preferível a um cenário em que um soldado é feito prisioneiro” (idem).

Eyal Weizman, um arquiteto israelense britânico e diretor da agência de pesquisa Forensic Architecture na Goldsmiths, University of London, descreveu na época que Israel não realiza a troca de reféns, pois “Tudo isto reforça a percepção de que a vida de um dos colonizadores vale mil vezes mais do que a vida dos colonizados”.

Em 2014, surgiram relatos anônimos das fileiras de Israel, que logo apareceram na imprensa, denunciando a operação: “Um exército que quer salvar um cativo não age assim. Um exército que quer garantir a morte de ambos os cativos e captores age assim”. Conforme aponta carta destinada ao general do exército Benny Gantz.

Dois anos depois, em 2016, o procedimento teria sido extinto, segundo relatos da imprensa burguesa.

O nome, “Protocolo Aníbal” faz referência ao famoso general, opositor do Império Romano, que para não ser pego, suicidou-se envenenado.

Sobre o acontecido no dia 7, o Hamas afirmou: “O Hamas não pode prejudicar civis ou prisioneiros e agimos de acordo com as leis internacionais de guerra e de acordo com as instruções do comandante-em-chefe de al-Qassam, Abu Khaled al-Deif, para não prejudicar crianças e mulheres”

“O Ocidente acusa-nos de cometer crimes contra a humanidade, mas ignora que a guerra contra nós se baseou em atingir civis, e os americanos falam de moralidade quando exterminaram um povo inteiro, estabeleceram um Estado nas suas terras e atacaram pessoas com armas nucleares, bombas”, completou.

O Hamas repetiu as afirmações de que o movimento não tinha como alvo civis, acusando Israel de ter como alvo civis israelenses como parte de uma “Diretiva Aníbal”, de acordo com o jornal The Jerusalem Post.

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Last Update: 02/03/2025